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05/06/2021 às 09h00min - Atualizada em 05/06/2021 às 09h00min

Trombofilia, hein?

IARA BERNARDES
Foto: PEXELS
“Iara, eu sinto que estou grávida!” Ao ouvir essa frase eu logo pedi para que ela entrasse no carro e a levei ao laboratório para que aquela angústia da incerteza acabasse. Poucas horas depois veio a confirmação: Maria* estava grávida! No entanto, duas semanas depois ela teria outro aborto espontâneo, mais um entre os vários que ela já sabia que tinha sofrido. Todos os médicos diziam que ela não tinha nada e que bastava esperar. No entanto, cansada de tanto positivismo e contento, resolveu entender o que acontecia com o corpo dela, afinal, ela SABIA que algo não estava certo. Depois de alguns exames veio o diagnóstico: Trombofilia. Hoje Maria* está bem, com dois filhos nos braços, mas a batalha não foi fácil.

Por essa história ter me marcado tanto, busquei entender um pouco mais sobre essa condição e conversei com a médica especialista em Angiologia e Cirurgia Vascular Drª Lais Palitot.

Dra Laís, já presenciei casos bem traumáticos de aborto e morte neonatal devido à trombofilia. Seria possível evitar episódios repetidos de abortos recorrentes e até mesmo complicações para a mulher e o bebê se fosse incluído no pré-natal exames de detecção dessa condição?

A investigação das trombofilias hereditárias e adquiridas não é indicada para a população geral. Isso porque o uso da profilaxia (anticoagulantes) antiparto em mulheres que têm uma trombofilia hereditária, mas nenhum histórico pessoal ou familiar de tromboembolismo venoso é controverso. Usar anticoagulante durante a gestação também apresenta riscos e ter alguma trombofilia diagnosticada não necessariamente significa que a mulher terá trombose ou aborto gestacional e nem que a trombofilia será a causa do possível aborto. Importante lembrar que a principal causa de aborto são as alterações cromossômicas. Muitas vezes, após o diagnóstico de trombofilia e tratamento adequado, acontece o aborto por várias outras causas. Eu mesma tive 2 abortos, apesar de fazer tratamento com anticogulante. Isso é realmente frustrante. Por todas essas razões, a investigação de trombofilias não deve ser feita durante exames pré-natais de todas as mulheres. 

Quais as causas e tratamento da trombofilia?

A trombofilia é uma tendência à trombose resultante de alterações hereditárias (as principais são deficiência de proteína C, proteína S e antitrombina; mutação do fator V Leiden e mutação do gene da protrombina) ou adquirida (síndrome antifosfolípide - SAF) que levam a um estado de pró-trombose, predispondo as pessoas a apresentarem trombose venosa e/ou arterial. Vários fatores de risco estão envolvidos  nos mecanismos fisiopatológicos que resultam na trombose. Os fatores associados à presença de uma trombofilia hereditária incluem tromboembolismo venoso (TEV) em idade menor que 40 a 50 anos de idade; uma forte história familiar de TEV, TEV em conjunto com fatores precipitantes fracos em uma idade jovem, TEVs recorrentes, e TEV em um local incomum, como o sistema nervoso central ou as veias esplâncnicas. A história de perdas fetais de repetição também deve ser considerada quando for avaliada a probabilidade de uma trombofilia. Cada trombofilia tem seu tratamento adequando.  Algumas necessitam de anticoagulação e/ou antiagregação plaquetária para o resto da vida, outras apenas durante situações de alto risco.

É possível ter uma vida normal com essa condição? 

Sim! São várias as trombofilas, mas com o tratamento adequado é possível ter uma vida normal e sem eventos tromboembólicos.
Além deste, qual é o maior alerta entre as doenças vasculares em gestantes?

O tromboembolismo venoso com certeza é complicação vascular mais temida. De modo geral, pode-se afirmar que na gestante existe um risco seis vezes maior de ocorrência do tromboembolismo venoso. E não estou falando das gestantes com trombofilias. Tradicionalmente, o risco de trombose na gravidez é considerado maior durante o terceiro trimestre da gestação e, especialmente, no puerpério, ou seja, no período de seis semanas após o parto. Isso acontece pela  estase venosa associada ao estado de hipercoagulabilidade que ocorre durante a gestação. Além disso, a piora da insuficiência venosa, com formação de varizes, edema e dor em peso nas pernas também é bastante comum, por conta da ação hormonal e compressão dos vasos abdominais pelo útero

Em relação às doenças vasculares e a COVID-19, é possível afirmar que as gestantes entram no grupo prioritário por serem mais propensas a doenças vasculares?

Com certeza. A gestação já é considerada um fator de risco para eventos tromboembólicos, principalmente no terceiro trimestre. A COVID -19 causa diversas alterações no sistema de coagulação que aumentam ainda mais esse risco. 


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