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16/09/2018 às 08h14min - Atualizada em 16/09/2018 às 08h14min

Incomoda, mas faz parte do processo em Uberlândia

Abordagem de cabos eleitorais e propagandas espalhadas pela cidade geram descontentamento em parte do eleitorado

VINÍCIUS LEMOS
Porta do Terminal Central é um dos principais pontos de concentração | Foto: Vinícius Lemos
De um lado está um grupo se deslocando de um ponto A para um ponto B. No meio do caminho está uma barreira de pessoas cujo objetivo é abordar o primeiro grupo. A descrição que pode parecer uma jogada de futebol americano na verdade descreve a saída do Terminal Central em Uberlândia na avenida João Pessoa em tempos de campanha eleitoral. Quem entra ou sai do terminal do transporte público mais movimentado da cidade dá de cara com uma parede humana distribuindo santinhos de candidatos a cargos nos legislativos estadual e federal. De maneira geral, esse tipo de aproximação não tem se mostrado das mais agradáveis à população, segundo constatou a reportagem do Diário que passou a manhã da última quinta-feira acompanhando a movimentação. Ao mesmo passo em que a visibilidade aos candidatos se mostra grande e indispensável. Paralelamente à propaganda em si, a mão de obra contratada temporariamente ganha contornos de serviço garantido em época de desemprego.

Na cena flagrada pela reportagem, havia pelo menos cinco candidatos representados por cerca de 20 cabos eleitorais na saída do Terminal. A tendência é que esse assédio ao eleitor se intensifique. Quanto mais se aproxima o dia 7 de outubro, mais propaganda, inclusive em busca de brechas na legislação eleitoral. De olho no que pode e não pode, contudo, a Promotoria Eleitoral também já iniciou as notificações contra abusos dos candidatos, a partir de dezenas de reclamações que chegaram ao Ministério Público Estadual (MPE).

O que é um desejo do próprio eleitor. A maioria dos eleitores abordados nas ruas pela reportagem demonstrou insatisfação com o tipo de propaganda eleitoral e se mostrou pouco receptiva com as investidas dos candidatos. Em alguns casos, até mesmo por conta da descrença com a política. “Eu tenho 72 anos e vou votar se eu quiser. Há candidatos bons, mas (esse ano) eu não sei se vou (votar). Mas eles (os cabos) estão aí ganhando o dinheirinho deles, tão certos, só que por que eu devo gostar de político?”, disse Elísio Ramos.

A atendente de telemarketing Miriã Santos explicou que para ela a entrega de folhetos não muda o voto ou a convence a escolher determinado candidato. “Já tenho uma ideia formada e pego por educação, porque nem faz sentido, eles só entregam um papel e pronto, cabe você ler ou não”, afirmou.

Ainda sobre os santinhos e impressos entregues à população, a opinião geral é que há, por enquanto, menos deles espalhados pela cidade, contudo algumas atitudes incomodam. “Esse ano ‘tô’ achando a cidade mais limpa, mas tem uns candidatos que andam sujando (as ruas). Santinho no chão, meu voto passa nem perto”, afirmou o empresário Ryan Batistel. “Olha, no geral está mais limpa, mas ao mesmo tempo achei mais abusiva. Os cabos eleitorais estão mais insistentes. Além do fato de que não se pode estacionar no Centro que quando volta têm vários papeis de propaganda nos vidros”, disse a analista Karoll Goulart.

Legislação 

A lei eleitoral diz que a panfletagem pode ocorrer até às 22h do dia que antecede as eleições, 6 de outubro, e não depende da obtenção de licença municipal e de autorização da Justiça Eleitoral. Os adesivos devem ter a dimensão máxima de 50 cm x 40 cm. Entretanto, não pode haver impressos apenas com a estampa da propaganda do candidato. Todo material de campanha neste caso deverá conter também o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) ou o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do responsável pela confecção, bem como de quem a contratou, e a respectiva tiragem. E mais: no dia das eleições é vedada a distribuição do material. Assim como é proibido espalhar material de campanha nos locais de votação ou nas vias próximas, ainda que realizado na véspera da eleição. Essa proibição, no entanto, nunca é respeitada.

Bandeiras

Outra estratégia comum dos candidatos é a aglomeração de cabos eleitorais com bandeiras em cruzamentos movimentados da cidade, aproveitando o momento para abordagem de motoristas em semáforos. “Muitos porta-bandeiras. Distribuição de santinhos. Mas o candidato a gente nunca vê”, observou o empresário José Lucas Oliveira, frisando sobre o que o incomoda na campanha de rua. 

