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17/10/2020 às 08h00min - Atualizada em 17/10/2020 às 08h00min

Sociedade fechada

ALEXANDRE HENRY
Dias atrás, conversando com uma médica que se mudou de Belo Horizonte para Uberlândia há dois anos, ela me reclamou da dificuldade de se adaptar à cidade, especialmente no tocante aos relacionamentos sociais. Achei interessante, pois foi a segunda vez em poucos dias que alguém me relatou o mesmo problema. Um ex-vizinho, professor da UFU e que já está em Uberlândia há uns três anos, comentou a mesma coisa comigo, relatando que acha as pessoas aqui muito fechadas e pouquíssimo receptivas.

Não era para ser assim, já que nossa cidade é habitada principalmente por migrantes, o que, geralmente, torna as pessoas mais abertas a novos relacionamentos. Lembro-me muito bem dos dois anos em que morei em Porto Velho, capital de Rondônia, cidade conhecida pela grande quantidade de “forasteiros”. Eu e minha esposa não conhecíamos absolutamente ninguém por lá antes de nos mudarmos e, mesmo assim, tivemos dois anos maravilhosos em termos de convívio social. Integramos com nossos vizinhos no pequeno condomínio, fizemos inúmeras amizades, saímos bastante e recebemos muita gente em nossa casa, além de também ir com frequência às casas de outras pessoas. 

Por que Uberlândia, mesmo com a quantidade de migrantes, não é tão aberta quanto Porto Velho? Talvez seja um lado positivo do pessoal do Norte do Brasil que não temos, talvez seja o fato de que nossos migrantes são, basicamente, de cidades vizinhas, muitos dos quais já vêm para cá com uma quantidade grande de conhecidos na cidade, o que torna desnecessário se abrir para novos relacionamentos. Não conheço os números, mas acredito que a maioria das pessoas daqui que nasceram em outros locais são de cidades como Tupaciguara, Monte Alegre de Minas, Ituiutaba, Patrocínio e por aí vai. Quando converso com amigos dessas cidades, sempre vejo comentários sobre outros conterrâneos deles que também moram aqui.

De toda sorte, acredito que é possível ampliar os relacionamentos mesmo em um local não tão “aberto” quanto Uberlândia. Basta, por exemplo, não fazer o que fiz nos dois anos em que morei em Uberaba. Sim, achei a sociedade de lá ainda mais fechada do que a de Uberlândia. Mas, olhando pelo retrovisor, vejo que meu comportamento não ajudou em nada. Primeiro, eu passava praticamente todos os finais de semana em Uberlândia. Segundo, não me lembro de ter convidado ninguém de lá para ir à minha casa, além de ter dado pouca atenção aos poucos eventos sociais durante a semana. Fora isso, também ajudou o fato de eu não participar de nenhuma atividade coletiva. Aí, fazer o quê, né? Se você mesmo não se abre, como reclamar dos moradores locais?

Quando me mudei para Porto Velho, adotei comportamento completamente diferente. Como sempre conto, combinei com minha esposa que nós, uma vez instalados na capital rondoniense, aceitaríamos convite até para batizado de criança, mesmo ainda não sendo pais e estando bem distantes dessa rotina de criançada. Deu certo, como já contei, ainda que a cidade ajudasse.

Por isso, sempre recomendo a quem migra que vá para seu novo destino de coração aberto, que restrinja um pouco seus laços com a cidade de origem e as antigas amizades, que aceite convites para tudo o que for, que convide pessoas para um jantar em casa ou um “happy hour” no boteco, que se matricule em atividades coletivas ou em locais com muita gente, como academias etc. Em resumo, é preciso ter uma atitude ativa em relação ao novo local de moradia. Se você busca ter mais contato com novas pessoas, pode até não ter sucesso com todas, mas algumas certamente retribuirão. E, uma vez que você já tenha conseguido entrar em um círculo novo de amizades, daí para novos contatos será um passo bastante fácil.

Voltando à médica e ao meu ex-vizinho, preciso apenas fazer um parêntese: certas épocas da vida da gente são mais complicadas quanto à ampliação do convívio com novos amigos. Os dois que me reclamaram estão com filhos pequenos e isso, definitivamente, é um complicador quando você tem intenção de ter um convívio social intenso em uma nova cidade. Aliás, até mesmo na sua cidade de origem, como é o meu caso, complica também. Percebo o quanto essa fase de filhos pequenos afasta a gente de jantares com amigos, de tardes em bares, de programas só de adultos. Por isso, caso você esteja vivendo esse momento específico, tenha um pouco mais de paciência e entenda que pode não ser culpa apenas de uma sociedade local fechada, mas, também, da dificuldade natural de manter um convívio social intenso quando se tem filhos pequenos.


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

 
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