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16/07/2018 às 08h13min - Atualizada em 16/07/2018 às 08h13min

Sem salário, funcionários se manifestam

Grevistas apontam falta de materiais e insumos usados no atendimento; previsão é que pagamento saia até dia 16

NÚBIA MOTA | REPÓRTER
Crosara diz que não vai assumir compromissos impossíveis (Divulgação)
Além do atraso no pagamento dos salários desde janeiro deste ano, que tem gerado uma série de transtornos na vida financeira dos funcionários do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU), os profissionais ainda reclamam da falta e má qualidade dos insumos. Na manhã de ontem, um grupo de contratados pela Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia (Faepu), que aderiu a greve deflagrada na quarta-feira (11), fez uma manifestação em frente ao hospital e denunciou os problemas enfrentados no dia a dia dentro e fora da unidade.

Todas as queixas foram reportadas pelo Diário de Uberlândia ao diretor-geral do HC, Eduardo Gustin Crosara. O médico, gestor da instituição de saúde desde janeiro de 2017, disse que a dificuldade de cumprir até o quinto dia útil a folha de pagamento se deve aos atrasos no repasse da cota de R$ 10 milhões do Ministério da Saúde, além de uma dívida de R$ 20,755 milhões do Governo Estadual.

Ainda de acordo com Eduardo Crosara, o gasto mensal da unidade gira em torno de R$ 12 milhões, mas o Governo Federal repassa entre R$ 10 milhões e R$ 10,5 milhões. Ele explicou que em função do trâmite na prestação de contas, a verba deveria chegar a cada 90 dias. “Mas, na verdade, o dinheiro está sendo depositado entre 110 e 120 dias. Quando eu pago o funcionário até o quinto dia útil, eu já estou suportando três meses sem repasse”, afirmou Eduardo Crosara.
Na quinta-feira (12), depois de um mês de atraso, os R$ 10 milhões de repasse do Fundo Nacional de Saúde (FNS) foram depositados, um dia depois do Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério Público Federal (MPF) ingressarem com ação na Justiça para pedir o bloqueio de mais de R$ 31 milhões nas contas do Estado e da União para assegurar o pagamento de salários atrasados. A previsão, de acordo com o diretor-geral do HC, é que o pagamento dos salários seja feito até a próxima terça-feira (16), mas os funcionários afirmam que só voltam ao trabalho depois de uma garantia, documentada, de que novos atrasos não vão ocorrer. “Eu não vou assumir um compromisso que é humanamente impossível cumprir”, disse Crosara.

Ainda de acordo com diretor, 60% do gasto mensal da unidade é com o pagamento da folha dos 3.454 funcionários, sendo 1.408 ligados a Faepu. Como o dinheiro enviado pelo Ministério da Saúde é insuficiente, a cada mês a unidade tem um déficit de R$ 1,5 milhão a R$ 2 milhões. “Eu entendo o lado dos funcionários, eles estão todos no direito de reivindicar, mas eu preciso que eles entendam a situação e sejam razoáveis. Convido para sentarem na minha cadeira na hora de pagar as contas que não fecham”, disse Crosara.

Insumos

O técnico em farmácia Márcio Rogério Matoso de Oliveira está há 8 meses no HC, na farmácia que atende o centro cirúrgico e UTI coronariana. Segundo ele, no local faltam alguns calibres de sondas de respiração e uretrais e medicações, como alguns tipos de sedativos, analgésicos e anti-hemorrágicos. “Os médicos se adaptam com o que têm. Usam outros tipos de medicamentos, com a mesma finalidade, mas tem gente que tem alergia a certas fórmulas. Jogam a culpa da greve, mas as cirurgias eletivas são canceladas diariamente porque não tem como fazer”, disse Márcio.

A enfermeira Naíla Silva Moura atua há 10 anos na área de hemodinâmica e conta que, na atual gestão, iniciada há um ano e meio, a falta de materiais é pontual no setor em que ela trabalha e o problema maior é com relação ao atraso dos salários. “Não vou dizer que não falta nada, porque falta. Acabou eletrodo na semana passada, mas já foi resposto. Mas na última gestão era pior. No meu setor, onde faz cateterismo, faltava stent sempre. Hoje, o armário está cheio. O problema é que agora compram materiais, mas falta nosso salário no dia certo”, afirmou.

