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23/09/2018 às 06h00min - Atualizada em 23/09/2018 às 06h00min

Votos brancos e nulos não mudam nada

Eles são contabilizados para fins estatísticos, não são válidos e nem anulam o pleito, no entanto, têm diferença ideológica

NÚBIA MOTA
Segundo pesquisa do Datafolha da última quinta-feira (20), 12% do eleitorado tem intenção de votar em branco ou nulo para presidente da República. Um índice alto se comparado com eleições anteriores. Em 2014, por exemplo, foram 9,6% de votos brancos ou nulos e, em 2010, foram 7,1%. O efeito de ambos no resultado é o mesmo. Apesar de serem contabilizados para fins estatísticos, não são válidos e nem anulam o pleito.  Mas, ideologicamente, há uma grande diferença entre os dois. Enquanto o voto em branco indica que o eleitor aceita que qualquer um dos candidatos seja eleito, o voto nulo é uma forma de protesto, a manifestação de que o eleitorado não se sente representado por nenhum nome.

Até 1988, o voto em branco era computado para o candidato mais votado e era considerado um ato de conformismo. Hoje, depois de confirmados na urna eletrônica, os votos brancos e nulos passam a não ter nenhuma diferença no resultado final das eleições. “Quando as pessoas deixam de votar, diminuem o número total de votos válidos e podem, em uma situação bem extrema, diminuir a legitimidade do pleito eleitoral. Ou seja, podemos ter um representante que não foi escolhido pela maior parte da população, mas o que não torna o processo ilegítimo. Votar branco e nulo é uma opção que o sistema garante ao eleitor, mas você deixa de fazer uma escolha fundamental para a vida de todo mundo. Quem é novo e não se lembra do passado recente, deve saber que muita gente morreu para que fizéssemos essa escolha na urna. É um direito que deveríamos valorizar e honrar”, disse Lara Marina Ferreira, chefe da Seção de Pesquisa e Cidadania da Escola Judiciária Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG). 

O conceito equivocado de que o voto nulo anula a eleição, provavelmente, vem de uma interpretação incorreta do artigo 224 do Código Eleitoral, que prevê nova eleição caso a “nulidade” atingir mais da metade dos votos do país. Mas essa nulidade citada, na verdade, se refere à constatação de fraudes nas eleições, como, por exemplo, se comprovada compra de votos. Para o cientista político Leonardo Barbosa e Silva, professor de Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), grande parte da população não tem consciência da diferença entre as duas opções e usa o voto em branco também como protesto. “A urna tem o botão do branco, mas não tem o botão do nulo. Para anular o voto, você precisa digitar um número que não existe e confirmar. Na ciência política, a gente entende que é uma forma de proteger o processo eleitoral. Quem anula, provavelmente sabe o que está fazendo, porque a operação é mais complexa, mas quem vota em branco não sabe. E se a população não sabe essa diferença, com certeza não sabe que esses votos não interferem em nada no resultado final”, disse.

O especialista explica que os dois cargos públicos que podem, de certa forma, ser prejudicados pelos votos nulos e brancos são os de deputado federal e estadual, já que são os únicos eleitos proporcionalmente, ou seja, quanto menos votos válidos, menos candidatos o partido ou coligação consegue colocar no Congresso Nacional ou na Assembleia Legislativa. Já nas eleições para presidente da República, governadores e senadores, o cálculo é simples: vence o candidato que recebeu mais votos. É o chamado sistema majoritário. 


Leonardo Faria avalia que brancos e nulos prejudicam mais os cargos legislativos,
or ser eleição proporcional | Foto: Núbia Mota 


Votos válidos

Os votos válidos são usados para calcular o resultado das eleições e são determinados pela soma dos votos nominais e dos votos de legenda, excluindo os votos em branco e os nulos, pois estes são considerados inválidos. O site do TRE-MG já disponibilizou a colinha que pode ser levada junto à urna eletrônica, para ajudar o eleitor caso ele não tenha gravado os seis números dos candidatos a deputado federal, estadual, os dois senadores, governador e presidente. “Como é uma votação longa, é importante que o eleitor leve a colinha dele e conheça de antemão a ordem de votação, para que não se atrapalhe no momento de registrar o voto”, disse Lara Marina, do TRE-MG. Caso o eleitor se confunda e digite o número errado é possível corrigir, se ainda não tiver confirmado a opção.

No voto nominal, o eleitor deve saber quais são os números dos seus candidatos. Já no voto de legenda, basta digitar o número do partido de sua preferência e confirmar. Esta opção é válida na escolha dos deputados federais e estaduais. Para presidente e governador, o número do candidato é o mesmo de seu partido. No caso do candidato a senador o número é composto por três dígitos. Lembrando que, neste ano, é preciso escolher dois senadores. “Se você vota na legenda, (o voto) vai para totalidade e elege o mais votado daquela legenda. Mas é uma opção que vem caindo cada vez mais e quase não é usada”, disse o cientista político Leonardo Barbosa.


