Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
19/07/2022 às 10h50min - Atualizada em 19/07/2022 às 10h50min

Gasto com cesta básica compromete mais de 50% da jornada de trabalho em Uberlândia

Trabalhador que ganha um salário mínimo precisa atuar mais de 114 horas mensais para adquirir itens básicos; rendimento ideal para a cidade teria que ser de R$ 5.314,16

IGOR MARTINS | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Dos 13 itens que compõem a cesta básica, apenas um apresentou recuo nos últimos 12 meses | Foto: GERALDO BUBNIAK/AEN
Uma pessoa que recebe um salário mínimo precisa trabalhar 114 horas e 49 minutos mensais para conseguir comprar apenas uma cesta básica em Uberlândia. O índice, estipulado pelo Centro de Estudos, Pesquisas e Projetos Econômico-Sociais (Cepes), equivale a 52% da jornada de trabalho total. Por conta do aumento das despesas, consumidores têm procurado por outras fontes de renda para conseguirem se manter. 

O cálculo realizado pelo instituto considera uma jornada de trabalho de 44 horas semanais, com duração máxima de oito horas diárias. Sendo assim, em um mês, um trabalhador formal desempenha 220 horas, o que significa que mais da metade do horário de trabalho fica comprometido apenas para a compra de alimentos básicos.

De acordo com o economista Carlos Henrique Cássia Fontes, os dados revelam a alta inflação dos produtos, especialmente os alimentícios e a perda do poder aquisitivo do brasileiro. Em 2012, por exemplo, um consumidor de Uberlândia precisava, em média, de 90 horas para comprar uma cesta básica no município.

A inflação atingiu um acumulado de 10,7% nos últimos 12 meses. O número de horas trabalhadas está diretamente relacionado ao preço da cesta básica. Nos últimos meses, tivemos um forte aumento com quedas pontuais. É muito difícil prever o que vai acontecer no futuro, não dá para observar nenhuma tendência com relação a esse índice”, explicou.

Conforme relatado pelo especialista do Cepes, se o preço da Cesta Básica de Alimentos (CBA) aumenta, o número de horas trabalhadas também sobe. Segundo o instituto vinculado à Universidade Federal de Uberlândia (UFU), o gasto médio mensal para adquirir os itens básicos no mês de junho ficou em R$ 632,56, 3% a menos do que em maio (R$ 652,28). Em junho de 2021, o preço da cesta na cidade foi de R$ 514,57.

O levantamento aponta ainda que dos 13 itens que compõem a CBA, apenas o arroz apresentou recuo (-2,15%) nos últimos 12 meses. Os alimentos que mais subiram desde o ano passado são a carne (5%), pão (17%), óleo (26,8%), banana (32%), feijão (33,1%), farinha de trigo (36,3%), margarina (40,9%), leite (51%), tomate (56%), açúcar (65%), batata (68,7%) e o café (73,6%).

“Muitos itens da cesta básica tem variação sazonal e dependem de questões climáticas, do período chuvoso e da estiagem, e por isso os preços variam muito ao longo do ano. Temos também a inflação crescente nos últimos meses por conta de outros fatores, de questões externas. Por exemplo, o pão depende do trigo, que subiu por causa da guerra na Ucrânia. Outro fator que impacta nos preços é a alta dos combustíveis, que influencia o frete final”, disse Carlos Henrique Cássia Fontes.

 

• Compartilhe esta notícia no WhatsApp



SALÁRIO MÍNIMO
Assim como no caso das horas trabalhadas, um trabalhador que recebe um salário mínimo, de R$ 1.212, precisa destinar 52% dos seus ganhos para comprar uma cesta básica de alimentos em Uberlândia. Segundo o Cepes, a quantia ideal necessária para a manutenção de uma família de dois adultos e duas crianças (ou três adultos) seria de R$ 5.314,16.

De acordo com o economista, o levantamento leva em consideração os gastos com outros itens da despesa, tais como educação, saúde, transporte e vestuário. O resultado do mês de junho aponta que o salário mínimo oficial equivale a apenas 22,81% do necessário do mês para a cidade.

No início do mês, o Diário noticiou que mais de 56 mil famílias vivem com apenas um salário mínimo no município. No caso das pessoas que adquirem uma CBA com o salário, foi constatado que sobram R$ 579,44 para manter outras despesas, como aluguel, energia, água e outros.

Na ocasião, a reportagem foi até a cozinha solidária do bairro Dom Almir. Por lá, a responsável pelo local, Eliane dos Santos Lopes afirmou que a procura por marmitas subiu 70% em 2022, saltando de 700 para 1.200 refeições diárias. “A situação está muito precária. É muita gente que aparece dizendo que os filhos não comeram no dia anterior. Uma mãe disse que precisou dar água com açúcar para o filho porque não tinha leite em casa”, detalhou a cozinheira.

RENDA EXTRA
Buscando driblar a inflação e viver com mais dignidade, muitos uberlandenses têm buscado a renda extra como solução. Esse é o caso de Joyce Ferreira de Oliveira, que migrou de carreira recentemente e não conseguiria cuidar dos três filhos se não fosse pelos “bicos” do marido de 34 anos, que passou a trabalhar 16 horas todos os dias para dar conta das despesas.

Formada em nutrição, a uberlandense de 37 anos passou a trabalhar no mercado digital e o marido, além de atuar com carteira assinada todos os dias, ainda trabalha em um restaurante à noite. “Ele sai de casa às 7h e volta para casa às 23h. Mesmo assim, ainda tem meses que passamos aperto”, disse.

Segundo a nutricionista, a família desembolsa aproximadamente R$ 2 mil mensais apenas com o supermercado. Em conversa com o Diário, ela contou que tem comprado alguns itens em menor quantidade, como é o caso do café, item que mais subiu na CBA nos últimos 12 meses. Além disso, para alimentar o filho, deixou de comprar a caixa de leite integral e tem optado pelo leite achocolatado.

“O leite normal estava R$ 7,57 na última vez que fui ao mercado. Aqui, eu preciso comprar o achocolatado em pó também. O que estou fazendo é comprar o leite achocolatado direto, que sai a cerca de R$ 5. O café eu compro e tomo apenas aos fins de semana, porque também está muito caro”, detalhou Joyce.

Quem também precisou complementar a renda foi o Eurípedes Manoel Mendes Júnior, de 33 anos. No início do ano, o uberlandense morava sozinho e não estava conseguindo arcar com todas as despesas. Além de trabalhar em uma empresa de armazenamento de grãos, ele também faz alguns serviços como cuidador para conseguir um dinheiro extra.

“Agora estou morando com a minha mãe. Nós compramos leite, verdura e carne quando dá. A gente faz o que pode, faço uns bicos para complementar a renda para poder ter o básico em casa. A gente tem conseguido porque junta a minha renda e a da minha mãe, mas é complicado, porque tem que pagar aluguel, energia, e tem meses que aperta um pouco”, disse.

De acordo com Júnior, a situação econômica tem sido crítica desde o início da pandemia da covid-19. Todos os meses, o mineiro compra uma cesta básica e não consegue ter uma vida de regalias. “Estou comprando só o essencial. Todos os meses eu compro uma cesta e a gente vai comprando fruta e verdura de vez em quando”, detalhou.

VEJA TAMBÉM:
 

 


Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90