As técnicas em enfermagem Elitânia Mariano Estorino e Wanusa Borges trabalham na UTI adulta e disseram que é comum trabalharem sem capote, aquela vestimenta que cobre o corpo do profissional e do paciente, e que nem sempre é possível trocar os lençóis dos leitos. “Toalha, nunca tem. Estamos enxugando os pacientes com o cobre-leito, aquele lençol de cobrir o paciente”, disse Elitânia. “Às vezes, também dobramos o lençol para fazer de travesseiro, porque não tem travesseiro”, afirmou Wanusa.

Eduardo Crosara disse que, por ano, o HC gasta R$ 117 mil na compra de novos enxovais para repor peças estragadas ou levadas pelos pacientes. Agora, a direção estuda uma forma de colocar chips nas peças para evitar os furtos. “Quando há falta de medicamento, acontece raramente por atraso do fornecedor, mas logo é reposto. Sobre a qualidade do material, as pessoas precisam entender que estamos em um sistema público, licitamos, e a empresa ganha, manda o material e depois fazemos alguns ajustes no edital. Temos mais de 22 mil itens para observar”, disse Crosara.
Ainda de acordo com o diretor-geral do HC, para colocar todos os equipamentos parados novamente em funcionamento, seria preciso R$ 5 milhões e outros R$ 250 mil para garantir a manutenção. “Como o dinheiro é curto, às vezes deixo de fazer isso, porque preciso pagar o salário, a comida do paciente que está internado, para garantir remédios”, disse.
 
Dívidas
“Minha vida virou uma bagunça”, diz funcionária

 
A assistente administrativo Ana Lúcia dos Santos está há 24 anos HC e disse que, devido aos frequentes atrasos no pagamento do salário, está no vermelho, pagando juros no cheque especial. “Minha vida virou uma bagunça. Essa gestão é a que mais vira as costas pra gente. Dá o dia do pagamento e não paga”, afirmou.
A enfermeira Naíla Silva Moura está contando com o marido para pagar as contas e já precisou recorrer também a parentes. “Eu estou pagando muito juro, muito cheque especial. Essa é a pior época do HC para gente nesse sentido”, afirmou.
O cozinheiro José Maria Rodrigues também está com o aluguel e todas as contas em atraso. “Eu estou até com vergonha de chegar na minha casa, porque o dono do imóvel está todo dia na porta me esperando”, disse.
Além das dívidas em atraso, a técnica em enfermagem Wanusa Borges disse que foi financiar um apartamento recentemente, quando descobriu que o dinheiro do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) não estava sendo depositado desde janeiro do ano passado.
 
OUTRO LADO
Ministério e Estado se posicionam sobre dívidas

 
O Ministério da Saúde informou por meio de nota que em 2017 foram executados R$ 126,9 bilhões, sendo R$ 115,3 bilhões especificamente as Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS). Para 2018, o orçamento é de R$ 131,2 bilhões, sendo R$ 119,3 bilhões para ASPS. Para Minas Gerais, foram destinados até o momento R$ 4,9 bilhões para o financiamento dos blocos de assistência em saúde. Só para o município de Uberlândia, já foram destinados ao fundo municipal de saúde R$ 167,2 milhões, dois quais R$ 128 milhões para custeio de média e alta complexidade. O Ministério da Saúde informou ainda que não repassa recursos diretamente às instituições de saúde (hospitais, Clínicas), cabendo ao gestor municipal ou estadual fazer o repasse para a unidade. “Cabe ressaltar que o repasse está regular em todo o país”, disse.

Também em nota, a Secretaria de Estado de Saúde informou que ontem foram assinadas duas ordens de pagamento para o HC-UFU, o que corresponde ao valor de R$ 150 mil.
Sobre os demais pagamentos pendentes, informou que o Estado de Minas Gerais enfrenta um crescente déficit financeiro refletindo em todos os seus órgãos, o que motivou a decretação da situação de calamidade financeira, em dezembro de 2016. Ressaltou ainda que o Sistema Único de Saúde, hoje, é subfinanciado por conta de políticas federais, e é fundamental se mudar essa lógica. Diante disso, a Secretaria tem se esforçado para honrar os compromissos pactuados, manter as ações e dar os melhores encaminhamentos possíveis, ante o contexto supracitado.
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