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11/03/2018 às 05h10min - Atualizada em 11/03/2018 às 05h10min

Alto custo é entrave para certificação de queijo artesanal

Apenas 266 produtores têm cadastro no programa Queijo Minas Artesanal de MG, ou seja, menos de um por município no estado

NÚBIA MOTA | REPÓRTER
Matheus Machado vende queijo artesanal de 12 fornecedores do estado de Minas Gerais | Foto: Núbia Mota

A produção do Queijo Minas Artesanal, um dos maiores patrimônios do povo mineiro, remete a uma viagem pela história do Estado. Apesar de secular, a iguaria passou a ser certificada há quatro anos no Triângulo Mineiro, a sétima e última região de Minas Gerais reconhecida como produtora. Em Uberlândia, são seis queijarias cadastradas e certificadas. O Governo do Estado e do Município, no entanto, anunciam metodologias que deveriam simplificar a fabricação e coibir a produção clandestina.

Nos 853 municípios mineiros, existem 266 produtores cadastrados no programa do Queijo Minas Artesanal, segundo contagem do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), o que representa menos de 1 por município no estado.

O Governo de Minas Gerais, por intermédio da Secretaria de Estado de Agricultura, Emater-MG e o próprio IMA, desenvolve o programa do Queijo Minas Artesanal. O estado trabalha com número estimado de 30 mil produtores de queijos artesanais, não certificados que produzem aproximadamente 50 mil toneladas por ano.

A explicação, para a baixa adesão segundo o produtor José Eustáquio Moreira Jordão, que é certificado, está no alto investimento para se adequar às normas exigidas pelos órgãos competentes. “Eu gastei cerca de R$ 100 mil na minha estrutura, tanto no local de preparação dos queijos, quanto no curral. São muitas exigências e muito investimento”, afirmou José Eustáquio, dono da Queijaria Jordão que fica na região de Rio das Pedras, em Uberlândia, às margens da BR-365.

Segundo Áurea Mundim, extensionista de bem-estar social da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG), a maioria dos Queijos Minas Artesanais que chegam a Uberlândia vem de outras cidades na carroceria dos veículos, sem nenhum controle de qualidade. “Não se sabe de onde vem o leite, se a vaca tem doença, se a água utilizada durante a fabricação é limpa. Isso tudo é um risco para saúde pública, mas como ainda fica caro ter um local apropriado, muitos ainda estão irregulares”, disse ela.
 
RETORNO FINANCEIRO

Apesar das exigências para a fabricação do Queijo Minas Artesanal, José Eustáquio Jordão garante que já conseguiu reaver todo investimento feito na sua propriedade. Hoje, ele fabrica cerca de 50 kg de queijo, com a ajuda de três funcionários, e comercializa o produto em grandes redes de supermercado de Uberlândia, além de Uberaba, Monte Alegre de Minas e Tupaciguara, sendo as duas últimas cidades incluídas no circuito do queijo dentro da região do Triângulo Mineiro. “É uma tradição da minha família a produção de queijo. Meu avô fazia, meu pai fazia. Eu vendia sempre nos mercados, como muita dificuldade, mas agora pude aumentar minha produção”, afirmou o produtor.

José Eustáquio já foi premiado em vários concursos locais e no Estado. No ano passado, ele representou a região do Triângulo Mineiro em uma viagem à França, onde aprendeu as técnicas de fabricação do queijo naquele país.
 
MUDANÇAS

A partir de agora, as exigências de comprovação obrigatória para o registro de produtor de Queijo Minas Artesanal junto ao IMA, caso o produtor queira vender o produto em todo Estado, ou na Prefeitura, caso a comercialização seja apenas no município, estão reunidas em cinco requisitos: cumprimento das boas práticas de fabricação; realização de dois tipos de análises – da água e do queijo, de acordo com os parâmetros da legislação vigente; sanidade do rebanho e saúde dos trabalhadores. “A lei continua a mesma, mas agora vai ficar mais fácil para cadastrar, vai agilizar. O IMA vai até o local da produção, vai dizer o que precisa mudar na estrutura física. Se o produtor já tiver um curso de manipulação, pode começar a comercializar e ir melhorando a estrutura. Antes, precisava ter o local todo pronto. Agora, a queijaria pode ser um pouco mais simples”, afirmou Áurea Mundim. 
 
