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03/09/2023 às 14h00min - Atualizada em 03/09/2023 às 14h00min

Artistas analisam cenário e evolução da arte urbana em Uberlândia

Diário conversou com agentes culturais de diferentes setores; confira

IGOR MARTINS I DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Nascido na periferia de Uberlândia, Kakko é grafiteiro e educador social na cidade I Foto: ACERVO PESSOAL
A arte está presente a todo momento na vida das pessoas. Seja através da música no rádio, do cinema ou no grafite de um viaduto congestionado, a cadeia cultural nunca para no meio urbano. Com 135 anos de história, é possível dizer que Uberlândia é uma cidade profunda e multicultural quando se fala no “fazer artístico”.
 
Os agentes culturais são peça fundamental na criatividade e na identidade urbana de Uberlândia. É através deles que há avanço social e político, a preservação da memória e a história da cidade e, com isso, a forma com que a população vive e interage com o meio urbano muda. O Diário conversou com artistas locais, que relataram o relacionamento e a conexão com o município.
 
A uberlandense Débora Costa, também conhecida como Preta em Flor, é uma das agentes culturais responsáveis pelo avanço da cultura hip-hop e do grafite na região, sobretudo nas comunidades periféricas de Uberlândia. O reconhecimento de seu trabalho é tão grande que a ela foi responsabilizada a curadoria da exposição “Perspectivas: olhares sobre a cidade”, que ocorreu de 16 a 30 de agosto.
 
Organizada pela Brasal Incorporações, a mostra integrou a campanha “Uberlândia 135 anos: Quando sonhos se somam, o futuro se concretiza”. A exposição trouxe diversas linguagens como pintura, grafite, ilustrações, fotografia, colagens e esculturas sonoras sobre diferentes pontos de vista do município, com poéticas distintas para celebrar a cidade.
 
A mostra teve a participação de 10 artistas independentes de Uberlândia e “uberlandinos”, pessoas residentes na cidade há muito tempo, como Clariá, Curió, Dani Perret, Dequete, Guideki, Kakko, Laura Jager, Mari Côrtes, Muzai, Rafael Naufel e Victor Ilustrador.
 
De acordo com Débora, as obras escolhidas são parte da cidade e compõem sua paisagem, seja pelos trabalhos indoor e a ocupação desse espaço interno de empresas e residências ou, ainda, por ocupar o cenário do urbano em muros e fachadas. “Estes artistas partilham do amor pela cidade e vivem de seu movimento dinâmico, mostrando exatamente o fluxo da cidade a partir de suas óticas e da poética de seus trabalhos”, disse.

 
 
Em conversa com a reportagem, Preta em Flor contou que a exposição foi uma forma de fomentar ainda mais o eixo cultural de Uberlândia, entregando possibilidades a artistas e permitindo que as pessoas pudessem visitar o espaço independente. Na visão dela, o caminho para a maior valorização da classe ainda é longo, mas há um “horizonte de possibilidades” neste sentido.
 
“Pensar no meu papel no cenário local vem muito dessa ideia de polinizar algumas ideias e visibilizar trabalhos. O fazer artístico não se faz de modo solo, se faz pela articulação, e que bom saber que temos conseguido isso. Uberlândia é uma cidade muito potente e espero cada vez mais que a gente promova ações e fomento. Que a arte nas variadas manifestações tenha reconhecimento e espaço”, conta Preta em Flor.
 
GRAFITE
Um dos principais nomes da cultura hip-hop uberlandense, Cleiton Rocha Santos, popularmente conhecido como Kakko, foi um dos artistas presentes na exposição. Ele apresentou a obra “Nuances”, três telas com a técnica do grafite que retratam a sociedade atual.
 
Kakko explica que desenhou uma criança atrás de vários prédios como uma crítica ao preconceito existente na sociedade brasileira. A ideia, segundo ele, foi de transmitir a importância de entregar oportunidades para pessoas de todas as classes sociais.
 
“Todos devem ter as mesmas oportunidades. Eu sou um artista preto, pobre e de periferia. Retrarei um mundo mais igual onde todo mundo possa ter oportunidades. Nossos artistas precisam ser muito mais valorizados. Minha área no grafite é desenhar pessoas que são invisíveis para muitos”, detalhou o educador social e grafiteiro.

UBERLÂNDIA ATRAVÉS DAS LENTES
É através das lentes de sua máquina fotográfica que Dani Perret, que também participou da exposição, mostra uma Uberlândia que passa despercebida por grande parte da população, principalmente pela vida agitada. Natural de Belo Horizonte, mas criada em Uberlândia, ela afirma que se apaixonou pelas várias paisagens da cidade. Ela conta que os contrastes mudaram com o decorrer dos anos, mas que ainda é possível observar a beleza rural em meio ao contexto urbano.
 
A mineira de 42 anos cresceu no bairro Cidade Jardim. Segundo ela, a paixão pela fotografia foi herdada da avó. Ela tinha uma máquina fotográfica e, na época, Uberlândia ainda vivia uma expansão tímida em comparação aos dias atuais. A verticalização através das altas construções não existia e dava lugar a fazendas, árvores e plantações que se estendiam por quilômetros e quilômetros de extensão.


 
“Eu acompanhei o crescimento da região sul, ficava vendo as vaquinhas indo e vindo. Eu fotografava plantas, na época a paisagem era diferente, a cidade cresceu muito. Eu sou apaixonada por Uberlândia e por todo esse visual. As minhas fotografias são por amor à cidade e para despertar e conscientizar as pessoas, especialmente sobre as árvores e as queimadas. Hoje em dia, as pessoas não têm tempo para ver um pôr do sol ou a lua”, disse.
 
