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04/05/2020 às 07h48min - Atualizada em 04/05/2020 às 07h48min

Quem sou eu?

IARA BERNARDES
Você já se perguntou isso? Se sim, conseguiu encontrar uma resposta que deixasse seu coração tranquilo? A resposta que encontrei e me confortou foi: eu sou muitas, sou um retalho de todos que passam por mim todos os dias, alguns retalhos são bem grandes, outros pequenos, uns esfarrapados e também tem os que não passam de míseras linhas, mas todos esses pedaços me formam, trazem para a minha história características únicas que fazem eu ser quem sou.

Ser a construção de nossa personalidade implica entendermos que ninguém passa por nós sem deixar uma marca, por menor que seja. Por exemplo, nossos pais são, prioritariamente, os que nos marcam mais, afinal, são os responsáveis iniciais pela construção do nosso caráter, a base da nossa formação moral e intelectual, também é deles herdamos genes que nos identificam fisicamente. Por isso, eles são nossos maiores retalhos e os mais permanentes, aqueles que por mais que lavemos a colcha, permanecem lá, mesmo que desbotados.

Amigos e algozes da infância também são grandes pedaços na nossa construção, muitas vezes ficam esquecidos em um emaranhado de pequenos tecidos, mas permanecem lá eternamente, sempre nos lembrando que o tempo passa, mas algumas pessoas simplesmente não desaparecem da nossa memória.

E assim vamos nos fazendo, incluindo pedaços, desbotando a colcha, esfarrapando as pessoas ao longo do caminho, porém sempre tem algo do cobrador de ônibus que foi gentil, da tia do docinho que insistia em te engordar na faculdade, do porteiro do prédio que você viu poucas vezes, do vizinho que gritava sem parar com o filho, daquele médico que salvou sua vida, de uma jovem que sorriu gentilmente enquanto seu filho dava uma birra, de pessoas que você se lembra em apenas um flash, mas que te marcaram com um simples olhar.

No entanto, mesmo que sejamos uma colcha tão mal costurada, porém bem elaborada, todos os pedaços têm o mesmo significado se nos marcam de alguma maneira? Aí é que está: Não!!!! A diferença entre saber valorizar e se relacionar com as pessoas, bem como se descobrir, está em colocar cada pessoa no seu lugar e principalmente, saber que seu lugar é múltiplo na vida das pessoas. Hein?! Complicou né? Vou explicar me usando como exemplo.

Iara, quem é ela? A Iara é uma mulher que desempenha papéis sociais diversos: esposa, mãe, filha, professora, escritora, amiga, colega de trabalho, paciente, mãe de um paciente, nora da sogra, nora do sogro, cunhada da cunhada, cunhada do cunhado e por aí vai. Além disso, como esposa, existem situações que fazem eu moldar meu comportamento e isso acontece em todos os papéis sociais que exerço. Por exemplo: eu como mãe sou carinhosa ao acordar, mas brava na hora de separar uma briga, posso ser amorosa se a birra for por cansaço, mas enérgica se a birra for por nada mesmo. Como filha da minha mãe ajo de uma maneira diferente que como filha do meu pai, pois são pessoas diferentes, com características que não me permitem ser a mesma pessoa. Como amiga também, com alguns sou mais enfática, com outros tenho mais cuidado ao falar. Enfim, sou muitas de mim, várias versões de uma mesma pessoa. Isso não significa que tenha múltiplas personalidades, porque existe algo que rege todos esses comportamentos: o caráter.

A diferença em desempenhar papéis, saber conduzir situações de acordo com o interlocutor e se mascarar para enganar as pessoas, está na intenção com que fazemos isso. Moldar-se e conseguir transitar em diversas esferas de si mesmo de acordo com o contexto faz com que as relações humanas sejam mais objetivas, porém não menos complexas e verdadeiras.

Quando você se apropria da sua multiplicidade e sabe colocar-se como protagonista da sua história, passa a se identificar com aquela pessoa refletida no espelho, sem medo de julgamentos, pois cada pessoa passa a ser parte da sua identidade, mas não a dona dela. Você se apropria dos seus papéis integralmente, sem vitimismo, começa a recosturar essa colcha bagunçada para se transformar numa obra de arte em forma de retalhos.

Por isso, coloque essa colcha na cama, estenda e a observe com cuidado, acarinhe os grandes retalhos, pois eles te fazem Ser, olhe com cuidado para os pequenos e, talvez, insignificantes pedaços, mas não deixe de começar a customização dessa obra de arte que é você.


O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

 
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