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06/10/2019 às 08h39min - Atualizada em 06/10/2019 às 08h39min

Bicicleta vira meio de transporte para entrega de refeições em Uberlândia

Diário de Uberlândia conversou com alguns profissionais da cidade para saber como funciona o serviço

VINÍCIUS LEMOS
Entregadores que utilizam bicicleta para fazerem entrega se reúnem em praça do Centro da cidade | Foto: Vinícius Lemos
Não é de hoje que os aplicativos de entrega de refeições se popularizaram. De uma forma fácil, por meio do celular, é possível ao usuário pedir o almoço ou jantar e ter o alimento entregue sem precisar esperar muito. A maior parte dos pedidos é entregue por trabalhadores em motos, graças à agilidade que o meio de transporte oferece no trânsito. No entanto, quem anda pelas ruas de Uberlândia já deve ter percebido que, recentemente, alguns entregadores de alimentos têm optado por outro meio de transporte: as bicicletas.

Assim como motociclistas, hoje já é possível ver grupos de ciclistas se formarem próximos a lugares que concentram restaurantes e lanchonetes. O trabalho chama a atenção pelo fato de o transporte exigir força física e horas de serviço para que haja a rotatividade necessária para que os ganhos com as entregas possam valer a pena. São jornadas que chegam a mais de 10h e a até 80 quilômetros rodados.

Em sua maioria, os ciclistas que hoje fazem entregas estão cadastrados em dois aplicativos na cidade, o iFood e o Uber Eats. A previsão é que a concorrência se acirre ainda nesta semana, com a chegada da Rappi a Uberlândia. Não há números oficiais, mas o Diário de Uberlândia esteve em contato com um grupo de quase 50 desses ciclistas criado em um aplicativo de mensagens. O objetivo do grupo é garantir segurança e trocar informações. As conversas começam ainda pela manhã e se estendem até a madrugada, enquanto há ciclistas nas ruas fazendo entregas ou se despedindo depois da jornada de trabalho, quase às 2h.

Em conversa com os ciclistas e com as empresas que gerenciam os aplicativos, o Diário apurou que os valores recebidos pelos entregadores variam de R$ 3,50 a R$ 6, a depender da distância a ser percorrida na pedalada. Há ainda incentivos por alta demanda de entregas e baixa oferta de entregadores. O raio de ação das bikes é reduzido perto do que fazem, por exemplo, os motociclistas. De maneira geral, eles rodam entre 6 e 8 quilômetros entre buscar o pedido e o destino da refeição, a cada solicitação.

“No domingo, já pedalei 86 quilômetros, mas no meio de semana pedalo metade, mas faço metade do dinheiro também”, disse o entregador Heitor Santos da Silva, que foi entrevistado como único ciclista em meio a pelo menos outros cinco entregadores que usam motos para o serviço, ao lado de uma grande cadeia de fast food. Naquela mesma noite do dia 1º de outubro, ele pegava a quinta entrega enquanto falava com o Diário. Segundo o autônomo, num bom dia de trabalho, no meio da semana, era possível fazer outras dez entregas. “É cansativo. Em dia corrido, pode ser que o aplicativo chame mesmo que a gente esteja longe, porque a demanda está alta”, explicou.

Acostumado com serviço pesado na construção civil, o grande esforço físico voltou à rotina de Cristiano Barreto nos últimos seis meses, quando ele se cadastrou no primeiro aplicativo e passou a pedalar para levantar a grana. “Tenho dois filhos, um de 3 anos e um de 3 meses. Minha esposa não trabalha. Consigo manter a casa”, disse. Ele levanta até R$ 80 por dia respondendo ao chamado dos dois aplicativos.

Barreto mora no bairro Presidente Roosevelt e se desloca para áreas centrais ou para a avenidas Rondon Pacheco para estar perto de restaurantes que oferecem maior rotatividade. O deslocamento de casa para esses lugares, que é de aproximadamente 5 quilômetros, claro, não rende grana, e só depois dessa primeira viagem é que ele passa faturar. Mas ele não reclama e se mostrou o entrevistado mais empolgado com o serviço. “Para quem não tem emprego, isso aqui é uma vantagem. É uma renda extra para quem tem outro trabalho mais leve. A única coisa que pega é que é incerto [o ganho]”, disse Barreto.