COOPERATIVAS

Venda do leite é mais negócio na região

Matheus Tomaz Machado, dono do Empório Colheita, no Fundinho, setor central de Uberlândia, compra Queijo Minas Artesanal de 12 fornecedores da Serra da Canastra, Serra do Salitre e a região de Campo das Vertentes, na Serra da Mantiqueira. Apenas um dos vendedores é de Uberlândia, a Queijaria Jordão. Para o empresário, os produtores da cidade ficaram muito em função da produção de leite para a Cooperativa Agropecuária de Uberlândia (Calu) e por isso não investiram na fabricação de queijo. “Com certeza, tem muita gente informal. É o cara que produz um queijinho para vender para o vizinho ou traz à cidade para vender na feira. Ele faz isso por sobrevivência mesmo, não com caráter comercial”, afirmou.

Matheus não acredita que as mudanças divulgadas pelo Governo de Minas venham aumentar significativamente o número de produtores cadastrados na cidade. “É muito imposto. Infelizmente, a gente percebe que as leis favorecem as indústrias e desfavorecem os pequenos. O pequeno só consegue ter poder quando junta com os outros. Sozinho ele não consegue”, disse o empresário.

Segundo a secretária municipal de Agricultura de Uberlândia, Walkiria Naves, o baixo número de produtores de Queijo Minas Artesanal se deve, primeiramente, a história do desenvolvimento agropecuário da região, privilegiada pela facilidade de transporte. “A logística e o acesso aqui em Uberlândia eram muito mais fáceis do que em outras cidades. Por isso, se optou por vender o leite mesmo. Tínhamos essa produção de queijo, mas foi se perdendo. Coromandel, por exemplo, não se perdeu, por causa do difícil acesso”, afirmou.

A secretária também concorda que há dificuldades de cadastramento para se produzir o Queijo Minas Artesanal, pelo alto gasto que é preciso fazer para se adequar a lei. Mas para ela, a qualidade do produto depende muito mais do modo de produção, olhando, por exemplo, a qualidade da água e do rebanho, do que a estrutura física. “Do que adianta uma cozinha maravilhosa, se não são usadas boas práticas. Por isso, com essas mudanças que o Governo de Minas se propõe a fazer, acho que vai facilitar”, disse Walkiria Naves.
 
7 regiões mineiras produtoras do Queijo Minas Artesanal

- Canastra
- Cerrado
- Araxá
- Salitre
- Serro
- Campo das Vertentes
- Triângulo Mineiro (Uberlândia, Araguari, Cascalho Rico, Estrela do Sul, Indianópolis, Monte Alegre de Minas, Monte Carmelo, Nova Ponte, Romaria e Tupaciguara)

O que é o Queijo Minas Artesanal
 
Para ser reconhecido como Queijo Minas Artesanal é necessário mão de obra familiar, não permitindo a produção em alta escala, nem com leite pasteurizado. Alguns fatores são decisivos, como o clima ameno, altitude elevada, pastos nativos, águas puro e o uso do leite de vaca fresco e cru.
 
Exigências
 
- Cumprimento das boas práticas de fabricação
- Realização de dois tipos de análises – da água e do queijo
- Sanidade do rebanho e saúde dos trabalhadores
 
Principal mudança

Estrutura física mais simples
 
Reconhecimento
 
Em maio de 2008, o Queijo Minas Artesanal foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro pelo Instituto Patrimônio Histórico Nacional (Iphan). Seis anos antes, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) já havia concedido o título de Patrimônio Imaterial ao alimento.
 
História
 
A história do Queijo Minas Artesanal remonta à descoberta do ouro na Capitania de Minas Gerais, que se tornou Província em 1822, antes de se tornar Estado após a Proclamação da República, em 1889. No fim do século 17 e início do século 18, muitos portugueses vieram ao Brasil em busca das riquezas que a região dispunha. Como precisavam de um alimento que durasse o dia todo e que resistisse às longas jornadas, os viajantes adaptaram uma antiga receita portuguesa de queijo coalhado produzido a partir de leite fresco. Alguns anos antes, um dos pintores oficiais da família real portuguesa, Jean-Baptiste Debret (1768-1848), já havia relatado que os brasileiros costumavam comer, após as refeições, um produto que ele nunca havia visto e que era conhecido como queijo-de-minas.
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