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19/05/2021 às 10h00min - Atualizada em 19/05/2021 às 10h00min

A dinâmica da fidelidade partidária dos políticos brasileiros

ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA
Fidelidade do latim “fidelitas”, representa o atributo ou a qualidade de quem ou do que é fiel. A fidelidade implica confiança recíproca, e essa relação de implicação mútua aplica-se quer entre dois ou mais indivíduos, quer entre determinado sujeito e o objeto sob sua consideração, que, a seu turno, também pode ser abstrato ou concreto. Essa co-significação originária mostra-se plena quando se trata de dois sujeitos, ambos com capacidade ativa, pois, nesse caso se pode invocar o correlato de confiança originário.

A fidelidade é costumeiramente aplicada tanto a pessoas quanto a outros entes, animados e inanimados, concretos, abstratos ou mesmo imaginários, desde que observado o seu núcleo de significação, ser ou permanecer conforme as características originais. Nessa concepção, pode-se dizer que se assemelha à ideia de imutável, embora não sejam necessariamente o mesmo conceito. 

Por seu turno a fidelidade partidária se compreende pelo dever que o eleito tem em cumprir o mandato para o qual foi eleito, no partido pelo qual foi eleito e no tempo que durar seu mandato, tendo o dever de cumprimento do estatuto partidário, das plataformas eleitorais que aceitou defender e das propostas de campanha que fez ao eleitor para se eleger. Se entende como dever que se impõe ao parlamentar, obediência às diretrizes do partido e a permanência no partido em que tenha sido eleito. Se o eleito mudar ou afastar-se do partido, deveria este perder o cargo a que se candidatou, pois subtende-se que a ideologia do partido que o elegeu deve ser respeitada.

Não haveria como se falar em fidelidade partidária em nosso país sem antes contextualizar a história partidária no Brasil, uma vez que é através desta história que se formou o atual quadro partidário, assim como a legislação vigente que o rege.

A perda de mandato pela troca de partido não era permitida pela Constituição Federal de 1988, que no seu artigo 15º veda a cassação dos direitos políticos, e estabelece os casos em que pode ocorrer. Sendo que a Lei nº 9.096/95, que regulamenta o artigo 17º da Constituição Federal no seu Capítulo V, e trata das normas de fidelidade e disciplinas partidárias.

Além das normas que definem a perda de mandato, no artigo 17º, § 1º, cabe aos partidos a função de estabelecer normas de fidelidade e disciplinas partidárias: “é assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento, devendo seus estatutos estabelecer normas de fidelidade e disciplina partidárias”.

Como se percebe pela Lei 9.096/95, o partido político detém o poder de controlar seus membros, o que para Reiner (2001) tem consequências: “se levado ao extremo, degenere no totalitarismo, por outro lado, o livre arbítrio do eleito, se carente de fronteiras, conduz à anarquia”.

Conciliar a vontade do eleitorado com a expressão organizada da política – os Partidos - e com o respeito do direito de escolha dos eleitos, a fidelidade partidária desempenha papel relevante na procura desse equilíbrio, pois age diretamente na relação. Partido-eleito e, indiretamente, na de eleitor-eleito e eleitor-Partido. Com efeito, o binômio Partido-eleito só pode ser entendido sob a ótica da fidelidade partidária. É esta que justifica o tecido político em uma determinada sociedade.

No atual momento da vida nacional, em que a reforma política se tornou fundamental e absolutamente urgente, algumas questões cruciais devem ser observadas - é possível uma democracia estável e definitivamente instalada em nosso País sem partidos políticos fortes? Como assegurar a existência de partidos políticos fortes, sem um mínimo de fidelidade partidária?

Vamos refletir:... A questão da infidelidade partidária contribui para diminuir o grau de representatividade do regime democrático brasileiro, porque não se respeita a vontade do eleitor, altera-se a representação eleita. Ainda porque o voto dado a um partido é transferido para outro partido, sem a vontade ou a consulta ao eleitor que depositou seu voto.

Na verdade, os partidos políticos se tornaram protagonistas da democracia representativa, e não o candidato, pois sem a filiação, em nossa legislação, este não pode sequer registrar sua candidatura e concorrer ao cargo que almeja.

Não há nenhuma dúvida, quer juridicamente quanto na prática, a vinculação de um candidato com o partido pelo qual se registra a sua candidatura, daí onde se verifica sua identidade política, e, partindo deste princípio, pode-se dizer que fora do partido, o político em si não existe, pelo menos para concorrer numa eleição.

Pensando estrategicamente...  Na opinião de vários autores, na democracia, os partidos fazem parte como peças fundamentais, e para poderem exercer suas funções, devem possuir estabilidade, atribuições e condições de funcionamento, juntamente com regras estabelecidas e conhecidas, para que o eleitor possa ter a consciência de, em quem e para quê está votando, para que seu voto represente uma opção clara, através de uma ideologia ou alguns valores, ou por empatia pessoal.

Deve-se ponderar a autonomia da vontade pessoal do detentor do mandato eleito, juntamente com a vontade dos membros de seu partido, porque o parlamentar não se elegeu por seus únicos méritos, contou com o apoio da legenda do partido, geralmente. Deve-se corresponder, as vontades do parlamentar e do partido, dentro dos princípios gerais que norteiam o programa partidário que foi aprovado pelo eleitor, respeitando ao máximo a opinião de todas as partes envolvidas.

Para Maciel (2008), mesmo que obedeça às diretrizes estabelecidas pela direção partidária, o parlamentar poderá, em determinadas circunstâncias, discordar de alguma orientação ou decisão, por razões de foro íntimo ou de natureza política, ideológica, ou religiosa. Mudanças constantes nas orientações de um partido em razão de sua posição com relação ao governo têm levado a impasses entre parlamentares fiéis à orientação anterior e a nova diretriz partidária, mesmo que ela inove em relação ao programa original do partido.

A prática demonstra que o mandamento constitucional se transformou em letra morta, pois os candidatos utilizam-se da legenda apenas para obter o poder, conseguir o voto do eleitor, não se importando como isto será feito, sem compromisso com a programática do partido e o devido respeito aos eleitores que o fizeram mandatário, até porque sem o partido ao qual se filiou, talvez ele não estivesse representando o povo que o elegeu e se sente representado para que se legisle para o benefício da sociedade como um todo, e não por interesses particulares.

O Estado só viverá a democracia representativa em sua plenitude, se os políticos respeitarem a vontade dos cidadãos, que os colocaram através de seus votos, nas Casas Legislativas.



Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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