Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
20/07/2022 às 08h00min - Atualizada em 20/07/2022 às 08h00min

Quando acontece a dispensa discriminatória?

ALEXANDRE VALADÃO
A atual Constituição Federal caracteriza-se por um dos textos que mais avançaram na salvaguarda dos direitos trabalhistas, dedicando cinco artigos exclusivamente à regulamentação desses direitos, individuais e coletivos, o que se mostrou inovador para a realidade da época.

Nos incisos XXX, XXXI e XXXII do art. 7º, o legislador constituinte deixou clara sua preocupação com o afastamento de qualquer tipo de tratamento discriminatório no ambiente de trabalho, impondo a “proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”, bem como a “proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência” e a “proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos”.

Ainda, a Convenção nº 111 da OIT, ratificada pelo Brasil em 26 de novembro de 1965, proíbe a discriminação em matéria de emprego e ocupação.

Internamente, o Brasil sempre se preocupou com o tema, combatendo veementemente qualquer tipo de tratamento discriminatório, levando os Tribunais Trabalhistas a proferirem decisões pautadas em condenações por atitudes desigualitárias.

Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) já havia se firmado no sentido de que a dispensa imotivada de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave, que suscite real estigma ou preconceito, quando o empregador tiver conhecimento de tal situação, gera a presunção de ocorrência de ato discriminatório, o que veio a ser ratificado com a publicação da Súmula nº 443 daquele Tribunal.

Porém, deve-se ter cuidado ao se caracterizar o tratamento discriminatório em casos que o trabalhador não seja portador do vírus HIV, já que o conceito de “doença grave, que suscite real estigma ou preconceito” é genérico, não devendo ser aplicado a todo caso.

Via de regra, a dispensa discriminatória ocorre quando há o rompimento da relação de trabalho por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, idade ou qualquer outro motivo que fere o tratamento isonômico entre os empregados (art. 1º da Lei nº 9.029/95).

Nesses casos, por violar os princípios constitucionais da Igualdade, do Valor Social do Trabalho e da Dignidade da Pessoa Humana, a despedida é considerada nula, além de ser suscetível de indenizações previstas na própria legislação (art. 9º, CLT).

Para a configuração da dispensa discriminatória, não basta somente a ciência do empregador sobre o estado de saúde do empregado, mas também que esse trabalhador seja portador de “doença grave”, o que, por si só, ainda não garante a caracterização da dispensa como discriminatória, já que é necessário que esta doença cause real estigma ou preconceito.

Por “doença grave” entende-se que são patologias de evolução prolongada e permanente, para as quais ainda não existe cura, que comprometem severamente a saúde e a funcionalidade do portador.

Já a conceituação de doenças estigmatizantes é tarefa por demais árdua, trazendo dificuldades até mesmo para os profissionais da saúde, em virtude da necessidade da individualização do caso concreto.

Assim, é imprescindível a análise minuciosa de cada fato, sem a qual não se pode concluir que todos os casos são iguais e causam discriminação, pois não necessariamente pode-se afirmar que toda demissão estará diretamente ligada à condição física do empregado.

Em julgamentos realizados pelo TST sobre o tema, já se firmou o entendimento de que, caso o empregador consiga “provar, de forma robusta, que dispensou o reclamante, portador de doença grave, por algum motivo plausível, razoável e socialmente justificável”, fica afastado “o caráter discriminatório da rescisão contratual” (AIRR 2438-55.2013.5.15.0016).

Assim, não é toda doença, mesmo que seja grave, que se enquadra no conceito de “dispensa discriminatória”. Precisamos estar atentos! Justiça!


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
Leia Também »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90