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19/01/2020 às 12h00min - Atualizada em 19/01/2020 às 12h00min

Anormal é o novo normal, pelo menos para a saúde mental

ANGELA SENA PRIULI

Aproveitando o Janeiro Branco, mês de reflexão sobre nosso bem estar emocional, trago uma pesquisa com resultado muito interessante: apenas uma pequena parte da população permanece mentalmente saudável dos 11 aos 38 anos. Todo mundo experimenta uma doença mental em algum momento, segundo um estudo liderado pelo Dr Schaefer e seus colegas, que compartilharam suas descobertas no Journal of Abnormal Psychology.

"Para muitos, um episódio de transtorno mental é como gripe, bronquite, pedras nos rins, um osso quebrado ou outras condições [comuns]", diz Jonathan Schaefer. Ele é psicólogo na Universidade Duke. O estudo analisou 988 pessoas que moravam na Nova Zelândia. Apenas 171 - ou cerca de uma em cada seis pessoas - não experimentaram distúrbios de ansiedade, depressão ou outras doenças mentais, do final da infância à meia-idade. Do resto, metade experimentou um transtorno mental que durou pouco tempo. Isso normalmente era apenas um surto de depressão, ansiedade ou abuso de substâncias e então a pessoa se recuperou. As 408 pessoas restantes - aproximadamente duas em cada cinco - tiveram um ou mais transtornos mentais que duraram pelo menos vários anos. Seus diagnósticos incluíam condições mais graves. Estes podem ter incluído distúrbios bipolares e psicóticos.

Pelos números...

Os pesquisadores analisaram dados de pessoas nascidas entre abril de 1972 e março de 1973 em Dunedin, Nova Zelândia. A saúde e o comportamento geral de cada pessoa foram avaliados 13 vezes desde o nascimento até os 38 anos, enquanto a saúde mental foi avaliada oito vezes a partir dos 11 anos.

Estudos anteriores haviam vinculado várias características com uma menor chance de desenvolver transtornos mentais. Isso incluía crescer em uma família extraordinariamente abastada e desfrutar de uma saúde física muito boa. Além disso, pontuação muito alta nos testes de inteligência também tem sido associada à boa saúde mental.

Surpreendentemente, no entanto, os neozelandeses que se mantiveram mentalmente saudáveis ​​não obtiveram melhores pontuações do que qualquer outra pessoa. Na realidade, pessoas com boa saúde mental tenderam a ter traços de personalidade que lhes deram algum tipo de vantagem. Essas características começaram a emergir na infância, mostraram as pesquisas. Essas pessoas raramente expressavam emoções fortemente negativas, costumavam ter muitos amigos e muito bom autocontrole e tinham relativamente poucos membros da família com transtornos mentais, em comparação com seus pares.

Houve alguns benefícios na vida adulta para aqueles que sempre tiveram boa saúde mental. Essas pessoas tinham, em média, mais educação, melhores empregos e relacionamentos de maior qualidade. Eles também relataram mais satisfação com suas vidas do que os outros. Mas a saúde mental duradoura não garante uma excepcional sensação de bem-estar, ressalta Schaefer. Quase 20% de pessoas nunca diagnosticadas com doença mental pontuou abaixo da pontuação média dos participantes para "satisfação com a vida".

Menos surpreendente foi a taxa geral de 83% de transtornos mentais. Isso corresponde às estimativas recentes de outros quatro estudos longitudinais de longo prazo. Dois se concentraram nos estados americanos, um estudou pessoas na Suíça e o último foi outro estudo da Nova Zelândia. Esses estudos acompanharam pessoas por 12 a 30 anos. E durante esse acompanhamento, entre 61% e 85% dos participantes relataram ter pelo menos alguns transtornos mentais.

Muitas vezes há um estigma associado à doença mental. Mas se mais pessoas perceberem que a maioria acabará desenvolvendo algum transtorno mental, pelo menos brevemente, o estigma pode diminuir, suspeita Eaton.

Ronald Kessler também é epidemiologista. Ele trabalha na Harvard Medical School em Boston, Massachusetts. Kessler dirige pesquisas nos Estados Unidos de transtornos mentais. Ele suspeita que o número de pessoas que sofrem de um transtorno mental possa ser ainda maior do que o relatado nesses estudos. Muitas pessoas que pareciam ter saúde mental duradoura nesses estudos podem não ter. Eles podem ter desenvolvido breves distúrbios mentais que foram esquecidos, diz ele. Pode ter sido algo como algumas semanas de depressão grave após um rompimento romântico. Focar nesses casos raros de saúde mental duradoura pode não ser a melhor ideia, diz ele. "O mais interessante é comparar pessoas com doença mental persistente com pessoas com distúrbios temporários".

Lendo esse trabalho, entendemos que faz parte do "ser (do verbo ser mesmo) humano" sentir alguns rompantes mentais em algum momento da vida, senão funcionaríamos como robôs. Não julgue seu colega ou parente por ter uma crise de pânico ou por passar uns dias de isolamento por uma depressão, pois é COMUM, sendo considerado NORMAL (o que não quer dizer saudável, pois não é compatível com o bem-estar, então é importante buscar ajuda especializada). Mas somos assim, imperfeitos. E é nessa imperfeição que crescemos, nos relacionamos e evoluímos como seres humanos.
 
Fontes:
​​J. Schaefer et al. Enduring mental health: Prevalence and prediction. Journal of Abnormal Psychology. Vol. 126, February 2017.
https://www.sciencenewsforstudents.org/article/mental-illness-may-be-common-life-experience


*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.









 

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