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29/04/2018 às 09h03min - Atualizada em 30/04/2018 às 17h52min

Inverno mais rigoroso em um século mobilizou climatologistas para desmentir

Notícia que circulou pela internet e nas redes sociais recentemente é mentira

VINÍCIUS LEMOS | REPÓRTER
 
A notícia falsa encheu as caixas de mensagens e proliferou pelo Whatsapp e redes sociais: Simulações atmosféricas pontam que o Brasil terá o inverno mais rigoroso dos últimos 100 anos. As regiões Sul e Sudeste, além do Distrito Federal e dos Estados de Goiás e Mato Grosso do Sul terão recordes negativos de temperatura. 

Mas assim como uma massa de ar polar que cobre um País inteiro, o fake news, que em português significa notícia falsa, tomou uma proporção tão grande que levou órgãos como o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e Climatologia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) a se manifestarem sobre o assunto. A previsão oficial é de inverno na normalidade para todo o País.

Uma nota oficial do Inmet, assinada pelo diretor Francisco Assis Diniz, informa em suas primeiras linhas que o boato “não possui qualquer fundamento técnico/científico, nenhuma base de estudo de pesquisa climatológica ou de previsão climática”. O que foi seguido pela UFU, a partir de informações do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC). De acordo com a nota da universidade, as previsões são feitas com no máximo três meses de antecedência, sendo que reunião mais recente aconteceu neste mês de abril e fará a previsão para os meses de maio, junho e julho. “Porém até o momento não há dados que corroborem com a previsão citada para o inverno. Lembrando que essas previsões são uma média para o período, o que não descarta a ocorrência de dias isolados com a ocorrência de temperaturas mínimas extremas”.

O climatologista da UFU, Paulo César Mendes explicou que as previsões para a região de Uberlândia para o inverno, que se inicia em 21 de junho, são as mais normais possí- veis, com características bem definidas, com temperaturas que podem estar perto de 25ºC durante a tarde e com queda entre a noite e a manhã, ficando abaixo dos 15ºC, com períodos de até cinco dias em que as temperaturas caem mais devido à presença de frentes frias, que passam se tropicalizam e fazem as temperaturas se elevarem novamente. “Não temos períodos de dois ou três meses como em países como Estados Unidos de frio permanente” afirmou Mendes.

Ele chama a atenção ainda para um problema na notícia falsa que o cálculo de médias nem sempre se mostra perceptível para diferenças tão grandes que justificariam esse tipo de notícia. “Depende muito da região do País. Fazemos o cálculo das médias, e elas mascaram pontos extremos. Quando fazemos a perspectiva dos últimos anos, isso é pouco perceptível para a população”, afirmou.

O climatologista do Inmet em Belo Horizonte, Jorge Luiz Moreira, reiterou que há previsão para os próximos três meses é de igualdade ao que aconteceu ao inverno de 2017, o qual teve temperaturas de até 7ºC no Triângulo Mineiro em cidades como Uberlândia. “Houve relatos de que o inverno foi mais rigoroso no ano passado. Mas o que chamou a atenção nos invernos anteriores a 2017, é que as temperaturas foram mais altas que o normal. Em 2017 foi na normalidade”, disse e reiterou que o inverno de 2018 deve seguir as mesmas características do ano anterior.

O CPTEC ainda contestou mais argumentos da falsa notí- cia, como a citação de que fenô- meno La Niña seria a principal causa do resfriamento recorde. “Porém, o atual fenômeno está em vias de finalização, e não deve estar ativo durante o inverno. Nesse período as previsões indicam que as anomalias de temperatura da superfície do mar no Pacifico Equatorial (região onde ocorre o fenômeno La Niña) devem ficar próximas da neutralidade. Além disso, apenas a ocorrência da La Niña não é suficiente para causar o inverno mais frio dos últimos anos”, segue a notificação do centro.

O que foi corroborado por Diniz no comunicado do Inmet, ao se fazer a comparação entre modelos de previsão de temperaturas para o inverno de 2018. Eles indicaram condições dentro da normalidade, com algumas ondas de frio que devem atingir até a parte sul da Região Norte do Brasil.

