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21/01/2019 às 08h53min - Atualizada em 21/01/2019 às 08h53min

Uberlandense é referência do esporte paralímpico no País

Wéverton Santos comanda a equipe CDDU/Futel, mas divide as atividades com a Seleção Brasileira

EDER SOARES
Foto: Divulgação
Wéverton Lima dos Santos, de 38 anos, nasceu em Ituiutaba, mas foi em Uberlândia onde estudou, formou-se em educação física e decidiu seguir em uma modalidade esportiva que ainda enfrenta preconceitos e sofre com a falta de incentivo. O halterofilismo paralímpico de Uberlândia vem conquistando grandes resultados no cenário brasileiro e internacional, sendo Wéverton o criador da modalidade na cidade. O treinador vem ajudando não somente a formar campeões, mas também resgatando pessoas que antes estavam presas no tempo e puderam retornar ao convívio social.

Atualmente, além de treinador da equipe do Clube Desportivo para Deficientes de Uberlândia (CDD), que mantém parceria com a Fundação Uberlandense do Turismo Esporte e Lazer (Futel), Wéverton também é um dos principais treinadores da Seleção Brasileira de Halterofilismo Paralímpico e recorrentemente chamado para comandar atletas por competições em todo o mundo.

O Diário de Uberlândia chamou o treinador para uma conversa e ele falou sobre sua trajetória e planos para o futuro do paradesporto na cidade. Ele ainda faz uma análise sobre o momento do halterofilismo na cidade e no Brasil.

Diário: Quando iniciou no esporte e mais especificamente no esporte paralímpico?

Wéverton
: Iniciei já no esporte paraolímpico, no segundo semestre de 2000, enquanto eu era aluno da graduação na Faculdade de Educação Física da UFU. A convite da Professora Valéria Manna fiz um curso de atletismo para pessoas com deficiência intelectual e a partir dali iniciei uma equipe na faculdade. Deste projeto fui me integrando a outras modalidades (hóquei sobre o piso para Deficientes Intelectual, Atletismo para Deficientes Físicos, Natação, entre outras) e em 2003 criei, ainda na graduação, a equipe de Halterofilismo Paralímpico, que até hoje está sob meu comando.

Diário: Porque escolheu trabalhar no paradesporto e especificamente no halterofilismo?

Sempre tive deslumbre por esporte e o paradesporto foi uma consequência da FAEFI-UFU (a faculdade de educação física) ser uma referência no trabalho com esporte para pessoas com deficiência. Já o Halterofilismo foi o somatório de três coisas: uma que eu gosto muito do treino de força, a segunda era o fato de eu já estar envolvido no trabalho da pessoa com deficiência e a terceira é que o esporte estava em crescimento, quase não havia nada sobre a modalidade (pesquisa, trabalhos desenvolvidos e pouquíssimos atletas praticantes no Brasil) e isto foi o combustível, a paixão pelo desafio.

Diário: No começo quais foram os seus maiores desafios como treinador?

Wéverton: O fato das competições mudarem muito ou serem até mesmo canceladas por falta de dinheiro desmotivava muito os atletas e eu tinha que me manter firme para não deixá-los desanimar. O outro foi o fator financeiro, pois durante nove anos não recebi nenhum centavo para treinar os atletas, mas não deixava me abalar, pois sabia que com trabalho sério um dia chegaríamos e conquistaríamos nosso espaço. Por muitas vezes chorei pelos apertos que passei, mas tive muita fé e apoio de meus pais que acreditavam no profissionalismo do meu trabalho e me motivavam. E não posso me esquecer de forma alguma a minha esposa Emilene, que sempre esteve ao meu lado me incentivando e hoje como companheira técnica também.

Diário: Quais principais conquistas consideradas por você?

