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29/02/2020 às 08h30min - Atualizada em 29/02/2020 às 08h30min

O que é incompatibilidade sanguínea?

TÚLIO MENDHES

Quando somos concebidos, metade de nosso material genético vem de nossa mãe, e a outra metade, de nosso pai. Herdamos de cada um deles um conjunto completo de informação genética. Sendo assim, cada um de nós carregamos dois conjuntos de informação genética completos. No entanto, apesar de estarem relacionadas às mesmas características do nosso organismo, nem sempre essas informações são idênticas. Essa incompatibilidade se deve à interação entre proteínas que podem ou não estar presentes no sangue. Cada um de nós possui duas vezes a informação genética que determina se nosso tipo sanguíneo é A, B, AB ou O. Esta informação se encontra em um gene que, não por acaso, também se chama “gene ABO”. Essa singularidade vale para todos os tecidos. Se através de uma biópsia retirarmos um pedaço de nossa pele para implantar num sobrinho, primo, irmão etc, certamente ele rejeitará a pele “transplantada”. Isso é um fato! A mesma coisa acontece com o sangue, que é um tecido vivo e que circula por todos os órgãos do nosso corpo.

Todos os seres humanos são geneticamente diferentes. Essa diferença vale também para o sangue. Só para termos uma ideia, ele é classificado principalmente como pertencente aos grupos ABO e RH, mas existem mais de 30 outros grupos sanguíneos, cada um carregando na superfície do glóbulo vermelho uma série de proteínas totalmente diferentes de um indivíduo para o outro. Esse é o primeiro aspecto. O segundo aspecto é o que chamamos de reação incompatibilidade sanguínea. Numa transfusão, quando o receptor recebe os glóbulos vermelhos do doador, ele pode já ter desenvolvido anticorpos que reconhecem como estranha a proteína que está sendo administrada naquele momento.

Mas o que pode acontecer com quem recebe sangue incompatível? Bem, do ponto de vista clínico, pessoas do grupo “O” apresentam naturalmente anticorpos contra os grupos sanguíneos A, B, AB. Se receberem sangue de um desses tipos, destruirão essas hemácias. Isso pode gerar uma série de distúrbios como queda brusca da pressão arterial, insuficiência renal, coagulação intravascular disseminada.

Os bancos de sangue são fundamentais para suporte dos pacientes que vão receber um transplante de órgão, qualquer que seja ele e, à semelhança de qualquer outra transfusão, os sistemas do grupo sanguíneo têm de ser respeitados. Não se pode iniciar um procedimento desse tipo sem estar devidamente acompanhado pelo banco de sangue.

No Brasil, existem dois grupos que são grandes usuários de transfusões de sangue ao longo da vida: os talassêmicos e os portadores de anemia falciforme. A “talassemia” é uma doença genética que se caracteriza por um defeito na produção de hemoglobina, componente do sangue responsável pelo transporte do oxigênio para todas as células do corpo. Por outro lado a anemia “falciforme” também se caracteriza por anormalidade na produção da hemoglobina, mas seu mecanismo genético é diferente e a doença acomete mais a população originária da África.

Nesses dois grupos, quanto mais grave for a doença, mais eles irão depender de hemácias transfundidas. Como já disse antes, os anticorpos do sistema ABO são produzidos naturalmente, mas os dos outros grupos sanguíneos aparecem depois de uma transfusão, para ser mais exato, mais de 200 proteínas diferentes na superfície das hemácias e que não identificamos todas elas nas transfusões.

Assim sendo, à medida que um organismo reconhece uma proteína que lhe é estranha, pode passar a produzir um anticorpo específico contra aquela proteína. Portanto, nada impede que um doador compatível hoje se torne incompatível no futuro sem que esteja envolvido o sistema ABO. Ou seja, o doador de sangue compatível durante um período pode deixar de ser indicado para aquele receptor. Cabe, então, ao banco de sangue aplicar testes laboratoriais adequados a fim de reconhecer as incompatibilidades e selecionar novos doadores para determinado paciente naquele momento transfusional.

Pra hoje é isso. Até o próximo sábado!

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.















 

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