O que era para ser um projeto de simples tramitação gerou um grande debate durante a última sessão de novembro na Câmara Municipal nesta quarta-feira (17). A proposta, de autoria do vereador do vereador Anderson Lima (PSL), institui a "Semana Pró-Vida” e prevê a divulgação de informações decorrentes do aborto a mulheres e familiares.
Como de praxe, o tema aborto gerou bastante discussão entre os parlamentares. Na defesa do projeto, Anderson Lima reforçou a ideia da conscientização, lembrando que não se trata de discutir a legalidade do aborto, mas as consequências causadas nas mulheres. “O projeto não se coloca contra ou a favor do aborto, mas a conscientização. Sendo aborto legal, ou clandestino, gera consequências. Não temos o direito de privar as mulheres e as famílias que passaram por um aborto voluntário, ou involuntário, de privar do conhecimento”, defendeu.
A vereadora Cláudia Guerra (PDT), que há anos atua na defesa dos direitos das mulheres, se mostrou contrária à proposta, afirmando que o projeto cria um estigma criminalizador para a interrupção da gestação em casos que já são permitidos por lei, e que, por isso, não deveria tramitar.
“Nada mais faz que um desserviço para a sociedade e cria um rótulo a mais para as mulheres. O próprio Código Penal não criminaliza e permite a prática da interrupção da gestação em algumas situações. Esse projeto é tudo que a sociedade não precisa, visto que cria mais uma barreira social, demonstra desinformação, ou má fé e falta de contato com a realidade, principalmente a de famílias pobres”, disse Guerra.
Ainda durante a fala, Cláudia fez uma série de questionamentos sobre a intenção do autor do projeto. “Será que os autores dos projetos prestam auxílio às famílias das gestantes em risco de morte, em decorrência de complicações de gravidez? Será que eles concordam com gravidez recorrente de estupro, ou presta algum tipo de auxílio financeiro ou psicológico continuado para vítimas e familiares?”, questionou.
O vereador Anderson Lima rebateu os argumentos apresentados por Cláudia e demais vereadoras contra o projeto. “Não ofendi ninguém no projeto, apenas citei uma questão de orientação das mulheres. Agora, se as vereadoras não concordam com meus posicionamentos ideológicos e estão se colocando contrárias à mulher e as famílias de receberem informações sobre os riscos, sim, que o aborto pode gerar. Eu vivi um aborto com minha esposa, pois quando ela engravidou, eu engravidei com ela, e quando ela perdeu o bebê, eu perdi com ela. Então é muito fácil falar, querer me dar lição de moral, mas cuidado com as coisas que se falam”.
Após a deliberação dos demais vereadores, a favor e contra, o projeto foi aprovado em primeira discussão com somente três votos contrários.
SEGUNDA DISCUSSÃO
Ainda nesta quarta-feira (17), o presidente da Casa, Sérgio do Bom Preço (PP) convocou sessão extraordinária para votação de projetos em segunda discussão. No momento da votação sobre a ‘Semana Pró-Vida”, as vereadoras Cláudia Guerra e Amanda Gondim (PDT) apresentaram uma emenda, que foi rejeitada pelo presidente.
“A emenda que vocês apresentaram não é pertinente por se tratar do Código Municipal de Saúde e aqui estamos instituindo uma semana de conscientização. Essa seria a divergência”, disse o presidente.
O autor do projeto, Anderson Lima, disse que a emenda estaria desvirtuando o projeto. “Está se criando um projeto novo. Se querem apresentar um novo projeto, apresente, mas isso aqui não se enquadra. Não tem nada a ver com o que foi apresentado”.
A reportagem entrou em contato com a assessoria da vereadora Amanda Gondim e, por meio de nota, disse: “Na emenda que apresentamos ao Projeto de Lei que institui, no Calendário Oficial do Município, a ‘Semana Pró-Vida”, propusemos diretrizes que ampliam o repertório do debate proposto e orientam objetivos específicos para uma data desta natureza, não se restringindo apenas a orientar sobre as problemáticas do aborto.
Entendemos que a semana “pró-vida” deve abranger a conscientização sobre os riscos do aborto inseguro, em verdadeiro amparo humanizado às mulheres e pessoas capazes de gestar, em conformidade com diretrizes da ONU e da Corte Interamericana de Direitos Humanos. As orientações devem abranger informações sobre as hipóteses de interrupção da gestação permitidas no ordenamento jurídico, promover debates sobre a questão da gravidez infanto-juvenil decorrentes de violência sexual, incentivar realização de acompanhamento pré-natal, promover debates sobre métodos contraceptivos, planejamento familiar e reprodutivo, além de difundir a importância do atendimento especializado, humanizado e acolhedor da pessoa gestante que deseje realizar a interrupção da gestação nas hipóteses permitidas no ordenamento jurídico, como medida de garantia do direito à saúde.
Não podemos instituir uma semana de debate sobre um tema tão importante sem tratarmos destes pontos, fundamentais na garantia da plena saúde e vida das pessoas gestantes, sob pena de incorrermos em ações de cunho moralista, que pretendem impedir o exercício de autonomia do próprio corpo mediante o acesso ao procedimento de interrupção da gestação, legalizado e seguro. A autonomia dos corpos capazes de gestar precisa ser preservada e, qualquer decisão, tomada mediante orientação em atendimento médico qualificado e humanizado.
A dificuldade em se fazer cumprir o regimento interno da Casa quando apresentei as emendas denotam um caráter que vivenciamos por diversas vezes, da utilização de uma discricionariedade para agir de forma a ferir o regimento interno e as prerrogativas de vereadores. Algo que considero muito sério, a diferença na condução quando os homens expõem suas razões em detrimento das mulheres, vem gerando situações emblemáticas, fruto da violência política de gênero a qual estamos sujeitos nos espaços de poder decisório”, constou a nota.
Já Cláudia Guerra não concordou com a rejeição e disse que tomará as medidas necessárias. “A justificativa é sobre o aborto e aqui só está descrevendo que seria a semana de conscientização. Está tendo interpretação diferente para determinados vereadores e pra nós outra. Isso é inadmissível e não tratar com isonomia nessa Casa. Vamos tomar providências”.
Em seguida, a sessão seguiu com a aprovação do projeto em segunda discussão.
CRÉDITO
Mais dois projetos do Executivo, abrindo crédito no orçamento da Prefeitura de Uberlândia foram aprovados em duas discussões. Um acrescenta R$ 1 milhão para a Secretaria Municipal de Saúde, e outra de R$ 440 mil para a Secretaria de Obras.
Ambos os valores são oriundos de emendas parlamentares. O destinado à saúde veio do governo do Estado, através do deputado estadual Leonídio Bouças. Ou outro veio por meio do senador Antônio Anastasia (PSD).
Segundo o projeto enviado pelo Executivo, o valor de R$ 1 milhão será destinado para a aquisição de equipamentos e materiais permanentes para a Rede Municipal de Saúde, enquanto os R$ 440 mil serão direcionados para obras viárias na Av. Aldo Borges Leão.
COMENDA
A Câmara realizará na próxima segunda-feira (22) e entrega da Comenda Zumbi dos Palmares, honraria entregue a pessoas, empresas ou entidades que contribuíram com ações contra a discriminação racial e a favor da igualdade social em Uberlândia.
Serão 29 homenageados, sendo uma indicação do Executivo, um da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB Uberlândia) e um de cada vereador.