Graduada em design de interiores pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Dani se especializou em paisagismo e daí o amor pela natureza aumentou ainda mais. Uma de suas principais marcas profissionais tem relação com as árvores e uma marca muito expressiva de Uberlândia: os famosos ipês coloridos, que começam a dar as caras durante o mês de agosto.
 
Com o passar do tempo, Dani Perret explica que a cidade foi perdendo muito de sua área verde. Seu trabalho como fotógrafa busca conscientizar a população sobre isso. Ela diz que usa a fotografia como forma de pressão, já que como ela mesmo diz, “a fotografia é o poema da alma”.
 
“Eu não sou muito boa com palavras. Eu tento me expressar no meu silêncio, porque uma imagem fala tudo o que eu preciso. É meu dever como cidadã alertar para essas coisas. Todo mundo fica apaixonado quando vê os ipês florindo, mas a cidade precisa de mais área verde, Uberlândia já foi muito mais arborizada”, revelou a artista.
 
ILUSTRAÇÕES
Quem também participou da exposição foi a ilustradora Rhayani Curió, que começou a trabalhar com pinturas em 2012, quando entrou na faculdade de design pela UFU. Na mostra, ela levou obras em Fine Art, em superfície Canvas, com reproduções de versões originais utilizando tinta acrílica.
 
De acordo com Rhayani, a paixão pela ilustração começou há muito tempo, mas foi em Uberlândia que a prática se desenvolveu. Foi por aqui que a artista passou a participar de eventos culturais, feiras e exposições coletivas. Atualmente residindo em Tupaciguara, ela segue tendo uma conexão muito próxima com a cidade.
 
“A Curió surgiu a partir da relação com Uberlândia. A cidade influencia muito na criação do artista. Eu nunca fiz aula de pintura, nunca fiz aula de desenho. No meu trabalho, a natureza é muito presente. O meu trabalho é a minha visão de mundo, a gente acaba retratando o que a gente enxerga e o que a gente é”, disse a ilustradora.


 
NOVA GERAÇÃO
Um dos nomes mais conhecidos no cenário cultural local, o grafiteiro Dequete também esteve presente na exposição com seu carro-chefe. Nascido em Belo Horizonte, ele veio para Uberlândia em 2013 e tem atuado no eixo artístico da cidade desde então. Em entrevista ao Diário, ele falou sobre os avanços na área e sobre a nova geração de artistas regionais responsáveis pelas transformações culturais da região.
 
Dequete conta que, quando chegou a Uberlândia, o fazer artístico já existia, mas em menor número e intensidade como acontece nos dias atuais. Além disso, grande parte dos agentes culturais eram pessoas oriundas de outras cidades do país, como é o seu caso. Agora, o município tem sido o berço de novos artistas uberlandenses, comprovando o avanço do eixo cultural local.
 
“A história da arte de Uberlândia passa muito por agentes de fora, a grande maioria veio das outras cidades. A gente tem agora uma nova geração de artistas locais. A gente avançou bastante, mas a categoria ainda precisa de apoio do poder público. Que bom toda essa miscelânea de artes na exposição. Isso é muito importante para Uberlândia. A cidade chega aos seus 135 anos disposta a dialogar com o novo”, disse o grafiteiro.


 
DANÇA
Uma arte cada vez mais difundida e consolidada em Uberlândia é a dança. No ballet, na dança contemporânea, no breakdance e no sapateado, a cidade é referência na criação de coreografias e eventos destinados à prática. Dançarina desde criança, Karyne Bittencourt também falou sobre sua relação com a arte e o município.
 
Aos 35 anos, a uberlandense leciona há 18 na Cia de Dança Bittencourt, onde é diretora. O gosto pela dança é de família: a avó tocava sanfona e dançava bolero, a tia tinha talento com pintura e a mãe, que fundou a companhia de dança, passou para ela o amor pela prática. Com a facilidade do acesso à dança e um talento de família, ela decidiu seguir os passos e não se vê fazendo outra coisa atualmente.
 
“A companhia foi criada em 1998 e eu já acompanhava de longe e com muita admiração. Aos oito anos eu já começava a criar coreografias infantis com as minhas coleguinhas, e isso foi crescendo. Me tornei professora e assumi a direção em 2017”, detalhou Karyne.
 
Desde que começou a dançar, Karyne conta que Uberlândia já tinha um grande potencial para a dança. Principal evento da região, o Festival de Dança do Triângulo era e continua sendo uma das principais atrações a nível nacional relacionados à dança, o que segundo ela, é um patrimônio cultural da cidade.



 
Além disso, ela disse que a Lei de Incentivo à Cultura através da Prefeitura de Uberlândia também contribui diretamente com o avanço da dança não apenas na cidade, mas em toda a região do Triângulo Mineiro, bem como a implementação do curso de Dança na Universidade Federal de Uberlândia.
 
“É com isso que a gente constrói um trabalho de qualidade. Isso é importante para que a gente consiga frutificar os trabalhos e fomentar mestres, coreógrafos e todos os outros agentes culturais. Isso trouxe pessoas interessadas de outras cidades da região e do país. Desde que o curso de dança foi implementado na cidade, a área cultural no setor ficou muito mais movimentada”, contou.

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