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22/05/2017 às 16h22min - Atualizada em 22/05/2017 às 16h22min

O bom momento do Brasil

ALEXANDRE HENRY ALVES | JUIZ FEDERAL E ESCRITOR - www.dedodeprosa.com

Não estou fazendo piada, adianto logo. Também não estava em outro planeta na semana que se passou. A questão é de opinião mesmo: eu acho que o Brasil está vivendo um dos melhores momentos de sua existência e tenho boas razões para fazer essa afirmação.  

A história brasileira já começou com uma fraude, pois Cabral não descobriu coisa alguma. Na sequência, tivemos um território partilhado entre amigos do rei, em um sistema de capitanias estabelecido desde já como hereditárias, ou seja, o patrimônio era assegurado a uma casta e seus descendentes. Para o Brasil, ao menos segundo nos contam os livros de história, veio gente de tudo quanto foi tipo de caráter ruim. Os melhores que vieram queriam realmente trabalhar, mas para arrancar o máximo daqui e levar para Portugal. Até a nossa independência foi algo meio fajuto, como a independência do filho que se rebela e sai de casa para morar em um apartamento bancado pelos pais, continuando, inclusive, a almoçar a comida da mamãe todos os dias. A era republicana, por sua vez, começou divida entre "nobres" mineiros e paulistas e passou por um presidente populista que foi, voltou e foi de novo (caso raro de político brasileiro que se suicidou). Em seguida, viu uma capital ser construída a um preço até hoje desconhecido, no que pode ter sido a origem da corrupção em nível profissional e estratosférico. No auge da Guerra Fria, o país atravessou um regime militar que poderia ter feito do Brasil uma potência econômica, mas cuja incompetência dos generais no trato com o tema - para ficar só por aí - acabou por devolver à democracia uma nação quebrada. Quem viveu os tempos do General Figueiredo sabe do que estou falando. O que se seguiu foi uma tristeza: nossos ídolos de luta contra a ditadura lotearam o estado entre si e mostraram que a única democracia que eles queriam era aquela que permitia a eles também colocar a mão no dinheiro público. Chegamos aonde chegamos: sem liderança política, horrorizados com uma corrupção que sabíamos existente desde Cabral, mas que não acreditávamos chegar a tal dimensão.

Mas, por que então eu acho que estamos vivendo um bom momento? Porque já ficou claro que alguma coisa está diferente. O velho está estranhando este país, não está reconhecendo como sua a parte da casa que sempre dividiu feliz com a mãe Joana. De repente, alguém saiu do roteiro, em uma cilada preparada pelo destino a partir do momento em que se deu a algumas novas faces a oportunidade de ocupar espaços públicos por meio do próprio estudo, sem dever favores, sem rabos presos e com instrumentos na mão suficientes para levantar a voz.

Eu não sei aonde nosso país chegará, mas sei que as coisas não serão como antes e é isso o que me dá um pouco de esperança. Por mais que a casta político-econômica que domina o país de forma corrupta desde Cabral se arme para a batalha, o fato é que há novas armas contra essa casta. Entre elas, esses pequenos aparelhos capazes de captar sons, imagens, confissões e conchavos escusos. Há também novos agentes de estado que enfiaram na cabeça que não vão participar do cabaré e ponto final, gente que, por mais que tentem, não vai se vender. Outra novidade é a possibilidade de traição por parte de próceres dessa casta, por meio de delações. Alguém acreditou mesmo que, se a coisa apertasse, não haveria figurões desse feudo capazes de tudo para evitar algumas décadas nas masmorras que, antes, só abrigavam pretos, putas e pobres? Entre sujar as mãos de sangue em arriscados homicídios contra policiais, promotores e juízes, ou soltar a língua contra a irmandade de Rattus norvegicus, a opção evidente seria a segunda. Afinal de contas, quantas vezes a "elite" brasileira pegou em armas para construir a história? Acho que não preciso responder.

Resumindo meu pensamento, a corrupção no Brasil não vai acabar e nem teremos políticos santos. Mas, tudo o que está acontecendo neste exato momento me leva a crer que os corruptos e corruptores encontraram, pela primeira vez em nossa história, um ambiente inóspito e perigoso, que provocará reflexões antes do cometimento de atos ilícitos. Como dito, isso não vai aniquilar a corrupção, mas ao menos inibirá que ela seja cometida de forma tão escancarada, despreocupada e indiferente ao resto do povo brasileiro. Quanto mais escândalos aparecem, quanto mais delações e gravações são reveladas, mais tenho a certeza de que vivemos verdadeiramente novos tempos. 

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