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14/07/2022 às 08h00min - Atualizada em 14/07/2022 às 08h00min

Letramento eficaz

IVONE ASSIS
Meu avô, tantas vezes, contou-me a história de um vaqueiro destemido, que fora buscar uma vaca brava, que fugira para o mato. O homem levou uma matula reforçada, e só depois de dois dias voltara, já com a vaca e um “filhote”. Quando o fazendeiro veio abismado saber como ele conseguira capturar aquela vaca sestrosa, ele disse: “A vaca foi fácil, quem deu muito trabalho foi o filhote dela”. “Que filhote?!”, indagou o fazendeiro. “Este”, apontando, o homem, para um veado-mateiro. A história nos matava de tanto, porque ninguém captura um Mateio como se fosse um bezerro, mas nosso imaginário ia longe.

Hoje, lembrando-me desse episódio, viajei direto para o livro infantil “Zé Cassimiro, o vaqueiro”, de autoria de Ronaldo de Melo, e com ilustrações de Klaudiana Torres, obra, esta, publicada em 2018, pelo Seduc, em Fortaleza, Ceará. Fiquei pensando no quanto o livro nos insere na memória e no tempo. O livro é mais que arte, é vida.

A obra se inicia dizendo: “Esta história vem lá do sertão. / Ouvi o meu avô contar. / A de um sujeito afamado, / vaqueiro consagrado do sertão do Ceará. // No alpendre das casas, nas cancelas dos currais, / se o assunto era coragem, e a conversa muito mais, / falavam logo de Zé Cassimiro, o vaqueiro, / um cabra destemido, duro e ligeiro. // Zé Cassimiro era daqueles que quanto maior o desafio, / maior a empolgação. / E como se transformava quando vestia / sua calça, chapéu de couro e gibão. // [...] Certa vez”, Zé Cassimiro foi contratado para encontrar um boi brabo que fugira do curral e se embrenhara na mata fechada. Apesar de todos os esforços, toda procura foi em vão. Até que um dos vaqueiros enfatizou: “— Aqui só se for Zé Cassimiro, vaqueiro duro e ligeiro, / o mais valente do Ceará // O fazendeiro, [...] / não pensou duas vezes”, mandou que trouxessem Zé Cassimiro até ele [...]. Como pagamento, o vaqueiro poderia escolher: “se uma vaca parida ou uma boa quantia em dinheiro”. E assim se fez. “No dia seguinte, o sol não tinha ainda saído, / quando o fazendeiro avistou, na cancela de sua / fazenda, o vaqueiro montado em seu alazão”. Zé Cassimiro, perguntou: “— Para que lado o boi poderia estar?”. Tão logo o fazendeiro apontou-lhe a direção, o vaqueiro ressaltou: “— Comigo não carece se preocupar, / só volto quando o bicho capturar”. E lá se foi “Zé Cassimiro, vestido com roupa de couro / e montado em seu alazão”. Adentrou a mata fechada, “como se fosse assombração”. Depois de muita busca, o silêncio foi rasgado por um “grito, seguido do badalo do chocalho”. Passadas muitas horas, previu o fazendeiro: “— O boi foi capturado!”. Não tardou, o homem-fera e a fera-boi surgiram. O vaqueiro foi aclamado pelo povo que o aguardava. Zé Cassimiro, em sua simplicidade, “Recebeu seu pagamento / e deixou a história para o povo inventar”.

Histórias como a do meu avô e a de “Zé Cassimiro”, melhor, Ronaldo de Melo, viram lendas, porque são cheias de criatividade. São histórias incríveis, para se contar em sala de aula e explorar na interpretação, extraindo valores como Coragem, Dignidade, Honra, Tristeza, Alegria, Humildade e tantos outros. O trabalho do Educador é árduo, e as boas histórias são capazes de tornar o ofício mais brando.

Há anos, semanalmente, produzo, no mínimo, dois textos literários. Já são mais de mil textos curtos. Há os textos maiores, alguns demandando anos de pesquisa, mas estes são raros, não passam de uns 50. Ao longo da vida não sei quantos mil livros já li, e nem quantos ensinos de literatura assisti... É uma relação de amor e aprendizagem da escrita e da leitura, não uma obrigação. Imagino que a riqueza está no saber. Águo palavras, para que brotem textos.

No caso do “Zé Cassimiro”, a ilustradora Klaudiana Torres deu vida artística ao livro, com a beleza de sua Arte. Embora o texto fale por si, quando unido a uma boa ilustração, o encantamento em sala de aula é maior. O importante é que o texto, oral ou escrito, ilustrado ou não, garanta um letramento eficaz.

*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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