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27/03/2017 às 08h28min - Atualizada em 27/03/2017 às 08h28min

Apac deveria estar pronta há dois anos

NOVA SEDE ESTÁ EM CONSTRUÇÃO NA ZONA RURAL DESDE 2014 E ÚLTIMO REPASSE DO ESTADO FOI EM 2015

Walace Torres - editor
Novo espaço tem 10 mil m2 de área e vai receber 204 recuperandos, cinco vezes mais que antiga sede

Há mais de oito meses, o sistema prisional em Uberlândia não conta com um dos principais espaços destinados à reinserção de detentos ao convívio em sociedade, bem como sua capacitação para exercer uma nova atividade profissional. O antigo imóvel que abrigava a sede da Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac) foi devolvido no final do primeiro semestre do ano passado porque não comportava as atividades desenvolvidas com os 40 recuperandos atendidos pela unidade. O imóvel era alugado e ficava no Centro de Uberlândia. A prioridade, então, passou a ser a finalização das obras da sede própria, em construção na zona rural.

Só que a obra esbarrou na burocracia e desde outubro de 2015, o Estado não fez mais nenhum repasse para a construção da nova Apac, que deveria ter sido concluída naquele mesmo ano. Segundo o presidente da Apac Uberlândia, Renato Gularte, a obra começou em 2014 com previsão de término em 18 meses ao custo de aproximadamente R$ 8 milhões. Desses, R$ 5,3 milhões já foram investidos por meio de convênio. Pelo menos 85% das obras já estão prontos. O restante do dinheiro, além de finalizar o prédio, também vai ajudar na aquisição do mobiliário. “Se o Estado repassasse o que está faltando, colocaríamos a Apac para funcionar em três meses”, disse, acrescentando que uma das alas já está mais avançada, restando apenas a pintura das paredes e a mobília.

A nova sede fica numa área de 48 mil m2 ao lado da Penitenciária Pimenta da Veiga. A construção ocupa 10 mil m2 e irá abrigar 204 recuperandos, ou seja, cinco vezes mais que a antiga sede comportava. Serão 52 recuperandos numa ala destinada ao regime semiaberto, outra ala com 52 homens no regime intramuros (que passam o dia desenvolvendo atividades na Apac) e mais 100 em outro setor destinado ao regime fechado.

Segundo Renato Gularte, o atraso nas obras tem gerado grande prejuízo ao Estado e ao sistema prisional. “No sistema prisional o custo mensal de um preso é de R$ 2,5 mil a R$ 3 mil. Na Apac esse custo fica abaixo da metade, em torno de R$ 1,2 mil no máximo”, conta. “Se o Estado não se manifestar até o fim deste mês, vamos pedir ao Ministério da Justiça que encampe o restante da obra. O Governo Federal liberou R$ 2 bilhões para o sistema prisional via estados”, disse.

Além de garantir uma remuneração com alguma atividade profissional e ainda ter direito à remissão da pena – para cada três dias de trabalho se reduz um dia da pena -, o sistema Apac oferece condições mais adequadas que um presídio ou penitenciária. As celas na nova sede da Apac vão receber no máximo seis presos cada, tendo ainda condições de acessibilidade.

A seleção dos detentos que vão para a Apac é feita pelo juiz da Vara de Execução Penal, a partir da manifestação do próprio preso. Na Apac, eles passam por um processo de transição até conquistarem novamente o direto à liberdade. “A intenção é que após esse período ele volte ao convívio social trabalhando e tendo o contato com a família. Na Apac ele ainda aprende aquilo que não existe dentro da prisão, que são o respeito e a disciplina”, diz o presidente da Apac Uberlândia.

Além do trabalho, o recuperando tem acesso à alfabetização, atividades religiosas de acordo com o interesse, orientações, treinamentos e trabalhos artesanais. Segundo Renato Gularte, quando a nova sede estiver pronta, serão disponibilizados espaços para implantação de galpões destinados aos setores produtivos. “Já existe um entendimento com instituições que querem fazer treinamentos e utilizar a mão de obra, como sindicatos da construção civil, panificação, setor calçadista, de confecção. Quando o recuperando concluir a sua pena, ele terá aprendido um ofício e terá a chance de ser colocado no mercado de trabalho”, diz Renato, citando que a Fiemg já demonstrou interesse em firmar parceria com seus sindicatos.