Falar de conquistas é um assunto que tenho um pouco de dificuldade. Apesar de me cobrarem muito sobre os meus resultados, acredito que vale destacar o tricampeonato brasileiro (2016, 2017, 2018). Formei Campeões nas três edições do Parapanamericano de Jovens (Colômbia, Argentina e Brasil). Ser técnico do primeiro atleta campeão Mundial, que foi em Dubai 2014, com o Rafael Vansolin, na categoria Júnior, foi sem dúvida um momento de muita emoção, pois pela primeira vez ouvimos o hino nacional em um torneio mundial. Mas a minha maior conquista sempre será continuar à frente da equipe nacional como treinador, pois sou uma pessoa extremamente patriota e ao assumir esta responsabilidade prometi para mim mesmo que faria de tudo ao meu alcance para levar meu país ao topo, sempre dentro dos limites do respeito e das regras.

Diário: Como você considera Uberlândia atualmente em termos de paradesporto no Brasil?

Wéverton: Sem dúvida alguma, uma potência nacional e se trabalharmos corretamente uma potência internacional. Temos sempre a visão de planejamento bem estruturado, com muita seriedade, isto tanto pelos clubes quanto pela Futel que, sem dúvida alguma, é o maior parceiro do Paradesporto Uberlandense. Falando de uma maneira geral, temos sempre consciência que devemos trabalhar para ser referência, pois é motivo de motivação para muita gente tanto aqui na cidade quanto a nível nacional.

Diário: Atualmente, o time conta com quantos atletas, e quais os principais campeonatos e desafios traçados para este ano?
Wéverton: Temos 30 atletas praticantes, sendo esta aproximadamente metade homens e metade mulheres. Já em relação às disputas temos um ano muito duro. Agora, em fevereiro, vem a Copa do Mundo em Dubai, que é um torneio tradicionalíssimo e as duas grandes disputas do ano, que será o Mundial no Cazaquistão, em Junho, e logo após, os Jogos  Parapanamericano de Lima no Peru. Além disto, temos três regionais classificatórios para o Brasileiro e o Campeonato Brasileiro no final do ano, ou seja, ano cheio de desafios e que precisamos planejar bem o trabalho.

Diário: Para os próximos anos, você como visionário do esporte carrega consigo alguma ideia para ajudar o esporte paralímpico?

Wéverton: Hoje, em Uberlândia, funciona um Centro de Referência e Desenvolvimento (CRD) do Halterofilismo Paralimpico, que é uma parceria do Comitê Paralimpico Brasileiro e a Futel. Com isto ganhamos uma estrutura de equipamentos excelente. Somado a este projeto, a Futel nos levou para o UTC, onde como resultado disto, criei uma meta de chegar a 50 atletas nestes próximos dois anos. Sei que será difícil, mas também sei que o esporte se tornou tradicional em Uberlândia e que cada vez mais podemos conquistar novos adeptos, sonhar sempre nos da motivação e esta será minha próxima meta.

Diário: Como está a questão de inclusão de novos paratletas. É difícil chegar até estas pessoas, que muitas das vezes ficam reclusas em casa e se sentindo sem serventia para a sociedade?

Wéverton: Este, sem dúvida alguma, é um grandioso desafio. Pouquíssimas pessoas vêm até nós para a prática de esporte. Na verdade, eu e os atletas na maioria das vezes descobrimos pessoas com perfil mínimo para a modalidade e vamos até a casa delas para tentar convencê-las. Este ainda é o maior sistema da captação que temos. Gostaria que instituições que trabalhem com reabilitação de pessoas (hospitais, clinicas de fisioterapia, etc.) nos encaminhassem estas, pois assim conseguiríamos potencializar o número de pessoas atendidas. Um fato que não pode deixar de ser mencionado é que a pessoa com deficiência ainda continua enclausurada em casa e isto por vários fatores, sejam por dificuldade de locomoção ou até mesmo por fatores psicológicos (medo, revolta, entre outros) e precisamos quebrar este ciclo. Uma vez que ela começa as atividades rapidamente ela se torna independente e produtiva retornando a uma vida social.
 
Diário: Quais os paratletas da equipe CDDU/Futel que atualmente têm mais chances de conseguir índices para a Paralímpiada de Tóquio?

Wéverton: Hoje, temos cinco atletas na busca da vaga para a Paralimpiada Tóquio 2020, sendo destes dois que merecem destaques: Lara Lima e Mateus Assis. Outras três estão na corrida também (Amanda, Ângela e Elizete) e que farei ajustes nos treinos deste ano para ver se conseguimos alcançar, até o final do ano, as marcas necessárias para estar entre as 8 do Ranking Mundial, para se classificarem para os jogos.

