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20/09/2020 às 08h00min - Atualizada em 20/09/2020 às 08h00min

La dolce vita

ALICE GUSSONI
Foto: Marcelo Gussoni

Na semana passada, a Erika trouxe dois temas com os quais me delicio profundamente: comida e a Itália. Palavras que adoçam a alma de qualquer bom glutão.

Tive, desde pequena, um grande fascínio pela Itália. Algo que imagino ter nascido por ouvir histórias sobre meus bisavós paternos. De onde eles vieram, como viviam, como gesticulavam, os palavrões que falavam, mas principalmente me lembro da comida da minha avó. Passar as férias na sua casa, era como uma versão caseira e popular do jantar da “Festa de Babette”. Era acordar vendo-a cozinhar tomates que permaneceriam em fogo baixo por toda a manhã (numa torturante e interminável contagem regressiva para a hora do almoço). Uma massa caseira extremamente simples nos ingredientes, mas um sabor tão elaborado se tornava o supra sumo do luxo.

Italianos são mestres em transformar ingredientes extremamente simples em algo glorioso. O que nos ensina sempre que “menos é mais”. Alguns amigos italianos me diziam brincando que usar ingredientes demais em uma receita, é um “disfarce” usado por quem não sabe cozinhar. 

Uma pizza pode ter apenas uma finíssima e crocante massa, molho, algumas rodelas de mussarela fresca e folhas de manjericão. Mas a qualidade dos ingredientes e as técnicas de preparo, fazem com que suas papilas gustativas se curvem em reverência, o famoso UMAMI. Estamos acostumados com pizzas com 3 cm de queijo, cebola, calabresa, milho, frango, pimentão, molho, todos os adicionais que você desejar e borda recheada. Nosso paladar chega a estar destreinado para apreciar o prazer de uma simples abobrinha tostada no azeite de oliva. As papilas são serzinhos muito delicados, facilmente anestesiados por sal demais, pimenta demais, entre outras coisas. E quanto mais recebem sabores puros, mais têm capacidade de “compreender” nuances delicadas de sabor, como um sommelier. Um esquimó pode detectar dezenas de diferentes tons de branco, por viver rodeado de neve, ter poucos estímulos multicoloridos, pode apurar sua capacidade de percepção da visão. Com o paladar é a mesma coisa, com um pouco de cuidado, seríamos capazes de detectar uma grande variedade de diferentes sabores.

Uma coisa que ficou marcada na minha memória foi a ritualística que eles têm nas refeições. A pausa para o almoço pode durar até três horas. Todo o comércio fecha. Até em repúblicas de estudante, é comum parar para comer juntos. As refeições têm 3 pratos. O primeiro, primo piatto, é composto por massa, risoto ou sopa, que seria uma porção abundante de carboidratos cheios de delícias como cogumelos, verduras e queijos. O segundo, secondo, é de carnes e verduras refogadas. Por último se serve a salada, insalata. Se você estiver numa mesa com italianos, alguns detalhes muito importantes precisam ser observados: o primeiro vai num prato fundo, o segundo e a salada em um raso. Nunca, em hipótese alguma, se sirva primeiro, ou misture a massa, a carne e a salada todas juntas no mesmo prato.  Espere todos dizerem “buon appetito” antes de começar. Normalmente, quem cozinha serve a todos, e todos o esperam para começarem juntos. Quando acabar o primeiro prato, espere todos finalizarem antes de você repetir ou comer o segundo prato. Sei que lendo isso parece assustador, mas acredite, é a forma mais bonita e respeitosa que você vai ter com a comida. Não vai precisar de um manual, simplesmente espere as pessoas te mostrarem o que fazer até que você pegue o jeito. Prometo que um dia vai ser automático. Garanto que um dia isso tudo vai te fazer uma falta imensa.

Faz falta porque a relação com a comida é bonita demais pra ser banalizada. Ela vai além do papel de simplesmente nutrir ou matar a fome. Nos conecta uns aos outros, nos remete a nossa ancestralidade, nos eleva. Comer por comer é viver no piloto automático. E a única coisa que isso nos trás e a perda de oportunidades. De se olhar nos olhos, de ouvir uma piada, uma história, uma gargalhada. Tudo isso é bonito demais pra não se importar em fazer uma refeição com a pessoa a sua frente olhando pro celular o tempo todo. Comer em pé. Aqueles ingredientes levaram meses ou anos pra chegar ao seu prato. Precisou de muita gente regando, colhendo, picando, cozinhando. Reverenciar o seu prato é a melhor forma de fazer com que todo esse caminho seja valorizado, que toda a existência desses seres não tenha sido em vão. Sentir gratidão por tudo aquilo que tinha de melhor nessa comida, agora vai fazer parte de você. 

Segue então uma receita do Sabor Sonoro de uma boa massa recheada para se preparar e comer em companhia. 

CONCHIGLIONE RECHEADO COM QUEIJO COALHO E LINGUIÇA

INGREDIENTES:

- 500g de conchiglione (1 pacote)
- 1 pacote de queijo coalho de queijo coalho (+- 500g)
- 2 linguiças calabresa (se quiser um sabor mais suave use a linguiça de pernil tradicional)
- 1 vidro de passata de tomate (+- 680g)
- 2 dentes de alho
- Manjericão a gosto
- 200g Parmesão ou Canastra ralado
- Sal e Azeite a gosto 

PREPARO:

 

  • Pique a linguiça calabresa em cubinhos, refogue até dourar. Reserve.

  • Pique o queijo coalho em cubinhos, misture com a linguiça já fora do fogo e reserve. Este é o recheio do Conchiglione.

  • Faça o molho de tomate de sua preferência.

  • Por aqui coloquei o molho para cozinhar, com o alho amassado, folhas de manjericão e um pouco de sal até encorpar um pouco, mas sem ficar muito espesso, ele ainda vai para o forno com a massa, então vai secar um pouco mais.

  • Cozinhe o Conchiglione conforme as instruções da embalagem, cuidado para não deixar passar do ponto porque você vai precisar rechear a massa cozida, se ela ficar mole demais pode quebrar.

  • Agora é rechear a massa, aquela hora de chamar os amigos, servir uma taça de vinho e fazer isso acompanhado. Sozinho pode ser meio chato, mas vira diversão em conjunto.

  • Coloque a massa recheada em uma travessa que possa ir ao forno. Agora é só cobrir com o molho, um pouco de queijo ralado e levar para o forno médio/alto por mais ou menos 20 minutos.

  • Na verdade eu costumo tirar quando começa a borbulhar, como tudo já está cozido, a intenção aqui é só esquentar tudo e derreter o queijo.


    *Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.


     

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