 

ESTADO

Sistema Apac tem mais de 3 mil recuperandos

 

O sistema de ressocialização de detentos oferecido através da Apac conta hoje com 39 unidades em Minas Gerais. Atualmente, 3.075 recuperandos estão custodiados nessas unidades. O atendimento é feito por meio de convênio com a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). No ano passado foi criada a Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi), que é responsável pela gestão de 186 unidades prisionais.  Em todas elas, há indivíduos privados de liberdade trabalhando.

Segundo a Seds, Minas tem hoje 67 mil presos, dos quais 17 mil trabalham, o que representa 25% da população carcerária. É o maior índice entre os estados da região Sudeste - São Paulo tem 21%; Espírito Santo, 13%; e Rio de Janeiro, 4%. Em Minas Gerais, são 109 tipos de atividades em penitenciárias, presídios e APACs. Entre elas, se destacam: cozinha, confecção de roupas, móveis, eletroeletrônicos, construção civil, indústria alimentícia, autopeças, horta, artesanato, entre outras.

Os serviços e treinamentos são feitos por meio de parcerias com instituições e empresas. Atualmente, em todo o Estado, são 356 parcerias. A meta é dobrar esse número em dois anos. Para isso, a Superintendência de Trabalho e Ensino tem promovido encontros com empresários de todas as regiões de Minas para apresentar o modelo de trabalho.

A remuneração dos presos é de, pelo menos, ¾ do salário mínimo. Os empresários não têm encargos trabalhistas nem gastos com aluguel.

 

OUTRO PRÉDIO

Diretoria pensa em unidade feminina

 

WALACE TORRES

Renato Gularte disse que repasse não foi atualizado

 

Além dos três pavimentos destinados aos recuperandos, a nova sede da Apac em Uberlândia vai contar com área administrativa, de serviços, salas para treinamento e capacitação, consultório médico, quadra esportiva, cozinha e lavanderia. Há ainda  uma área destinada à produção de hortifrútis.

A direção da entidade tem intenção de entrar com um pedido de autorização para instalar também uma unidade feminina. “Temos área suficiente para construir a Apac feminina, que será isolada da Apac masculina e ficará num outro canto do mesmo terreno”, disse Renato Gularte.

 

Repasses

 

Procurada pela reportagem do Diário do Comércio, a Secretaria de Defesa Social informou, por meio de nota, que o recurso previsto para a obra foi totalmente repassado.  No entanto, destacou que a verba foi insuficiente para a conclusão e que o Estado busca recursos para o restante da obra.

O presidente da Apac em Uberlândia afirmou que todo o montante destinado ao projeto foi aplicado na construção e que os valores são referentes ao ano de 2013, quando foi assinado o convênio. “Não houve nenhuma correção da inflação durante o período. O que estamos aplicando na obra é no valor de dezembro de 2013”.

 

RECUPERAÇÃO

Índice de reincidência é mínimo

 

No último ano de funcionamento da antiga sede da Apac, 100 recuperandos passaram pela unidade. Desses, apenas três reincidiram no crime, segundo notícias obtidas pela diretoria. “O recuperando tem um atendimento diferenciado para que valorize aquilo que ele tem na sociedade”, diz Renato Gularte.

Silva, nome fictício, passou cinco meses em regime semiaberto na Apac. Ele havia sido pego com uma arma de fogo sem ter autorização de porte. Na época, não chegou ser preso. Mas, algum tempo depois não teve a mesma sorte, foi abordado portando munição e sentenciado a um ano e meio em regime semiaberto.

Em vez de cumprir a pena na Colônia Penal, ele conseguiu autorização para ficar na Apac. Durante o dia trabalhava normalmente e, ao final, retornava à unidade onde estudava, passava a noite, participava de treinamentos e fazia artesanato, que lhe rendia uma grana extra. Foram cinco meses nessa rotina diária. “Dormir lá me fez pensar na vida e enxergar coisas melhores”, diz Silva, que completou sete anos de carteira assinada. “Arma nunca mais, nem de brinquedo”, ressalta.


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