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10/08/2018 às 20h50min - Atualizada em 12/08/2018 às 07h50min

O papel de cada pai

Filhos contam suas histórias de amor

CAROLINA PORTILHO
“Ele era nossa base”, disse a filha ao falar do paidrasto Celso | Foto: Karine Andrade/Arquivo Pessoal
A estudante de design Karine Andrade, hoje com 25 anos, não tem contato com o pai biológico, mas aos seis anos de idade conheceu seu “paidrasto”. Ela e a irmã mais velha Karol moravam em Iturama (MG) com os avós e a mãe em Uberlândia quando conheceu Celso Gouveia e foram morar todos juntos. Foram quase 20 anos de convivência com ele até que um acidente os afastou fisicamente. Mas antes da fatalidade, uma história de amor reinou por todo esse período.

“Foi um pai amigo, um anjo em nossas vidas. Fomos as primeiras experiências na vida dele como pai até a chegada da nossa irmã Vitória com 17 anos. Não tive tempo de pensar no que o outro [pai biológico] não fez. Ele supriu tudo. Carinho, amor, educação, companheirismo”, contou emocionada a filha Karine.

Chamado carinhosamente de paizinho, a estudante reforça a importância da figura paterna em sua vida, mas a partir do momento que o homem seja um pai presente e que dê amor, carinho e respeito, seja ele pai biológico ou não. Segundo ela, Celso foi seu maior exemplo de amor e a dor da perda nunca será esquecida por ele ter sido um paizão o tempo todo.

Ela e a irmã estavam indo para Iturama quando o carro estragou. Eles iam acionar o guincho, mas o pai disse que não, que ele iria socorrê-las. Celso pegou a caminhonete e foi de encontro às filhas que estava com um amigo. Carro guinchado, as meninas seguiram caminho para Iturama e o pai com o amigo das filhas no caminho de volta para a casa bateu o carro de frente com uma carreta.

“Uma mulher fez uma ultrapassagem errada e aconteceu essa fatalidade. Só guardo no coração todo o amor que ele deu nesse tempo em que esteve com a gente. Ele era nossa base, tudo que precisávamos bastava chamá-lo. Tanto que ele faleceu nos ajudando”, relembrou a jovem do acidente ocorrido no dia 20 de dezembro de 2016.

Parceria 
Os melhores amigos o tempo todo 


Desde pequeno, Evandro Teixeira Sousa, hoje com 32 anos, circulava na oficina do pai Marcone Elon de Sousa, que desde os 12 anos atua nessa área. Enquanto o pequeno brincava, o pai mostrava de forma sútil o caminho das pedras para quem ainda não tinha ideia do mundo adulto. Entre uma diversão e outra, Elon, como é chamado, ensinava o filho que as conquistas são baseadas numa relação de respeito.

A vivência na oficina despertou no Evandro o mesmo dom do pai. A forma de se expressar e de dialogar, o filho também herdou do pai. “Ele é um exemplo pra mim, meu espelho. Somos unidos, temos diálogo e meu papo com meu pai é de amigo mesmo. Eu tenho orgulho de bater no peito e dizer que sou filho do Elon, tenho orgulho da história de vida dele que aos 12 começou a trabalhar em oficina e depois foi montar o próprio negócio. Ele tem um respeito enorme não só por mim, mas por todos que o conhece”, disse Evandro que hoje é responsável por toda a parte administrativa da oficina.

Longe de pensar na aposentadoria, Elon disse que sente total segurança no trabalho desempenhado pelo filho. Segundo ele, um dos fatores importantes para a construção dessa relação foi o diálogo aberto entre eles. “Ele é meu melhor amigo. Falo de tudo com o Evandro, de assuntos pessoais, viagens, trabalho, e nada melhor do que ter meu filho como braço direito da oficina. Sou grata pelos filhos que tenho e pela história que construímos.

Privilégio
Avô cumpre o papel e supre qualquer carência


Seu José Fernandes da Paz tem 90 anos e não cumpre só o papel de avô. Desde os 8 anos de idade ele assumiu o papel de pai da analista Kelen Alves Fernandes e do irmão dela Wharlhey, hoje com 36 e 33 anos, respectivamente. Após o divórcio dos pais, a ausência do pai foi toda suprida pelo amor dado pelo avô que sempre priorizou a família.

“Somos privilegiados por ter esse grande homem nas nossas vidas. Ele sempre trouxe para perto a família nunca nos faltou nada, pelo contrário. Toda a nossa formação de caráter devemos a ele e não há vida que paguei tudo que ele fez por nós”, contou a neta.

Casado com a dona Raimundo Albertina da Paz de 80 anos, Kelen disse que não sente rancor da escolha do pai em se afastar dos filhos, mas enfatizou que o amor que ela sente Seu José é em dose dupla por ele ter desempenhado o papel de pai e avô e que esse sentimento nunca será substituído.

“Moramos no mesmo terreno desde quando meus pais eram casados. Cada um tem sua casa, mas estamos todos os dias juntos até hoje. Nada é em vã nessa vida. Há males que vem para o bem. Não me imagino ter vivido algo diferente do que eu vivi. Fo sofrido, mas tenho o maior exemplo dentro de casa que é o meu avô. Nada nos falta e nunca faltou amor”.

Seu José Fernandes da Paz foi pai e avô da Kelen Alves e do irmão Wharlhey |
Foto: Kelen Alves/Arquivo Pessoal

"DIREITO DE TER PAI"
Mais do que ter o nome no registro de nascimento


Desde 2002, a Defensoria Pública de Uberlândia realiza mutirões de reconhecimento de paternidade. Nas 11 edições do "Direito de ter pai" foram atendidas 11.759 pessoas em um projeto que tem como principal objetivo aproximar os pais dos filhos. Diante das informações repassadas pelas mães, os pais são convidados a comparecer no dia da ação fazer o reconhecimento. Tudo é feito na hora e de forma gratuita, como a emissão na nova certidão de nascimento da criança.

Caso seja necessário o pai tem à disposição, também de forma gratuita, o exame de DNA. Em 15 dias ele retorna à Defensoria para obter o resultado e dar andamento ao reconhecimento ou não. O mutirão também ajusta questões importantes como guarda da criança, pensão e visitas.
“Durante as execuções criminais constatamos que mais da meta dos presos não têm o nome do pai na certidão de nascimento. Concluímos que esse fato está diretamente ligado à criminalidade e a desestruturação da família a e na vida dessas crianças, na formação de cada uma. Os transtornos psicológicos e sociais desencadeiam no aumento da prostituição, do uso de drogas e dos crimes”, enfatizou o defensor público Fernando Orlan.

Todo o processo do mutirão é realizado de forma extrajudicial, na hora, e sem custos para as partes. Em outras situações o processo pode durar até dois anos. “Queremos o pai presente na vida do filho e assim estamos tratando de uma problemática bem no início, fazendo com que a essa criança tenha menos traumas. O remédio não é a mãe pedir pensão e sim conviver com o pai. O afeto que pode não ter ocorrido no começo vai sendo resgatado aos poucos e sarando as feridas”, finalizou Fernando Orlan.
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