Diário: Você como treinador e gestor especializado em esporte paralímpico, tem metas para a sua carreira?

Wéverton: Olha, esta é uma pergunta que me fiz várias vezes ano passado. E cheguei a uma simples conclusão: criar uma filosofia de trabalho consistente, bem estruturada na minha equipe. Ter muitos atletas, pois aprendi que a concorrência interna gera muitos desafios mais não deixa meus atletas entrarem na zona de conforto. E com isto a equipe se torna meio que autossuficiente quanto às conquistas e objetivos. Quero dar continuidade retomando o meu mestrado que é uma parte da minha vida que acabei deixando um pouco de lado por causa do trabalho e das viagens. Importante lembrar que estudo muito, praticamente todos os dias, este é um ponto que nunca deixei de lado, por isto quero retomar para este lado acadêmico. É claro que não posso esquecer-me do desejo de um dia vir a ganhar uma medalha dos Jogos Paralímpicos com um dos meus atletas, acredito que este seria o meu maior feito profissional. E outro sonho bem pessoal é algum dia ganhar a medalha da Inconfidência Mineira.

Diário: O que significa ser treinador selecionado verde amarelo e também do time uberlandense?

Wéverton: Na verdade minha primeira convocação como técnico nacional veio em 2005, no Mundial para Cadeirantes e Amputados no Rio de Janeiro, quando ainda quem comandava a modalidade era a Associação Brasileira de Desporto em cadeira de Rodas (Abradecar). Em 2006, o CPB assumiu a modalidade e tive minha convocação, em 2010, para o Open da Jordânia, ou seja, já se vão nove anos de missões pelo CPB a frente da equipe nacional.

Diário: Você é casado com a Emilene Rosa, que também trabalha com o paradesporto. Vocês conversam muito sobre o assunto?

Sou casado com a Emilene há 11 anos. Conheci ela no final do meu curso de Educação Física. Ela sempre foi envolvida com esporte (como atleta e professora) e eu acabei trazendo ela para o paradesporto e hoje, sem dúvida, é meu maior suporte, pois além de ser uma profissional que trabalho minhas ideias (ela me traz ao equilíbrio, pois é muito centrada) e projetos, ela é uma dos dois profissionais que me substituem quando estou ausente nas minhas missões nacionais e internacionais. Ela se tornou recentemente companheira de Seleção Brasileira, na última missão em Bogotá na Colômbia, pois fez todos os cursos de capacitação de treinadores realizados pelo CPB e foi inevitável a convocação.

Diário: O principal desafio, hoje, é realmente a falta de incentivo e investimento por parte do empresariado?
Wéverton: Hoje ainda temos uma grande dependência da PMU através da Futel. Alguns clubes até conseguem desenvolver projetos pela lei de incentivo ao esporte, mas patrocínio direto ainda é o maior empecilho. Se os patrocínios chegassem ao paradesporto,  os clubes poderiam atender muito mais pessoas com deficiência (mesmo porque é um trabalho muito especializado no qual é difícil deixar na mão apenas do sistema público). Gostaria que o estado mineiro tivesse a cultura que vejo, por exemplo, em São Paulo, de incentivo ao esporte. Acredito que este seja um assunto que deva ser estudado com mais carinho, pois investir no esporte é economizar na saúde e isto é indiscutível.

Diário: O que difere o esporte halterofilismo dos demais esportes paraolímpicos?
O halterofilismo ainda esbarra na cultura do preconceito, pois as pessoas ainda tem visão que halterofilismo é só para atletas gigantescos, com grande massa muscular, e isto não é verdade, pois a modalidade conta com dez categorias no masculino e dez no feminino. Tenho atleta feminina que pesa 37 quilos e levanta 75 quilos, ou seja, é um trabalho muito profissional, respeitando as limitações. As outras modalidades já tem um respaldo cultural da sociedade, então além de todos os desafios de captação humana temos o desafio da aceitação cultural e de divulgar o esporte halterofilismo paralimpico.
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