“Cruzamentos da Rondon Pacheco em horário de pico e aquelas bandeiras se agitando para todos os lados atrapalham minha atenção no trânsito”, afirmou o motorista Renzo Rodrigues.

Sobre isso, a atitude correta é manter bandeiras ao longo das vias públicas desde que sejam móveis e não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos. Não se pode afixar propagandas em locais públicos e ali permanecer durante todo o período da campanha. É possível serem colocados e retirados diariamente, entre 6h e 22h.

Emprego
Campanha é oportunidade de trabalho temporário


O descontentamento de parte do eleitorado com a presença de cabos eleitorais, entretanto, pode não deixar que seja percebido a quantidade de empregos temporários gerados. Em conversa com uma série dessas pessoas que empunham bandeiras e fazem a distribuição de santinhos ou outros impressos, a reportagem do Diário conseguiu relatos como o de uma jovem, que não quis ser identificada, que estava desempregada há mais de dois meses e viu na campanha eleitoral possibilidade de levantar um dinheiro até o início de outubro. “Comecei anteontem (dia 11) e vou até o dia 6. Foi uma chance de trabalhar. Às vezes o pessoal é grosso com a gente e não entende que esse é apenas um serviço. Nem quer dizer que vamos votar nesse candidato”, afirmou.

A rotina diária de outro grupo encontrado pela reportagem no bairro Alto Umuarama é de seis horas. Aquele era o terceiro local por onde os cabos passavam naquele dia portando bandeiras e santinhos. Sob o sol que beirava os 30ºC, a energia dos cabos eleitorais chamava a atenção de quem passava dirigindo ou tomava café em uma padaria ao lado deles. “É corrido, a gente anda bastante, mas é bom e movimentado”, disse uma das mulheres que agitava uma bandeira.

O vendedor Cláudio Pontes afirmou que ainda que traga algum incômodo, entende que é necessária a existência da figura do cabo eleitoral. “Tem gente que consegue emprego assim e trabalha dentro da Lei. Incomoda, mas a campanha desse ano é mais curta. Dá para aguentar, eles podem trabalhar”, disse.

Brecha
Cabos usam caixa de som nas costas


Com a restrição de uso dos carros de som apenas para carreatas com a presença do candidato e redondezas de comícios, ainda que com tempo limitado, o Diário flagrou cabos eleitorais andando pelo Centro de Uberlândia com caixas de som nas costas e até mesmo na cintura com a veiculação do jingle da campanha de candidatos a deputados estadual e federal.

Em tese, essa é uma brecha possível, uma vez que a legislação estabelece que o uso de amplificadores e alto-falantes podem ser usados entre 8h e 22h, desde que a menos de 200 metros das sedes dos Poderes Executivo e Legislativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; das sedes dos Tribunais Judiciais; dos quartéis e de outros estabelecimentos militares; dos hospitais e casas de saúde; bem como das escolas, bibliotecas públicas, igrejas e teatros, quando em funcionamento.

Contudo, um dos cinco promotores eleitorais de Uberlândia, Fernando Martins explicou que carros plotados ou com propaganda rodando pela cidade estão vedados. “Apenas em carretas e com a participação do candidato”, explicou.

Martins disse que já deu andamento a duas representações feitas ao MPE, ambas contra candidatos ao cargo de deputado. Em uma delas, houve o uso de espaço público para evento de determinado candidato. Na outra, houve o flagrante de uma tentativa de atrapalhar o trânsito para panfletagem. Mas segundo o promotor, há uma série de denúncias sendo feitas diariamente. “Faço uma argumentação e encaminho a Belo Horizonte para verificação da Procuradoria Regional Eleitoral”, afirmou.

Ele se disse preocupado com o uso de dados cadastrais e encaminhamento de mensagens via aplicativos de bate-papo. “Eu permito que um amigo tenha acesso a meu número e nós possamos trocar informações. Mas você pode não querer que um candidato envie mensagem para você. Os dados das pessoas estão sendo transferidos de alguma forma e isso não pode acontecer, a não ser com a autorização do titular. Não pode nem só pela Lei eleitoral, mas pela legislação de proteção de dados e pelo Código do Consumidor”, disse Fernando Martins.
Quem quiser fazer uma representação ao MPE pode procurar a ouvidoria do órgão pela internet ou mesmo ir pessoalmente à sede da promotoria, que, em Uberlândia fica na rua São Paulo, 95, bairro Tibery.
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