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01/01/2018 às 05h37min - Atualizada em 01/01/2018 às 05h37min

Ceará revoluciona na gastronomia

Estado tem movimento que resgata ingredientes como rapadura e feijão-verde, e duas pouco conhecidas

LUIZA FECAROTTA E ROBERTO DE OLIVEIRA | FOLHAPRESS
Praia de Ponta Grossa tem falésias multicoloridas, com dunas e vegetação de restinga / Foto: Roberto de Oliveira/Arquivo Pessoal

 

O Ceará, Estado que historicamente concentrou seu olhar para fora, hoje vive um processo de busca de identidade, de ensimesmar-se.

Um eixo dessa movimentação é o tratamento recente que a gastronomia, outrora sem muitas particularidades, passou a receber de uma nova safra de cozinheiros. Um caminho, aliás, que em um só tempo serve à retomada de autoestima do povo e estimula o turismo, traços mais fortalecidos em Pernambuco e na Bahia, na mesma região.

Essa cozinha apelidada D.O.C., "com denominação de origem cearense", passa a ser sustentada por produtos regionais, como forma de expressão e exaltação do local.

Elementos como os peixes, o bode, a rapadura, as frutas tropicais, a pimenta-de-cheiro, o feijão-verde, a manteiga de garrafa são submetidos a técnicas mais modernas e apuradas, sem que seja ferido o essencial: o sabor que os identifica ao seu Estado.

Um Estado cuja cozinha conjuga influências do mar, da serra e do sertão e que, embora marcada pela escassez, soube exibir-se rica, colorida e perfumada - uma potência, um símbolo de ufania.

Surge um esforço coletivo de cozinheiros, acadêmicos, pesquisadores e órgãos públicos para identificar o que é genuinamente cearense. "Há uma confusão do que é nosso de verdade. O Nordeste se confunde nas fronteiras", diz João Lima, articulador de gastronomia do governo do Ceará. "Baião de dois é só nosso? Paçoca é só nossa?", questiona.

Inspirado em modelos bem-sucedidos, como o do Peru, país eleito pelo sexto ano consecutivo como melhor destino culinário pelo World Travel Awards, o governo busca estimular a cadeia da gastronomia, de ponta a ponta, para torná-la atraente ao viajante. "Trabalhar insumos locais desperta a curiosidade do turista para visitar mercados, para conhecer um engenho", diz Lima.

O ato de cozinhar - e valorizar ingredientes e modos de preparo regionais mais profundamente - vira ferramenta para construir e demarcar, afinal, esse Ceará.

"Há um esforço para identificar o Ceará a partir da comida", diz o sociólogo Filipe Camelo, pesquisador do Observatório Cearense da Cultura Alimentar, cuja fundação não completou nem um ano e envolve grupos de estudiosos em torno das várias áreas da comida.

"O que diferencia a cozinha cearense da nordestina? Hoje, particularmente, nada", diz Bia Leitão, cozinheira especializada em antropologia da alimentação e também integrante do observatório. Ela diz que, diferentemente da Bahia, de Minas Gerais e do Pará, Estados nos quais existem culinárias reconhecidas, o Ceará não tem uma cozinha genuinamente regional. Seu movimento é justamente "unir forças para que possamos dizer: isto é uma cozinha cearense".

 

FORTALEZA

'Comida de pobre' é muito rica, diz chef de restaurante

"Como colocar criatividade em um prato sem desrespeitar sua história?", se pergunta Ivan Prado, coordenador do curso de gastronomia do Senac, em Fortaleza. "O ingrediente é a forma. Eu me aproprio de técnicas universais e as uso no insumo do Estado que represento.”

A confeiteira Lia Quinderé, que tem três unidades de sua loja Sucré em Fortaleza, segue caminho similar. "Tive o entendimento de que aplicar técnicas francesas a ingredientes regionais seria importante para o Ceará e, ao mesmo tempo, um desafio. Não temos frutas vermelhas aqui, como achar saídas?"

