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13/06/2022 às 18h30min - Atualizada em 13/06/2022 às 18h30min

“Não queremos xiitas e ambientalistas na nossa cidade”, afirma vereador de Uberlândia

Abatenio Marquez (PP) usou frase em discurso para defender instalação de Polo Cloroquímico no bairro Industrial

DHIEGO BORGES I DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Vereador suplente é do partido Progressistas e foi empossado há 13 dias I Foto: ALINE REZENDE/CMU
Uma fala do vereador Abatenio Marquez (PP), empossado há exatos 13 dias no cargo, gerou polêmica durante a discussão de um projeto de lei, em sessão realizada nesta segunda (13), na Câmara Municipal de Uberlândia. “Nós não queremos xiitas e ambientalistas na nossa cidade, porque Uberlândia é cidade progressista”, afirmou o parlamentar.
 
Durante o discurso, Abatenio defendia a aprovação de um projeto de lei de autoria do Executivo e rebatia críticas feitas à proposta por parte de vereadores da oposição. “Eu tenho certeza que a base do governo Odelmo Leão, que é um governo que faz o social dessa cidade, especialmente criando e gerando emprego, vai dar a resposta à Uberlândia: nós não queremos xiitas e ambientalistas na nossa cidade, porque Uberlândia é cidade progressista, que vai dar emprego e trazer o progresso para a nossa população”, disse.

CONFIRA O TRECHO DA FALA (IMAGENS: TV CÂMARA)



 
Momentos antes, parlamentares contrários à proposta haviam subido à tribuna para questionar pontos do projeto encaminhado pelo Executivo. O objetivo da proposta seria desafetar e permitir a venda de uma área do Município de pouco mais de 79 mil m² para a instalação de um Polo Cloroquímico no bairro Industrial, em Uberlândia. A área, avaliada em pouco mais de R$ 20,1 milhões, pertence à Prefeitura e fica localizada na Av. José Andraus Gassani, nº 2515.
 
ENTIDADES REPUDIAM
Entidades ligadas ao meio ambiente e a imigrantes e refugiados em Uberlândia reagiram à fala do vereador. Confira alguns posicionamentos:


CÁTEDRA UFU
A CSVM UFU, junto às organizações que fazem parte da rede de apoio a migrantes (TAARE - @ong.taare) (Refugiados UDI - @refugiadosudi ) e movimentos sociais dos imigrantes e refugiados da cidade de Uberlândia, torna público seu total repúdio à manifestação preconceituosa e discriminatória proferida em discurso do vereador Abatenio, durante sessão da Câmara de Vereadores que abordou o projeto do Complexo Cloroquímico. É lamentável a afirmação do vereador, no que diz respeito a rechaça "xiitas e ambientalistas" na cidade de Uberlândia. A fala, além de demonstrar o profundo desconhecimento das contribuições das migrações para a economia do país, prolifera o ódio e atenta contra os direitos humanos. Exigimos a retratação do vereador e a manifestação da Câmara de Vereadores sobre as medidas para garantir o decoro. São inaceitáveis quaisquer manifestações que aprofundem e difundam as desigualdades, o desrespeito, o preconceito, a intolerância religiosa e a violência contra imigrantes e defensores de direitos humanos e causas ambientais.


INSTITUTO ANGÁ
A Associação para a Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro (Angá), Organização da Sociedade Civil com atuação na agenda socioambiental em Uberlândia, considera extremamente infeliz o comentário do vereador. Uma sociedade plural, democrática e diversa é necessário que cidadãos e cidadãs respeitem a pluralidade de pensamento e o diálogo dentro de uma República. Já passamos por tempos sombrios em regimes autoritários, em que movimentos sociais e cidadãos e cidadãs foram perseguidos pelo Estado. Por isso, temos uma Constituição Cidadã, umas das mais modernas do mundo, com um Capítulo sobre Meio Ambiente. Esperamos que o vereador, cujo salário é pago pelo contribuinte, entenda que sem meio ambiente ecologicamente equilibrado não existe a possibilidade de uma nação ou um município prospero, sustentável, democrático e diverso. A crise climática já deixa suas marcas na nossa economia e qualidade de vida, com graves prejuízos socioeconômicos e ambientais, por isso, precisamos de mais respeito e dialogo, e que nos afastemos do radicalismo e da polarização. Essa declaração foi dada em um momento em que o jornalista Dom Phillips e o indigenista Bruno Araujo Pereira encontram-se desaparecidos no Vale do Javari (Amazonas), ambos são ativistas pelos povos originários e a Amazônia e podem ter sido alvo de uma emboscada. O Brasil é o país com maior número de assassinatos de ambientalistas no mundo.
 
