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11/03/2021 às 08h30min - Atualizada em 11/03/2021 às 08h30min

Lula, Milton Santos e a globalização de todos

CLÁUDIO DI MAURO
São cerca de 2.000 mortes diárias causadas pela pandemia COVID 19 no Brasil, com colapso de nosso sistema de saúde. Ao mesmo tempo, há ameaça de interrupção da lenta vacinação por falta de vacinas. Tudo fruto de um enfrentamento irresponsável e desqualificado exercido pelo governo Bolsonaro.

Um governo forjado para atender os interesses neofascistas de banqueiros, setores financeiristas e composto por milhares de militares da ativa ou de pijama.

Ao mesmo tempo dessas situações negativas e de tentativa do extermínio de nossa população temos a decisão do Ministro Fachin que anula os processos contra Lula promovidos pela lava jato que levaram a sua prisão e inelegibilidade. Uma farsa projetada por jogo de Fachin tentando salvar Sérgio Moro e a turma do Dallagnol.

Mas, no dia seguinte, por iniciativa dos Ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski renasceu a esperança de que será feita justiça para Lula. Os votos na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal colocam as coisas nos seus devidos lugares. Contundentes, verdadeiros, firmes, os dois Ministros referidos colocaram a verdade em evidência.

Lula está novamente elegível e poderá concorrer à Presidência da República.

Agora, o futuro se apresenta como um caminho possível para o retorno do otimismo no Brasil.

Por isso, neste momento quero me lembrar do meu saudoso amigo e Professor  Milton Santos.

Escrevendo sobre o saudoso Milton Santos, o também saudoso Geógrafo e Professor Delio Mendes afirmou:

“Homem do seu tempo, Milton Santos se fez presente em todos os grandes embates intelectuais da última metade do século passado. O seu tempo e o seu espaço foram o tempo e o espaço da globalização. Que ele queria que fosse outra. Ou melhor, a outra, a globalização de todos os excluídos, resgatados em uma sinfonia de humanização. Milton se fez maestro da paz e da felicidade. Felicidade de todos.”

Milton abre o conceito de território, mostrando-o como o lugar de acontecimentos do drama social:

“...há nessa desordem a oportunidade intelectual de nos deixar ver como o território revela o drama da nação, porque ele é, eu creio, muito mais visível através do território do que por intermédio de qualquer outra instância da sociedade. A minha impressão é que o território, revela as contradições muito mais fortemente.”

Milton não aceita explicações mecanicistas pelo seu caráter insuficiente. Atribui ao desenrolar da história, capitaneada por determinados segmentos da sociedade, os males que tornam difícil a vida da maioria das mulheres e dos homens.

O dinheiro passa a produzir dinheiro, dominando o mundo da produção de mercadorias. a especulação, a financeirização. A globalização é feita menor, sob a égide dos bancos e dos banqueiros, criando uma fábrica de perversidades. Afirma:

“O desemprego crescente torna-se crônico. A pobreza aumenta e as classes médias perdem em qualidade de vida. O salário médio tende a baixar. A fome e o desabrigo se generalizam em todos os continentes.”

É preciso reconhecer neste momento, sua peculiaridade. A de ser um momento para o capital. Todas as ações movem-se na direção de reproduzir para os ricos. Entretanto, se esta é uma constatação, não é, felizmente, uma fatalidade.

Milton nos aponta para um outro conhecimento o de reconhecer a possibilidade de construir a liberdade do ser humano: para modificar o mundo.

Para Milton Santos, a competitividade é ausência de compaixão. Tem a guerra como norma, e privilegia sempre os mais fortes em detrimento dos mais fracos. Busca fôlego na economia e despreza os que pensam mais para além.

O enfoque mecanicista faz com que a ciência humana seja pobre para interpretar um mundo confuso e conturbado e, desde logo a ciência econômica. Este enfoque modernoso atinge por caminhos nunca dantes navegados a maioria das falas e dos discursos. Grandes farsas são inventadas e reinventadas. O privilégio continua privilegiando o privilegiado.

"Os atores mais poderosos se reservam os melhores pedaços do território”, inclusive o território do pensar, para impedir o pensar.... A competitividade revela a essência do território, os lugares apontam para as lutas sociais, trazendo a tona virtudes e fraquezas dos atores da vida política e da sociedade.

O espaço é esquizofrênico na expressão da exclusão social. Uns homens sentem-se mais cidadãos do que outros. Mas estes homens são apenas consumidores, pois a cidadania depende de sua generalização. Não existem cidadãos num mundo apartado.

Portanto, este é um mundo de alguns consumidores e poucos, pouquíssimos cidadãos. Nossa missão implica em construir a cidadania.

O novo nasce sem que se perceba, veja-se por exemplo as cozinhas comunitárias organizadas pelo MTST em Uberlândia, Quase na sombra, o mundo muda de maneira imperceptível, todavia constante.

As transformações atuais colocam os homens em permanente estado de perplexidade. A poluição, as mudanças climáticas  e a desertificação se alastram, a super população e as tecno-epidemias etc., tornam o mundo diverso negativamente. A pobreza e a desigualdade são produtos desta forma da produção do modo “civilizatório” capitalista. Este novo apresenta diferentes faces. Tudo isto como consequência da desestruturação da ordem industrial. O atual período histórico não é apenas a continuação do capitalismo ocidental, é mais. Melhor, é muito mais, é a transição para uma nova civilização.

É necessário, para compreender esse novo, o conhecimento de dois elementos fundamentais na formação social das nações: 1) a formação técnica e, 2) a formação política. Uma permite a compreensão dos elementos tecnológicos que formam as composições necessárias à produção, e a outra indica que setores serão privilegiados com a organização possível da produção.

“Na prática social, sistemas técnicos e sistemas políticos se confundem e é por meio das combinações então possíveis e da escolha dos momentos e lugares de seu uso que a história e a geografia se fazem e refazem continuamente.”

Este paradigma pode aparece como: a superação da nação ativa pela nação passiva.

Utilizando a dialética como referência, Milton mostra “a batalha travada entre a nação passiva e a nação ativa, em uma transição política que envolve todos os espaços do viver, desde o espaço da vida cotidiana.”

A nação ativa, ligada aos interesses da globalização perversa, nada cria, nada contribui para a formação do mundo da felicidade, ao contrário da outra nação dita passiva que, a cada momento, cria e recria, em condições adversas, o novo jeito de produzir o espaço social, mostrando que a atual forma de globalização não é irreversível e a utopia é pertinente. ”

É somente a partir dessa constatação, fundada na história real do nosso tempo, que se torna possível retomar, de maneira concreta, a ideia de utopia e de projeto.

“Nesta compreensão, a globalização é um projeto irreversível da humanidade. Entretanto, não é esta a globalização desejada, é sim uma outra, a de todos.”.


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