Lara Ferreira: voto é um direito que deveríamos valorizar e honrar | Foto: Divulgação

AUSÊNCIA
Abstenção em 2014 foi a maior dos últimos 20 anos 


O número de pessoas que não compareceram para votar nas eleições presidenciais de 2014 foi o mais alto desde 1998, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Naquele ano, 19,4% do eleitorado brasileiro não foram às urnas, representando 27,7 milhões dos 142,8 milhões de eleitores no país naquele ano. No pleito de 1998, o percentual foi de 21,5%.

Para o cientista político Leonardo Barbosa o voto obrigatório no Brasil, na verdade é uma fantasia. O valor da multa é baixo, podendo variar de 3% e 10% do valor de 33,02 UFIR, ou seja, de R$ 1,06 a R$ 3,51, o que estimula muitos brasileiros a não comparecerem às urnas. O valor arrecadado vai para o Fundo Partidário, ou seja, protestar contra os políticos deixando de votar acaba os beneficiando de alguma forma. 

Outro ponto avaliado pelo cientista político é a interação da população durante a campanha, que praticamente desaparece passado algum tempo das eleições. Nessa época, política é o assunto nos almoços de família, nos grupos de WhatsApp, no trabalho, sendo inclusive motivo para discussões e inimizades. Mas, segundo Leonardo, passado o pleito, essa interação vai diminuindo gradativamente, ao ponto das pessoas não se lembrarem em quem votaram e muito menos fiscalizarem o que os candidatos escolhidos estão fazendo. “No site da Câmara dos Deputados, do Senado, permite que o eleitor se cadastre e marque os nomes que quer acompanhar. Todo mês, vai receber um relatório, com votações, discursos, ausência”, cita Leonardo. 

Indecisos 

De acordo com a última pesquisa do Datafolha, divulgada na quinta-feira (20), 5% das pessoas ouvidas ainda não sabem em quem votar. Segundo o cientista político Leonardo Barbosa, o período mais curto de campanha eleitoral deste ano, com apenas 45 dias, explica esse índice. Outro ponto citado pelo especialista era a indefinição, até há duas semanas, de quem seria o candidato do PT. 

Para esses indecisos, Leonardo dá a dica de primeiro avaliar quais as funções de cada um dos cargos na Constituição Federal e saber as funções, por exemplo, de um deputado federal e de um senador. O segundo passo é avaliar os candidatos com a mesma base. Caso o eleitor, por exemplo, já tenha definido o nome do candidato a presidente, precisa dar a ele condições de ter representantes no Senado e na Câmara Federal e vice-versa. Da mesma forma, o ideal é votar no governador e no deputado estadual do mesmo lado. “Se você votar em um presidente de um partido e em um senador ou deputado adversário, você está jogando seu voto fora. Eu acho pior do que votar nulo ou em branco. Você elege um presidente e bota um cão de guarda para mordê-lo. As coisas não funcionam. Os dois impeachments que tivemos tem muita relação com falta de base da Dilma e do Collor no Legislativo. Por que o Temer não caiu, se também foi envolvido em escândalos? Porque tem base”, afirmou o professor. 

Previsão
Pesquisas apontam segundo turno


Caso as eleições do dia 7 de outubro fossem hoje, haveria segundo turno provavelmente com os dois candidatos que lideram as últimas pesquisas de intenção de voto – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). Pela margem de erro, Haddad e Ciro Gomes (PDT) estão tecnicamente empatados no Datafolha, 16% e 13%, respectivamente. Bolsonaro tem 28%.

Para o cientista político Leonardo Barbosa é difícil prever um resultado na disputa entre Bolsonaro e Haddad no segundo turno, mas ele faz algumas análises. Ele avalia que o petista deve provavelmente conseguir o apoio de Ciro Gomes e, apesar da facilidade de diálogo com Marina Silva (Rede), com 7% das intenções de voto, e com Guilherme Boulos (PSOL), com 1%, ainda não é certo que levará ambos para seu lado. Haddad também mostrou disponibilidade de dialogar com o PSDB, de Geraldo Alckmin (9%).  Já Bolsonaro consultou João Amoêdo, do Novo (3%). “O Alckmin tem uma resistência muito grande com o Bolsonaro, e o MDB e o DEM também. O centrão que está com Alckmin começou a desgarrar e pular do barco, como o PP, que vem da Arena, na Ditadura Militar, e simpatiza com o Bolsonaro. O Haddad deve ter apoios mais volumosos, mas o Bolsonaro não depende disso, porque está hospitalizado e continua crescendo. Tem que ver até às vésperas das eleições”, disse Leonardo. 

Avaliando as rejeições, segundo a mesma pesquisa, o deputado federal Jair Bolsonaro mantém a maior taxa entre os presidenciáveis, com 43%. Já a rejeição ao ex-prefeito de São Paulo passou dos 22%, registrados em 10 de setembro, um dia antes de confirmar sua candidatura na cabeça de chapa do PT, para 29% na pesquisa do dia 20. “Se a rejeição do Bolsonaro subir para 50%, ele não ganha. Se o Haddad passar o Bolsonaro, também não ganha. O Haddad é vítima do antipetismo e o Bolsonaro é vítima do antibolsonarismo. Se eu pudesse apostar hoje, agora, apostava no Haddad. Se o Bolsonaro sair do hospital, vai participar de combates, onde ele não tem bom desempenho. Mas muita coisa pode mudar”, disse o especialista.
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