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17/05/2019 às 11h40min - Atualizada em 17/05/2019 às 11h40min

Um dramaturgo à frente do seu tempo

Documentário “Wagão” fala da contemporaneidade da Vida e obra de Wagner Salazar

ADREANA OLIVEIRA
(Divulgação)
Wagner Rodrigue da Silva Júnior (1965-1991), ou Wagão, como era conhecido pelos amigos, representa como poucos a dramaturgia uberlandense. Em seus poucos anos de vida produziu textos que até hoje estão guardados com a família e já deram origem a uma tese de mestrado, “Pelos trilhos de Wagão: O teatro de Wagner Salazar”, defendida pelo artista cênico e pesquisador Luiz Humberto Garcia de Oliveira, em 2013.

E foi esse material que também serviu como base para o documentário “Wagão”, que terá sua exibição de estreia hoje, no Campus Santa Mônica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). O dramaturgo uberlandense, morto aos 25 anos em decorrências da aids, adotou o nome artístico Wagner Salazar e começou a produzir suas primeiras peças ainda na adolescência. “Free” (1980), “Quando a máscara é a própria face” (1984), “Medéia – O Dramatículo” e “Anjo” estão entre suas principais contribuições para o teatro de Uberlândia.

A produção do filme teve acesso a mais de cinco mil documentos manuscritos e datilografados, uma centena de fotos, dezenas de reportagens e matérias jornalísticas, dez entrevistas e quase uma dezena de roteiros deixados pelo artista. Wagão foi escritor, ator e diretor de teatro formado pela Escola de Artes Dramáticas da Universidade de São Paulo (USP) e escreveu e dirigiu várias peças durante os anos 1980, circulando por muitas cidades do país e do exterior.

“Nosso percurso não envolveu extensas buscas por arquivos locais ou nacionais, como geralmente acontece em processos e pesquisas semelhantes. Nós consultamos o acervo da família, que está sob os cuidados de Dona Cleuza, mãe de Wagner, anteriormente reunidos e acondicionados por Oliveira. Apesar de reunir os documentos, eles não foram classificados e ordenados obedecendo algum critério. E nós também não fizemos isso, por não considerar necessário”, disse o produtor Roberto Camargos.

Segundo ele, a equipe mergulhou na documentação e no movimento de ida e volta da pesquisa e identificou regularidades, recorrências temáticas, valores, modos de trabalho e a partir daí começaram a visualizar um pouco o que era o teatro do Wagner.

“Junto a esse processo realizamos entrevistas com pessoas que conviveram com Wagner nas muitas esferas da vida, com foco na relação que ele desenvolveu com a prática teatral. Isso, evidentemente, nos ajudou a olhar de outras formas para os documentos e possibilitou o início de um processo de seleção deles. Para o filme, nos valemos especialmente de seus roteiros, dos seus diários/anotações de vida e trabalho, de fotos e do pouco material audiovisual existente a que tivemos acesso”.

O que mais chamou a atenção dos realizadores de “Wagão” foi a quantidade de textos deixados por Wagner. A qualidade da obra, dos textos, a profundidade das questões que alimentavam a sua prática teatral também animou o grupo.

“Entre muitas coisas e questões, a dimensão existencial e a preocupação com os dilemas do homem comum numa sociedade complexa e cravejada de contradições foi o que mais nos chamou a atenção. Isso nos fez pensar sobre pontes existentes entre diferentes temporalidades, sobre a atualidade do texto e das questões do Wagner e, também, sobre o que ele estaria fazendo se estivesse vivo. Isso nos levou a experimentar o confronto de seus textos e reflexões com imagens e questões atuais”, disse o diretor de fotografia Yuji Kodato.

DEPOIMENTOS

O documentário reúne depoimentos e participação de muitos artistas de Uberlândia, ou que fizeram carreira na cidade, mas não seguindo à risca as linhas básicas da estética e da linguagem conhecida/reconhecida do documentário pelo grande público.