A produção do Diário tentou contato com o vereador para comentar sobre sua fala. Por meio de nota, Marquez esclareceu o discurso. Confira na íntegra:
 
“Há uma distorção do que falei. No debate na Câmara eu disse “ambientalista xiita” no sentido de radical, como usualmente empregado pela imprensa e por todos do meio político. Eu defendo um ambientalismo de visão sustentável, ambientalismo sério. Crítico o uso do argumento ambientalista por pessoas que não entendem nada do assunto, apenas para ser contra investimentos em nossa Uberlândia. Não há nenhuma conotação religiosa na minha fala. Além disso, o projeto de lei traz a obrigação de atender à legislação ambiental federal, estadual e municipal, conforme se segue:
 
Parágrafo único do artigo 3º da proposição:
 
Parágrafo único.  As sociedades empresárias constantes do artigo 3º desta Lei deverão atender às seguintes condições:
I – adequação às normas urbanísticas e ambientais pertinentes para implantação de sua atividade econômica; (...)”

A PROPOSTA
O texto do projeto, que teve parecer favorável da Comissão de Legislação, Justiça e Redação, prevê a alienação do terreno a três empresas da cidade, sendo: Bauminas Química Ltda, Chlorum Minas Gerais Indústria e Comércio de Cloro e Álcalis Ltda e Limpesa Empreendimentos Imobiliários e Incorporações Ltda.
 
Segundo uma avaliação anexada ao projeto, feita pela Secretaria Municipal de Agronegócio, Economia e Inovação, as empresas citadas são especializadas na produção de cloro álcalis, um fluido químico utilizado na produção de desinfetantes, herbicidas, pesticidas, PVC e também na indústria farmacêutica.  
 
Os empreendimentos teriam um desconto de 60% sobre o valor total da área, algo em torno de R$ 12 milhões. Em contrapartida, as organizações pagariam os R$ 8 milhões restantes e gerariam em torno de 220 empregos diretos, com investimentos estimados em R$ 260 milhões. Segundo a Prefeitura, o incentivo seria recuperado no prazo de 3,35 anos, considerando que as indústrias têm potencial de gerar R$ 3,61 milhões em repasses anuais de ICMS ao Município.


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O DEBATE
Após ser colocada em discussão, a proposta gerou embates entre os vereadores da base do prefeito e da oposição. Os parlamentares contrários ao projeto questionaram, entre outros pontos, a ausência de um estudo de impacto ambiental para a instalação do Polo Cloroquímico.
 
A Comissão de Meio Ambiente e Defesa Animal da Câmara também já havia se manifestado contrária à tramitação do projeto, utilizando o mesmo argumento, citando a proximidade do Complexo com o Parque Siquieroli e Córrego Liso, além de uma área vegetal. Por outro lado, vereadores aliados à base do Executivo, defenderam a aprovação da proposta pela geração de emprego e novos investimentos. Neste momento, a fala do vereador Abatenio trouxe polêmica à discussão.
 
Parlamentares da oposição subiram à tribuna para repudiar a postura do colega. “Eu quero falar para o vereador Abatenio que tem que ter muita coragem para ser ambientalista no Brasil, por que o Brasil é o quarto país do mundo mais perigoso para ambientalistas, no dia de hoje o corpo de Dom e de Bruno foram encontrados na Amazônia, ambientalistas lutando pela preservação do meio ambiente. Eu tenho orgulho de ser ambientalista e essa cidade tem sim espaço para ambientalistas”, defendeu a vereadora Dandara (PT).
 
“Combater o trabalho escravo, defender o meio ambiente, a fauna e a flora, a pessoa corre risco de vida. Eu quero dizer que eu vou votar contra esse projeto, porque ele prejudica o meio ambiente, coloca a população desses bairros em perigo”, afirmou Liza Prado (PATRIOTA).  
 
“Falar de ambientalistas, como se fosse um problema, na verdade são as pessoas que pautam para que possamos ter um futuro enquanto sociedade”, disse Amanda Gondim (PDT).
 
O líder do Executivo, Antônio Carrijo (PSDB), por outro lado, criticou a postura da oposição e defendeu a aprovação da proposta. “O que nós estamos votando aqui é apenas a autorização para a criação do Polo Cloroquímico e permitindo que as empresas possam fazer as adequações e aprovar os projetos. Se as elas não aprovarem nos órgãos ambientais não tem o investimento”, destacou.
 
Após as discussões, o projeto foi aprovado em sessão extraordinária em duas votações, por 16 votos favoráveis, oito votos contrários e duas ausências.
 
QUEM É ABATENIO
Abatenio Marquez é o primeiro suplente do Partido Progressistas (PP) e obteve 2.133 votos nas eleições de 2020. No dia 1º de junho, ele assumiu a vaga do vereador Ivan Nunes (PP), que foi nomeado pelo Executivo como Secretário Municipal de Prevenção às Drogas, Defesa Social e Defesa Civil.
 
Abatenio é formado em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e Mestre em Direito pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). Ocupou o cargo de vice-prefeito de Ituiutaba na gestão 2005-2008. Em Uberlândia, foi superintendente do Procon entre 2018 e 2019, Procurador Geral do Município entre 2019 e 2020, secretário municipal de Agronegócio, Economia e Inovação, além de assessor especial do gabinete do prefeito Odelmo Leão entre 2021 e 2022.

* Matéria atualizada às 16h28 de 14/06 para acréscimo de informações.

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