A BIKE
A escolha da bicicleta como forma de executar o serviço, segundo os entrevistados, se dá porque uma moto traria outros gastos. O valor do veículo é maior, há a questão da habilitação, que muitos não podem pagar para obter, além dos impostos sobre o veículo e da necessidade da autorização para exercer atividade profissional com o veículo.

Mesmo sendo mais econômica, a bicicleta também gera custos como equipamento de trabalho. “Uma catraca dessa bicicleta custa R$ 50. Se a gente trabalhar o dia todo em um dia fraco, e tiver problema com a catraca no outro dia, o trabalho vai ser todo para pagar uma peça”, disse o entregador Matheus de Araújo.

Com 18 anos, Araújo tem o perfil da maioria que buscou o trabalho entre os entrevistados do Diário. Sem oportunidade de emprego ou com renda que precisava de complemento, a bicicleta e as entregas se mostraram uma saída. “Entrei porque não tinha outra oportunidade. Trabalhava na padaria dos meus irmãos, que acabou fechando. Acabei indo para a entrega com a bicicleta”, contou.

Outro entregador, João Miguel, de 19 anos, disse que, além da questão do emprego, a flexibilidade do trabalho abriu oportunidade para os estudos. “A bike me ajuda a correr atrás de outras coisas, como faculdade ou estudar em algum outro curso. Tentei estudar para dar aulas e isso também inclui contas com livros que preciso comprar. Hoje estou estudando para fazer concurso”, contou.
 
ESFORÇO
Para se manter no trabalho como entregador e rodar algumas dezenas de quilômetros em uma jornada de trabalho, o ciclista deve tomar cuidado com a preparação física para não haver problemas com lesões.

“Eu acho interessante essa modalidade de trabalho para desafogar o trânsito, estimular a atividade física, mas sempre tem aquele que exagera. Não discuto a questão de remuneração, que foge da minha área. O que não se pode esquecer é que na jornada de trabalho, o entregador não está treinando, nem está monitorado, como acontece em um treinamento. O risco é de a pessoa exagerar, além da questão dos acidentes”, afirmou o educador físico Fabrício Gomes Costa.

A indicação dele é que, independentemente da atividade, é necessário haver fortalecimento muscular para suportar o estresse da corrida. A preparação deve ser de no mínimo oito semanas para apresentar um quadro de saúde ideal. “Uma pessoa que tenha a musculatura bem trabalhada e tenha boa mobilidade articular, além de economizar energia, evita lesões e tem uma postura boa. As entregas são feitas com mochila e tem que ter a musculatura paravertebral fortalecida”, afirmou o preparador físico.

O acompanhamento de um educador físico neste caso é importante para que a necessidade particular de cada um dos entregadores seja levada em consideração no desempenho da atividade diária.
 
APLICATIVOS
Em resposta aos questionamentos feitos pelo Diário de Uberlândia, a assessoria de imprensa da Uber Eats informou que a entrega feita por bicicletas tem como objetivo “mudar a forma como encaramos o transporte nas cidades”.

A gigante dos transportes de pessoas afirmou ainda que “o aplicativo traz novas oportunidades econômicas às cidades em que a Uber já opera, na medida em que permite que pessoas que não têm acesso a um carro, mas têm acesso a uma moto ou a uma bicicleta, por exemplo, também passem a gerar renda.”

Especializada nas entregas de alimentos, a iFood, em posicionamento dado também por meio de assessoria de imprensa, segue a mesma linha ao explicar a motivação de trabalhar na frente de bicicletas para entregas. “Ao usar aplicativos, os entregadores podem atuar de forma independente, inclusive utilizando a plataforma para complementar a renda familiar. No modelo de atuação, o entregador gerencia seu próprio tempo, fica disponível para entregar quando achar mais conveniente e pode, inclusive, atuar por outras plataformas”.

A nota ainda traz números gerais da empregabilidade da empresa, que tem “72 mil entregadores cadastrados na plataforma e uma estimativa de outros 200 mil que atuam diretamente com restaurantes no Brasil.”

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