Os produtores optaram por reduzir as falas e depoimentos ao mínimo e abranger tão somente questões relacionadas ao Wagner e seu trabalho. Ao analisar a documentação e entender minimamente como era o processo artístico do dramaturgo, a equipe decidiu por falar dele e de seu trabalho prioritariamente pelo que ele deixou, especialmente os textos.

“Os artistas que trabalharam e conviveram com o Wagner entram no filme com algumas falas, mas, especialmente, interpretando/performando parte dos roteiros escritos por ele. Contamos ainda com o apoio, colaboração e trabalho de mais ou menos 15 artistas locais e uma de São Paulo para converter para o universo audiovisual partes de roteiros originalmente escritos para o teatro”, disse Kodato.

Ele completa que, nesse processo, houve um encontro de gerações e pode se atestar uma impressionante atualidade da obra de Wagner Salazar e, com isso, testar pontes entre o documental e o ficcional e entre passado e presente. “Tudo à luz das questões postas pelo Wagner no final dos anos 1980”, disse.

Durante a produção e pesquisa que durou aproximadamente um ano, ficou claro o lugar marginal dedicado à memória e a história de sujeitos críticos, afrontosos e desajustados aos padrões hegemônicos da sociedade, como Wagão. Ao falar do filme, da pesquisa, do trabalho era muito raro encontrar pessoas que tinham, pelo menos, ouvido falar de Wagner Salazar.

Na tese de mestrado de Oliveira, ele comenta a respeito da postura de Wagão, um artista à frente de seu tempo. “Wagner Salazar ainda é lembrado por ter sido também um crítico contundente de aspectos que, ainda hoje, fazem com que a cidade de Uberlândia não absorva de forma satisfatória a produção de seus artistas cênicos. Isto lhe rendeu conflitos, fez com que angariasse simpatias, antipatias e conferiu a ele o status de contestador”, finalizou Kodato.

ONLINE

Após a estreia do documentário haverá um bate-papo com a equipe da Nóis Produtora, a produtora executiva Wilza Assunção e o professor de Teatro da UFU Luiz Humberto Arantes. O filme será disponibilizado no site wagnersalazar.com.br e serão distribuídas cópias em DVD nesta noite.

O documentário foi viabilizado pela Programa Municipal de Incentivo à Cultura (Pmic), que leva o nome Wagner Salazar, e contou com patrocínio da Eficaz Serviços, Curinga Fiat e Curinga Caminhões e apoio da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura – Diretoria e Cultura – da UFU.

SERVIÇO

O QUE: exibição de lançamento do documentário “Wagão”
QUANDO: hoje (17), às 20h
LOCAL: Auditório do bloco 3Q do Campus Santa Mônica da UFU
CLASSIFICAÇÃO: 18 anos
ENTRADA FRANCA

FICHA TÉCNICA

Produção Executiva: Wilza Assunção, Agência Cultural Subsolo
Direção, roteiro, pesquisa, entrevistas, captação de som e imagens: Alex Oliveira, Roberto Camargos, Yuji Kodato
Direção de fotografia: Yuji Kodato
Montagem: Raissa Dantas, Roberto Camargos, Yuji Kodato
Trilha sonora original: Lucas Vidal, Ricardo Jorge
Elenco: Cleiton Custódio, Gustavo Martins, Jemerson Carlos “Bob”, Joaquin Tato, Manauara Clandestina, Rael Gesley Cunha
Maquiagem: Rapha da Cruz
Produção de cena: Nóis (Luiz Henrique Biru Leite)
Narração: Jorge Chamberlain
Vozes reza: Francisco Gerardo Cavalcante, Raphaela Cavalcante, Raissa Dantas, Roberto Camargos, Wilza Assunção Braz, Yuji Kodato
Depoentes: Abílio Tavares, Cida Almeida, Cleusa Rodrigues, Fernanda Bevilaqua, Flávio Arciole, Lavínia Panunzio, Leopoldo Pacheco, Luiz Humberto Garcia, Regina França, Sofia Papo

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