Pois ela usa frutas como acerola, cajá, seriguela, e substitui a farinha de amêndoa, base da confeitaria francesa na produção de macaron, por farinha de castanha-de-caju, ainda que tenha encontrado obstáculos, tendo em vista que é muito oleosa.

Um bérnaise, por exemplo, é uma emulsão de gema e manteiga clarificada (gordura livre de parte da água e de elementos sólidos do leite). "E se fizer com manteiga de garrafa? Sou cearense ou francês?", exemplifica Prado.

De um trabalho conectado ao Ceará surgem receitas como o biscoito de rapadura preta com musse de limão e panacota de queijo de cabra. "É um produto que está desaparecendo. Os engenhos estão acabando, a cultura vai se perder", diz Lia. A rapadura preta é a borra do tacho do caldo de cana, faz parte da rotina sertaneja. "Come-se no lanche porque dá energia."

Esse item também aparece na cozinha de Leo Gonçalves, chef "naturalizado cearense". A rapadura preta faz base para o molho que besunta seu cupim de sol, servido com vinagrete de maxixe grelhado, amendoim e farofa.

À frente d'O Mar Menino, em Fortaleza, Gonçalves descreve sua cozinha, que foi ganhando forma e prêmios ao longo de dois anos de vida, como brasileira, nordestina, cearense, moderna. "Faltava gente para olhar de um jeito novo. É uma vanguarda silenciosa, teimosa, mas a gente tenta mostrar o caminho do mar", diz ele, que busca o "reforço de sabor" e os "sabores referenciais" do Ceará.

Em sua cozinha, o ex-publicitário também pratica o aproveitamento pleno dos ingredientes. Sem blá-blá-blá. Faz torresmo de polvo com a cabeça do animal, antes dispensada, que passa por desidratação, defumação e fritadeira. "E se não tenho uma vieira aqui? Uso a bochecha do sirigado [peixe da região, de carne branca e estruturada], que tem textura semelhante. Vamos olhar o quão rica é a comida de pobre."

"O [chef] Marco Gil, levantou a bandeira da cozinha D.O.C., de denominação de origem cearense, e a gente tenta usar ao máximo o produto local", diz Gonçalves.

Em seu Quintal, em Fortaleza, o português Marco Gil realça produtos que encontra, os manipula o mínimo possível e faz uma cozinha mais rústica, embora bem acabada, bonita, fresca e delicada. "Trago do meu background português. A gente cozinha o que tem. Minha avó passou a vida sem comprar um produto no mercado."

 

LITORAL LESTE

Icapuí esconde praias desertas e falésias

Existe um trecho do litoral leste do Ceará, quase na divisa com o Rio Grande do Norte, ainda pouco conhecido, até mesmo pelo turismo "day use", aquele que explora a vizinhança da capital, Fortaleza, em viagens bate e volta.

Esse território, porém, é maior do que toda a faixa litorânea do Piauí, com 60 km de extensão, e guarda duas praias praticamente intocadas que merecem bem mais que uma rápida visita: Ponta Grossa e Redonda.

As duas estão localizadas em Icapuí ("canoa veloz", em tupi), município com uma população estimada em 18 mil habitantes, a cerca de 200 km de Fortaleza. O lugar integra o Roteiro das Falésias.

Em Ponta Grossa, o perfil dos moradores da comunidade chama a atenção: gente de pele clara, queimada de sol, olhos verdes e cabelos lisos. A maioria dos nativos é descendente de holandeses, europeus que ali chegaram no início do século 17.

Hoje, parte dos nativos de Ponta Grossa instalou, na beira da praia, barracas com pé-direito de cinco metros de altura, o que torna esses ambientes sempre frescos, graças à circulação constante do ar.

Há, contudo, outros encantos, principalmente os avistados à beira-mar: as praias são ponteadas por dunas e falésias. Mangues e barras de rio ajudam a construir o cenário, onde o sol brilha praticamente o ano todo.

