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31/07/2019 às 08h10min - Atualizada em 31/07/2019 às 08h10min

O inesperado previsível

FERNANDO CUNHA

Um grupo de ladrões supostamente experientes, liderado por um calculista genial, executa um assalto à Casa da Moeda espanhola. Apesar de alguns acontecimentos imprevisíveis, como a rebelião de alguns reféns e várias tentativas de invasão pela polícia e de agentes infiltrados, tudo faz crer que nada passou desapercebido no planejamento do crime. O “professor”, pseudônimo do líder do assalto da série La Casa de Papel, protagonizado pelo ator espanhol Álvaro Morte, possui um enorme poder de previsibilidade dos fatos, tanto que em alguns momentos da série a impressão que temos é de que o plano chegará ao fim, mas, logo descobre-se que não, pois determinadas situações também foram previstas e a saga continua. O fato é que o personagem é um grande estrategista, que planeja tudo nos mínimos detalhes e se prepara para imprevistos. Os críticos e o público em geral o consideram um “gênio”, principalmente durante a primeira temporada da série.

A figura do “professor” me fez refletir sobre uma situação que, vez ou outra, acomete diversos profissionais que necessitam de se apresentar em público: a imprevisibilidade dos acontecimentos. De repente, a energia elétrica cai, o computador dá pane, o projetor não funciona, a bateria do microfone se esgota e a corda do violão arrebenta. E aí, o que fazer? Agradecer a presença do público e marcar a apresentação para uma outra data? Logicamente que não! Um velho ditado reza que uma pessoa prevenida vale por duas. Ao embarcarmos numa viagem, por exemplo, levamos dinheiro vivo, mas nunca deixamos o cartão de débito ou crédito em casa, não é mesmo? Caso ocorra algum imprevisto, eles estarão lá para nos salvar. Há alguns anos eu tinha um carro velho que não marcava corretamente o nível de combustível no tanque. Adivinha? Eu sempre carregava um pequeno galão cheio de etanol no porta-malas.

Em inúmeras situações, inclusive na preparação de uma aula, uma palestra, seminário, congresso ou discurso, é importante sempre nos lembrarmos da tão conhecida e famigerada lei de Edward Murphy, na qual o engenheiro aeroespacial e então capitão da Força Aérea Americana alegou que “se alguma coisa tem a mais remota chance de dar errado, certamente dará”. Murphy foi vítima de sua própria teoria. Ele criou um equipamento que registrava os batimentos cardíacos e a respiração dos pilotos para medir a tolerância dos seres humanos à gravidade. Ele deveria apresentar os resultados do teste, mas o técnico responsável instalou o equipamento de forma errada. Os sensores não funcionaram corretamente. Contrariado com a situação, Murphy então disse esta célebre frase citada por muitos até os dias atuais.

Durante um desses cursos de oratória e técnicas de apresentação empúblico que ministro frequentemente, eu ensinava aos participantes algumas técnicas de como se sair bem num discurso improvisado, principalmente quando somos pegos de surpresa. Um dos alunos me perguntou: “se eu for me apresentar e der uma pane nos equipamentos, o que eu faço”? A minha reposta foi clássica: “tenha sempre um Plano B”. Aliás, o ideal é termos vários planos, os quais eu chamo de B, C, D, E, F, etc. Eu estava usando o meu notebook (Plano A), mas mostrei aos alunos um pen drive que estava no meu bolso com todo o conteúdo do curso (plano B). Em seguida apresentei o meu smartphone, onde também tenho salvo todos os arquivos e os slides em PDF (plano C). Na sequência abri o meu e-mail, no qual estão armazenados o arquivo de Power Point e os vídeos no We Transfer (plano D). Depois apresentei um calhamaço com o roteiro completo do curso (Plano E). Finalmente, ressaltei a importância de termos tudo bem guardado na memória (Plano F). Existem também inúmeras ferramentas disponíveis para armazenamento em nuvem e acesso remoto. Por que não usar?

Em meados de 2018 participei de um seminário de palestrantes em Uberlândia. Durante uma das apresentações, a aparelhagem de som falhou. Ao invés de aguardar a solução do problema, a palestrante deixou o microfone de lado e elevou o tom da voz diante de um auditório com mais de 200 pessoas. Quando o som foi restabelecido, ela disse num tom irônico: “agora também não quero mais usar o microfone”. Isso rendeu até algumas risadas da plateia que continuou assistindo-a atentamente até o fim. Equipamentos podem dar pane, o apresentador nunca! Só cancela uma apresentação quem não está prevenido. Daí a necessidade de estarmos sempre preparados para encarar o inesperado previsível. 


*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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