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08/08/2020 às 14h56min - Atualizada em 08/08/2020 às 14h56min

Cuidado de pai: é preciso um cérebro especial e muito amor entre gerações

ANGELA SENA PRIULI
“Esse mundo tá muito mudado…” - comentário típico dos mais vividos ou conservadores. Mas o fato é que nas últimas décadas, as mudanças socioculturais humanas levaram a um  aumento do número de pais envolvidos no cuidado direto de seus filhos, especialmente nas sociedades ocidentais. O que é maravilhoso! Um a zero para as famílias.

Essa tendência levou ao ressurgimento do interesse em compreender os mecanismos e efeitos do cuidado paterno nas crianças. O surgimento do comportamento paterno em homens demonstrou que nossa espécie é dotada por substancial plasticidade neural, que os homens desenvolvem um “cérebro de pai” em seu momento, que pode ser moldado por hormônios, experiências anteriores e atuais de cuidado, estímulos maternos e condições infantis. Pesquisas recentes também nos permitiram entender melhor a base neural dos cuidados paternos de mamíferos, os mecanismos genômicos e em nível de circuito subjacentes comportamento e as formas pelas quais as estruturas cerebrais que sustentam o cuidado materno evoluíram para que os homens também desenvolvessem essa habilidade.

O cuidado paterno direto é observado na maioria das sociedades humanas, mas com grande variabilidade entre todas as culturas. O envolvimento paterno tem consequências a longo prazo para crianças, melhorando sua sobrevivência, saúde mental, competências cognitivas e socioemocionais e desenvolvimento. Embora os pais tendam a se envolver em comportamentos que são distintos dos das mães, os efeitos a longo prazo dos cuidados paternos são semelhantes aos do cuidado materno e estão relacionados ao afeto, reciprocidade e nutrição. Vamos conhecer alguns comportamentos de cuidado parental e seus benefícios pais-filhos:
 
Contato estimulatório: a brincadeira de um pai com uma criança é geralmente mais estimulante que a da mãe, envolvendo manipulação física dos membros, jogando a criança no ar, por exemplo, como nas fotos típicas de Dia dos Pais. O toque estimulante paterno junto do bebê está associado com o aumento dos níveis de ocitocina e vasopressina plasmática e salivar dos pais (hormônios que explicam o comportamento parental e ainda regulam importantes mecanismos fisiológicos).
 
Brincadeiras mais “fortes”: Os pais normalmente se envolvem em trocas físicas com seus filhos quando crianças pré-escolares ou adolescentes, o que geralmente inclui manipulação mais “forte”, como as famosas cócegas ou lutinhas. Os jogos físicos tão altamente excitantes envolvem contato físico e contribuem para a regulação da agressão nas crianças, visto que elas reconhecem limites.
 
Exploração e/ou atenção ao meio ambiente: A interação do pai com bebês, crianças e adolescentes é frequentemente direcionada para elementos do meio ambiente e incentiva os aspectos físicos e mentais de exploração. Esse comportamento de melhoria da exploração também está associado com o aumento dos níveis de ocitocina, prolactina e vasopressina plasmáticas dos pais.
 
Aprendizagem de habilidades: Os pais normalmente ensinam crianças e adolescentes competências e habilidades de sobrevivência específicas da sua cultura e condições socioeconômicas. More em mansões ou viva em tribos, sempre existirá uma “dica de pai” (mesmo que seja de uma figura paterna) que salva a pele de uma criança quando ela está interagindo com outras pessoas.
 
Melhorar e/ou regular a alta excitação positiva: Os pais muitas vezes estabelecem momentos de alta excitação, com aspecto positivo (incluindo risadas e bagunça) com seus bebês e crianças pequenas, e isso os ensina a tolerar e regular tais situações.
 
Socialização: O estilo de socialização de um pai costuma ser mais rigoroso do que o de uma mãe e pais geralmente expressam maior disciplina que afeto caloroso. A disciplina dos pais é um fator importante e se manifesta nas diferenças culturais substanciais, na quantidade e variedade de cuidado direto e contato pai-filho, idade de início do cuidado parental, o grau de controle paterno aceito, o modo de controle paterno sobre a socialização e, até que ponto, momentos especiais para brincar versus participação guiada em atividades culturais e brincadeiras estão definidos.
 
Agora, falando de família, o cuidado paterno também melhora a saúde do pai e a parceria mãe-pai o que gera bem-estar para todos. Além disso, os comportamentos neurais e consequências moleculares do cuidado paterno à sua prole (próximas gerações) estão se tornando cada vez mais aparente. A maioria dos estudos experimentais nessa área aplica paradigmas de privação paterna nos quais o pai é removido da unidade social. Esses estudos demonstraram que a ausência de cuidados paternos altera traços comportamentais na progênie, incluindo ansiedade, agressão, comportamento social e resposta à recompensa, com muitos efeitos sexo-específico.

Enfim, ter pais atuantes e presentes faz diferença na vida biológica e mental deles, dos filhos e das mães, sem entrar em detalhes de estrutura familiar, é claro. O fim de semana pedia um olhar científico para eles e o recado está dado. Aproveite seu paizão, encha ele de carinho, seja no abraço ou na vídeochamada: amor de pai é único.
 
Fonte:
Feldman, R., Braun, K. & Champagne, F.A. The neural mechanisms and consequences of paternal caregiving. Nat Rev Neurosci 20, 205–224 (2019). https://doi.org/10.1038/s41583-019-0124-6




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