Área de proteção ambiental, Ponta Grossa é dona de falésias multicoloridas. Sobre elas, dunas e vegetação de restinga. Na maré baixa, o recuo da água cria um imenso espelho na areia, refletindo o azul do céu como se estivesse recortado por filetes - há uma fonte de água doce, chamada pelos nativos de "olheiro", que escorre rumo ao mar.

Por R$ 20, guias locais conduzem visitantes por trilhas que seguem acima das dunas, um local estratégico para observar a mata de tabuleiro, o paredão de falésias e ter uma dimensão exata de como a praia é deserta.

São aqueles trechos propícios para quem gosta de caminhar horas na areia sem cruzar com vivalma.

 

MANDACARU

Já na Redonda, a coloração das falésias passeia entre o vermelho e o branco, corre do laranja para o amarelo. Pequenos coqueiros surgem perto do areal. Quase sempre calma, a maré convida para um banho. A mirar, uma jangadinha aqui, outra lá onde a areia faz a curva.

Pela manhã e no fim de tarde, sempre há pescadores artesanais pelo caminho. Mandacarus, típicos da vegetação da caatinga, estão por toda parte, ora no solo pedregoso, ora na beira da praia.

A Redonda é a que oferece melhor estrutura de bares, restaurantes e pousadas.

Situada em área de mangue, a praia da Requenguela, na região mais central da cidade, surpreende pelo recuo da maré, que chega a alcançar mais de dois quilômetros. É ali onde ocorre o encontro de mar com rio, formando a área da Barra Grande, ponto de encalhe das embarcações lagosteiras para reparo.

A Requenguela oferece uma das experiências mais encantadoras do extremo leste do litoral cearense: a de caminhar pelas passarelas da Estação Ecológica de Mangue Pequeno, onde é possível acompanhar o avanço do mar ao mesmo tempo em que se contempla a fauna e a flora típicas do manguezal. Ninguém gasta um tostão para assistir a esses espetáculos.

 

PACOTES

R$ 1.244

Valor por pessoa para quatro noites no hotel Oh! Linda Pousada, na praia da Redonda, em Icapuí, a seis quilômetros da praia de Ponta Grossa. Inclui aéreo. Na Top Brasil Turismo: topbrasiltur.com.br

 

R$ 1.260

Valor para quatro noites na capital Fortaleza, com hospedagem no hotel Othon Palace, em quarto com vista para o mar. Sem passeios, mas com aéreo. Na Expedia: expedia.com.br

 

R$ 1.260

Pacote para Fortaleza, com quatro noites no hotel Iracema Travel. Inclui quatro passeios pelas praias de Cumbuco, Morro Branco e Canoa Quebrada. Com aéreo, mas para saída apenas em 27 de abril. Na MMTGapnet: mmtgapnet.com.br

 

R$ 1.875

Valor para quatro noites em Beberibe (a 85 quilômetros de Fortaleza), com hospedagem no Coliseum Beach Resort. O regime de alimentação é all inclusive. Os traslados do aeroporto fazem parte do pacote, que não inclui passagens aéreas. Na Agaxtur: agaxtur.com.br

 

R$ 1.940

Com saída em 20 de fevereiro, o pacote oferece seis noites em Fortaleza, no hotel Carmel Magna Praia. Inclui passeio às praias de Lagoinha e Canoa Quebrada, além de aéreo e traslados entre hotel e aeroporto. Na Flot: flot.com.br

 

R$ 2.700

Pacote com quatro noites no hotel Vila Galé, na praia de Cumbuco. O valor é para dois adultos e tem alimentação all inclusive. Inclui recreação para crianças. Sem aéreo. Na Zarpo: zarpo.com.br

 

R$ 3.375

Valor para quatro noites no hotel Essenza, em Jericoacoara, válido para diárias em janeiro. Não inclui aéreo ou passeios. Na Litoral Verde: litoralverde.com.br

 

R$ 4.495

Sete noites em Canoa Quebrada, no hotel Long Beach, com passeio de três horas de buggy até a praia da Ponta Grossa. Inclui aéreo e traslado entre aeroporto e hotel. Na R17 Viagens: r17viagens.com.br


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