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01/04/2018 às 06h26min - Atualizada em 01/04/2018 às 06h26min

Lendas urbanas e contos marcam história de Uberlândia

Dia da Mentira remete a diversas histórias que ainda estão na memória de muita gente

WALACE TORRES | EDITOR
Pelé durante visita ao Praia Clube, no início da década de 1980, assediado por sócios | Foto: Santelmo Souto/Arquivo Close Comunicação

Uma grande personalidade de reconhecimento internacional chega a Uberlândia e gera o maior alvoroço. Simpatizantes de todas as idades querem conhecê-lo pessoalmente ou ao menos ter a chance de vê-lo de longe e não somente pela televisão. Mas, ao ser levado para conhecer um dos lugares mais vistosos da cidade, foi barrado logo na entrada.

Anos antes, o assunto do momento era outro bem diferente. E horripilante. Um louco que caminhava pelas matas da região do Triângulo Mineiro deixava um rastro de medo e terror por onde passava. Discreto como uma sombra, fazia vítimas num piscar de olhos. E para fugir da polícia se transformava em qualquer coisa.

Em ambas as situações citadas acima os personagens realmente existiram e passaram por aqui. Mas, daí a ter o desfecho pelo qual suas vindas ficaram marcadas no conceito popular já é outra história.

No caso da personalidade barrada, o pivô da história era o ex-jogador Pelé, que no início da década de 1980 veio a Uberlândia com a equipe do Cosmos para um amistoso. Antes da partida, a equipe visitou o Praia Clube. Por muitos anos, o boato que correu na cidade era de que o Rei do futebol foi proibido de entrar no clube por causa de sua cor. “Ele não só entrou como passou a tarde inteira no clube. Foi convidado pela diretoria e recebido com honras”, lembra o fotógrafo Santelmo Souto, que registrou a visita. Pelé tirou fotos com funcionários e sócios do clube, especialmente a garotada.

Na última visita que fez a Uberlândia, em 2011, para inaugurar uma academia que leva seu nome, Pelé foi questionado pelo jornalista Arthur Fernandes sobre o fato e negou que o episódio tivesse acontecido. “Então foi outro Pelé, porque eu não estou sabendo disso não. Se eu fui barrado, não foi na porta e não fiquei sabendo”, afirmou na ocasião.

Já a história do louco que trouxe pânico à região foi narrada no livro “O monstro de Capinópolis ”, que conta a trajetória de Orlando Sabino, um andarilho que passou por várias cidades da região até ser capturado pela polícia vários meses depois de deixar um rastro de sangue e medo. O caso realmente aconteceu, mas Orlando, um homem de aparência franzina, de pouco mais de 1,5 metro de altura, não tinha poderes de desaparecer, como era noticiado na época.

“O livro ajudou a tirar muita dúvida e acabar com as crenças. O pessoal falava que o homem virava capeta, boi preto, cupim e ainda que ‘invultava’ - era esse mesmo o termo usado -, ou seja, que se transformava num vulto”, diz o jornalista Pedro Popó, autor da obra. Popó levou oito anos entre a apuração dos fatos e a publicação do livro. “Você encontra muitas crendices, lendas, e tem que ser muito cuidadoso na hora de apurar o que é verdade e o que não é. A lenda urbana tem como finalidade criar o pânico”, diz.

Entre um fato e um boato realmente há um grande abismo onde imperam dúvidas, crenças e mitos. E um pouco de verdade. Não é raro encontrar contadores de histórias que juram de pés juntos e mãos abertas que aquilo que disseram aconteceu mesmo. Levante a mão quem nunca repassou uma história sem aumentar ao menos algumas linhas ou até mesmo um capítulo inteiro.

