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02/03/2019 às 06h00min - Atualizada em 02/03/2019 às 06h00min

Venezuela: O caos anunciado!

ANTÔNIO CARLOS | ANALISTA DE NEGÓCIOS E PROFESSOR UNIVERSITÁRIO
Há alguns meses, ela tem dominado os noticiários internacionais. Instabilidade política, eleições fraudadas, fome, miséria e um grande contingente de recursos naturais. Esta é a Venezuela, oficialmente República Bolivariana da Venezuela, país latino-americano constituído por uma parte continental e um grande número de pequenas ilhas no Mar do Caribe. Sua capital e maior aglomeração urbana é a cidade de Caracas. Suas fronteiras são delimitadas a norte com o Mar do Caribe, a oeste com a Colômbia, ao sul com o Brasil e ao leste com a Guiana, com quem mantém disputas territoriais.

Assim como a maioria dos países da América do Sul, o território venezuelano foi colonizado pelo Império Espanhol em 1522, apesar da resistência dos povos nativos. A Venezuela foi o primeiro país sul-americano a conquistar sua independência da Espanha, em 1811 pelas mãos de Simon Bolívar. Durante o século XIX, o país sofreu com instabilidade política e autocracia, dominado por caudilhos regionais até meados do século XX.

A Venezuela é um dos países mais ricos em biodiversidade, ocupando um posto entre os 17 países mega diversos do globo. Os habitats vão desde as montanhas dos Andes até o oeste da Bacia Amazônica, através de extensas planícies e a costa do Caribe, no centro e no delta do rio Orinoco, no Leste. A fauna e a flora venezuelanas também são extremamente diversas, incluindo espécies pouco conhecidas e até mesmo raras de animais e vegetais. Não obstante a diversidade ambiental, o país também é amplamente reconhecido pelas vastas reservas de petróleo.

Para se ter uma ideia do potencial das reservas de petróleo do país, façamos uma pequena retrospectiva desde o descobrimento da primeira grande jazida petrolífera venezuelana, em 1922. Seis anos após este episódio, a Venezuela já era o segundo maior produtor de petróleo do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Em 1945, produzia mais petróleo que todos os países do Oriente Médio juntos e, em 1950, apresentava o quarto maior PIB per capita do planeta. Nessa altura de sua história, a Venezuela era duas vezes mais rica que o Chile, quatro vezes mais rica que o Japão e doze vezes mais que a China.

Além das questões econômicas, o petróleo na Venezuela também serviu para moldar a política do país. Desde sua descoberta os líderes buscaram promover o setor do petróleo, além de tirar vantagem das variações do preço do barril. Por esses e outros motivos os venezuelanos eram, na média, um povo rico.

No entanto, choques econômicos nas décadas de 1980 e 1990 culminaram em várias crises políticas, causando um colapso da confiança generalizada e permitiu a ascensão de Hugo Chávez. Sob as abas do conceito de "Revolução Bolivariana", Chávez aprovou uma nova constituição em 1999 e, nos anos seguintes, surfou com os aumentos do preço mundial do petróleo, que fizeram dele um homem muito poderoso e multibilionário, influenciando diretamente vários países latino-americanos e até mesmo de outros continentes.

Após a morte de Chávez, em 2013, Nicolás Maduro assume o poder após ganhar as eleições presidenciais no mesmo ano. A partir de 2014, com a posse de Maduro em função da morte de Chávez, a destruição daquele país se acelerou: a inflação chegou a 700%, e o índice de desabastecimento chega a ser superior a 80%. Em 2017, a inflação bateu recordes e mais recordes, alcançando a marca de 2.616% – a maior do planeta. Entre 2015 e 2016, 74% da população perdeu 8 quilos ou mais, em função da fome. No final de 2016, 93,3% dos venezuelanos não tinham como cobrir as despesas com alimentação para garantir uma dieta mínima de 2000 calorias.

E, mesmo com os números desastrosos e a alarmante realidade social do país, Maduro foi reeleito em uma eleição controversa, não reconhecida pela oposição e por grande parte da comunidade internacional. Atualmente, o país enfrenta uma grave crise socioeconômica e política, com hiperinflação, escassez de produtos básicos, alta criminalidade e censura da imprensa. Desde as eleições, a instabilidade política e econômica na Venezuela se intensificou ainda mais, atingindo na última semana o momento de maior tensão, com ameaças diretas de intervenção dos Estados Unidos e o movimento do líder da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, que se autodeclarou presidente interino da Venezuela.

Para além da crise socioeconômica, o país se transformou em um narco-estado, sendo o maior exportador da cocaína para as FARC, para a Bolívia e para os cartéis de drogas mexicanos e do norte da África. Alguns acreditam, inclusive, que algumas das grandes lideranças venezuelanas estão ou estiveram envolvidas com o narcotráfico.

Especialistas se perguntam como um país que dispõe de tantos recursos e já esteve em uma posição tão privilegiada no cenário mundial chega a esse ponto. A resposta? A “doença holandesa”, um fenômeno que representa as nações que se contentam com a renda auferida pela exploração e exportação das chamadas “commodities” e não se propõem a avançar em termos de novos paradigmas tecnológicos e produtivos. As consequências desta acomodação, no entanto, só serão sentidas a longo prazo. Com a intensificação da crise e a iminência de um conflito mais sério na comunidade internacional, chega o momento de refletirmos sobre as negligências das lideranças venezuelanas.

Pensando estrategicamente, a euforia provocada pela descoberta de enormes reservas petrolíferas não trouxe para a Venezuela os benefícios dos consecutivos aumentos nos preços do mercado petrolífero. Os governos venezuelanos fracassaram ao não se valerem de sua posição estratégica para romper com a dependência financeira do petróleo, como pedia o momento. Sem dúvida alguma, este seria o caminho para criar uma sólida rede interna de indústrias produtivas, refletidas no abandono das políticas públicas responsáveis pela perpetuação da “doença holandesa”. Por todos esses motivos, o que estamos vendo agora é a conclusão de um caos que há muito está anunciado.
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