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09/05/2017 às 14h12min - Atualizada em 09/05/2017 às 14h12min

Os pais do século XXI

Quando a minha esposa engravidou, estive com ela em todas as consultas de pré-natal que pude participar, bem como nos exames de ultrassom. Na sala do parto, lá estava eu. Claro, também dormi as duas noites no hospital. E, quando a minha filha nasceu e decidimos que ela ficaria no quarto dela desde o primeiro dia em casa, dormi na cama auxiliar, perto do berço, por dez meses seguidos. Enquanto a minha esposa estava amamentando, eu assumia a tarefa noturna de despertar de três em três horas, pegar a minha filha, levar até a cama onde minha esposa estava, aguardar a amamentação, depois trocar a fralda, colocar para arrotar e fazer dormir novamente. Por falar em fraldas, até hoje faço a troca, pois eu já disse à minha esposa que, na divisão das tarefas, prefiro ficar com a parte da higiene do que com a da alimentação, que acho mais chata. Também dou banho, conto histórias e faço inúmeras atividades com a minha filha. Só o departamento de vestuário e cabelo é que não é muito a minha praia, por incapacidade técnica mesmo.

Não, eu não sou um pai fora do padrão. Pelo menos, é o que percebo entre meus amigos e familiares que foram pais nos últimos anos. Neste mês, por exemplo, ganhei um sobrinho do meu irmão Rodrigo e também nasceu o Henrique, filho do Renato e da Paula. Nos dois casos, percebi dedicação tão grande quanto a minha, quem sabe até maior. Que dirá de outro Rodrigo, o esposo da Carla, que deve dar à luz gêmeas em poucos dias. Se bem conheço o casal, ele de desdobrará em mil para ser o pai mais presente e atuante possível.

Estamos no século XXI. Ainda existem muitos casos de homens que engravidam namoradas, esposas ou "ficantes" e que não estão nem aí para a mãe ou o bebê. Homens que fazem de tudo para não reconhecer o filho ou, quando isso não é possível, deixam não apenas de participar da criação, mas também de prover a criança financeiramente. Tem pai que, mesmo nestes tempos, detesta dar atenção para os filhos. Fraldas? Nem pensar! Quanto mais distante a criança, melhor. Atrapalha menos o curso da vida.

Mas, felizmente, esse tipo miserável de ser humano tem perdido espaço. O que vejo é o desejo de ter filhos partir cada vez mais dos homens, desejo esse que é acompanhado, logicamente, da vontade de participar de todos os momentos da criação dos filhos. Antes, boa parte dos pais achava que sua função era, além de fornecer o espermatozoide, dar casa e comida para os filhos, além de uma surra quando a mãe não conseguia dar conta sozinha do recado. Se fosse menino, a relação até era um pouco mais próxima, mas apenas quando a idade avançava um pouco. Hoje, queremos igualdade com as mães. Ou, como isso não é possível (mãe é mãe, já dizia a velha frase), queremos uma participação intensa em todos os sentidos.

A razão? Além dos tempos serem outros, creio que a maioria dos homens percebeu que um filho é muito mais do que uma fonte de preocupação e de despesas. Não há coisa melhor do que o sorriso da minha filha quando me vê ao final da aula. A satisfação que ela tem, quando brincamos ou eu leio uma história para ela, é capaz de encher qualquer coração e de tornar as dificuldades e tristezas diárias questões com pouca importância. Desde o primeiro dia, tê-la dormindo no meu colo é um prazer imenso. Agora, já com seus três aninhos, suas conversas e argumentações dentro da lógica infantil representam um divertimento maravilhoso. Trocar fralda suja continua não dando prazer, mas a satisfação de saber que ela pode contar com o pai para tarefas não tão agradáveis compensa qualquer trabalho. Gosto de sair com ela, às vezes só nós dois, de tirar suas constantes dúvidas de inglês por conta dos primeiros passos na escola bilíngue (já estou estudando para não ficar para trás), de acolher aquele pequeno ser em meus braços pela manhã (quando ela sempre aparece descabelada e sonolenta, implorando por um colo), enfim, gosto de estar com ela.

Muitos homens aprenderam a dar valor à participação na criação dos filhos, até pelo retorno emocional gigantesco que isso traz para ambos. Não sou só eu, repito, mas muitos da minha geração. Os dos Rodrigos e o Renato, que formam a tríade de pais novos, certamente concordarão comigo sobre o tema. Representamos uma nova geração que, para além de disputas de gênero, consegue perceber espontaneamente que um filho pode ser muito mais gratificante do que qualquer outra coisa que tenha sido mais valorizada no passado.

Alexandre Henry Alves - Juiz Federal e Escritor

www.dedodeprosa.com

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