O Dia da Mentira, lembrado em todo o mundo neste domingo 1º de Abril, nos remete a diversas lendas urbanas que ainda estão na memória de muita gente. Quem não se lembra da cobra na piscina de bolinhas numa rede de fast food! A data também é bem propícia para os dias atuais em que delações premiadas em troca de redução de pena e notícias falsas, as chamadas Fake News, estão cada vez mais em evidência. O mundo político está repleto de exemplos: depoimentos contraditórios em inquéritos policiais e circulação de alertas para projetos que sequer estão em tramitação.

Se antes os fatos ou boatos proliferavam de boca em boca até chegar a uma multidão, hoje basta um clique, um compartilhamento, para que milhões tenham acesso ao mesmo caso em tempo real.

A diferença de antes para agora é que, pelo caminho informal, os fatos iam aumentando de grau à medida que eram repassados adiante. Hoje, do jeito que a notícia é postada, ela chega ao destino. “Com a internet, isso fica mais evidente e as pessoas, mais vulneráveis. Muita gente passa a mensagem pra frente, compartilha, e nem sabe que se trata de mentira”, diz o psiquiatra Bruno Caetano Vieira.

MENTIRA

Bruno conta que na psiquiatria há várias considerações sobre a mentira. Há os casos tradicionais em que a pessoa mente para conseguir algum ganho primário ou até mesmo prejudicar outro indivíduo. Tem ainda os casos patológicos, como a mitomania em que a pessoa tem compulsão por contar mentiras. “Neste caso, a pessoa quer chamar a atenção, interagir socialmente. Ela tem a consciência de que está mentindo, que pode ter problemas sociais, com ser excluída de grupos de amizade, mesmo assim ela não para de mentir”.

Segundo aponta, na psiquiatria forense há vários métodos de detecção de mentira, o que não garante 100% de eficiência. Ele avalia que a melhor maneira de detectar se um fato é mentira é analisar os fatos e não confiar no comportamento verbal.

UBERLÂNDIA

Verdades, mentiras e casos sinistros do passado

A história de Uberlândia é repleta de casos sinistros e lendas urbanas que vão desde um simples aparecimento de assombração até fatos verídicos que se tornaram trágicos por causa de uma mentira. Um dos casos mais conhecidos é o do João Relojoeiro, que foi preso, torturado e morto, acusado de furto a uma joalheria em 1956. 

Na época, a polícia, pressionada a desvendar o caso que envolvia uma família influente da cidade, ouviu de um informante que o autor poderia ser João Luiz Fagundes. Segundo consta no processo, a família do acusado disse que João passou a noite no velório de uma sobrinha, mas a versão não o livrou da mira da polícia. Somente após sua morte é que se descobriu que João era inocente. Ainda segundo o processo, a suspeita é que os donos da loja forjaram o crime para receber o seguro das joias. De todos os envolvidos que foram a júri popular, somente os investigadores foram condenados.

Já uma lenda urbana que mexeu com o imaginário popular e que sobreviveu por muitos anos é a da fazenda Tira Couro, na região do distrito de Cruzeiro dos Peixotos. Dizem que o nome seria uma referência a um padre que teria sido morto após lhe arrancarem a pele. A versão mais aceita, no entanto, é que muita gente aproveitava as margens de um córrego na região para abate de animais, que tinham o couro lavado ali mesmo.

O motorista aposentado Lourival Honório da Silva lembra de outro caso sinistro, porém menos traumático, ocorrido numa residência na avenida Cesário Alvim. Segundo conta, durante quase um mês a residência foi alvo de pedras que quebraram todo o telhado. “Ninguém sabia de onde vinham as pedras. Até trouxeram padre, pastor, uma benzedeira, polícia, mas não descobriram o que aconteceu”, conta Lourival. Ele diz que pouco tempo depois, quando estava na casa da patroa de sua namorada, um fato semelhante aconteceu. “A gente estava na cozinha e ouviu um estrondo no banheiro, mas não havia ninguém. Quebrou o telhado. As costas do sofá também recebeu uma tijolada, o estranho é que não havia espaço na janela para o tijolo passar”, diz o aposentado.
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