UFU

A origem do boato é difícil de precisar, mas os climatologistas da UFU e do Inmet informaram que o se tem é uma grande especulação e isso dá trabalho para os órgãos que fazem um trabalho sério sobre o clima. “Há uma maior procura por informações ao mesmo tempo que existe toda essa especulação. Recebemos muitas ligações. Mas quando falamos desses últimos depende da dinâmica meteorológica de cada região”, disse Paulo César Mendes.

Jorge Luiz Moreira explicou que é importante buscar informações para além de redes sociais ou aplicativos de troca de mensagens. “Quem tiver interesse e saber de verdade o que acontece deve procurar órgãos competentes no assunto. Eu estou no Inmet, mas há outros no País com relevância”, afirmou. Ele ainda lembrou que a pergunta ser feita é: onde eu li, apenas na internet ou em uma mensagem recebida? Uma informação exagerada pode ter sido criada assim apenas para chamara a atenção e circular facilmente pela internet.

COMÉRCIO

Desde fevereiro, antes das temperaturas começarem a cair, o comércio começou sua preparação para as estações do outono e do inverno. As temperaturas, segundo especialistas, começam a cair entre o fim de abril e o início de maio e o frio terá o auge no meio do ano na região de Uberlândia.

O gerente de uma loja de roupas no centro da cidade, Cícero Feitosa, afirmou que no ano passado houve um faturamento maior em torno de 50%, mas que notícias falsas não podem influenciar seu trabalho mesmo com o bom resultado do ano passado. Ele lembra que a rotatividade de casacos, blusas, cobertores e outras peças nem sempre é tão grande, mas que o valor agregado em cada produto ajuda na manutenção dos ganhos. “Estamos confiantes, mas notícias como essa (o inverno mais rigoroso em 100 anos) não podem me fazer mudar meu planejamento. O público só compra de verdade quando o frio chega e o estoque não pode ser demais para encalhar nem pequeno e eu não conseguir atender o cliente”, afirmou.

CLIENTE

Na mesma loja, a reportagem encontrou o aposentado Osvaldo Alves procurando por uma blusa, só que ele deixou para comprar depois. “É preciso pesquisar, o preço às vezes aumenta quando vai chegando perto da época em que faz frio. Eu passei aqui, mas vou em outra loja”, explicou. Ele ainda aguarda a chegada de mais variedade de peças. “Talvez acho outra que me sirva e com mais peças pode variar mais o preço”, disse.

Moradora da cidade de Prata, a dona-de-casa Érica Santos Silva vem a Uberlândia semanalmente para visitar e auxiliar sua mãe e disse que a cidade já está mais fria. Para ir ao Centro com a mãe, ela precisou usar duas blusas pela manhã. “O frio de Uberlândia já me fez colocar blusas. Mais de uma mesmo, acho aqui mais frio que Prata. Ano passado sofri muito em junho e julho”, afirmou.

A expectativa de Érica Silva é de um inverno mais frio, mas isso não tem nada a ver com a fake News do frio recorde para 2018. “Fiquei sabendo dessa notícia não, ainda bem que não vi e é mentira. Ia sofrer antes”.

Recordes de temperaturas baixas – Inmet

18 de julho 1975
(A MAIS INTENSA: -10,0°C, em Guarapuava/PR),

31 de maio 1979
-0,7°C, em Orleans/SC),

21 de julho 1981
(-8,4ºC, em Maria da Fé/MG),

Julho de 1985
(-4,8ºC, dia 11/07, em Campos Novos/SC),

26 de junho de 1994 a 10 de julho de 1994
(-6,2ºC, dia 26/06, em Bom Jesus/RS),

Julho de 1999
(-1,5ºC, dias 05/07 e 31/07, em Bom Jesus/RS),

Julho de 2000
(-9,0ºC, dia 14/07, em São Joaquim/SC) e

Julho de 2017
(-4,0ºC, dia 19/07, em Irati/PR).
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