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31/12/2019 às 07h59min - Atualizada em 31/12/2019 às 07h59min

Habitantes anteriores a João Pereira da Rocha

ANTÔNIO PEREIRA
Ninguém quer tirar a glória do pioneiro geralista João Pereira da Rocha, mas não se pode negar que, antes dele, outros habitaram as terras que formariam o Município de Uberlândia. Primeiro, os caiapós, escorraçados por Antônio Pires de Campos, e, depois, os quilombolas, destruídos por Bartolomeu Bueno do Prado. Depois destes elementos indesejados pelos exploradores de Goiás, porque atacavam as comitivas que transitavam pelas estradas que demandavam as minas, formaram-se aldeias com bororos domesticados e alguns negros, escravos ou libertos, que se mestiçaram e formaram os primeiros núcleos às margens do caminho. Entre essas aldeias, havia pequenas casas ou fazendas que serviam de pouso aos viajantes. Eram de mestiços ou de brancos que exploravam um comércio rudimentar com os viajantes.

O naturalista francês Auguste de Saint’Hilaire relata, em seu livro “Viagem à Província de Goiás”, os contatos que teve com alguns moradores da região e fatos que levam a acreditar que eles já estavam na região há bom tempo. Saint’Hilaire passou pela região do Triângulo em setembro de 1819. A essa altura, João Pereira da Rocha já estava estabelecido em suas terras, às margens do rio das Velhas, próximo a Indianópolis. No seu retorno, Saint’Hilaire atravessou o rio Paranaíba à altura do atual município de Cascalho Rico. Ali existia uma das aldeias citadas, a do Rio das Pedras (hoje, Cascalho Rico). Essas aldeias tinham no máximo uma dúzia de casebres e sua capelinha. Até chegar às terras do futuro Município de Uberabinha, a comitiva passou pelas Aldeias da Estiva, do Pissarrão, Fazenda das Furnas e Aldeia de Sant’Anna do Rio das Velhas (Indianópolis). Entre um povoado e outro havia em torno de duas léguas. Logo às margens do rio das Velhas (rio Araguari), havia um Posto Fiscal (Registro do Rio das Velhas) e casinholas nas duas margens, ou seja, em terras de Indianópolis e de Uberlândia. Nesse Posto eles pararam e Saint’Hilaire fez algumas anotações interessantes. O caminho entre a Aldeia de Sant’Anna (Indianópolis) e o Rio Grande passava necessariamente por terras de Uberlândia e Uberaba. Antes de chegar à Rocinha (Tapuirama), o francês observou, com tristeza, que se colocava em prática um plano de tomar as terras dos indígenas e mestiços para posseamento dos portugueses. O alemão Eschwege, contratado pelo Governo para fazer a demarcação entre Goiás e Minas Gerais, conta em livro de 1816, que um fazendeiro lhe propôs participar desse plano o que ele rechaçou energicamente, indignado.

No dia 6 de setembro, Saint’Hilaire parou na Rocinha, cujo sítio era de um senhor vindo da Aldeia do Bom Fim. Marcelino, que era um dos peões da comitiva, já conhecia a região ao redor. Já tinha passado por ali antes participando de uma “Folia” que durante oito meses (!) recolhera esmolas para a Festa do Divino Espírito Santo. Ora, as Folias não colhem esmolas de viajantes, mas de moradores em cujas casas pernoitam e se alimentam. Saindo da Rocinha, Saint’Hilaire e seus peões foram pousar às margens do “riacho Uberava verdadeira”, nome primitivo do rio Uberabinha, cujo curso fica quase todo dentro do atual município de Uberlândia. Às margens do riacho morava um velho com doença contagiosa o que fez com que o cientista preferisse pousar do lado de fora. Mesmo assim, conversou longamente com o velho que se mostrou satisfeito com a vida que levava, apartado do mundo. “Em sua casa viam-se apenas algumas cabaças que lhe serviam de vasilhas, umas poucas panelas e uma pequena provisão de milho destinada a ser vendida aos viajantes.”

Saint’Hilaire acrescenta que, na região, havia uma infinidade de casas tão pobres quanto aquela. Em seguida, ele seguiu para o Arraial da Farinha Podre e, de lá, atravessou o Rio Grande e se enfiou por São Paulo. A História é sobretudo econômica e por isso ela fixou o nome de João Pereira da Rocha e não o dos seus predecessores. João veio com dois intuitos que realizam a História: a intenção de fixar-se e enriquecer. Os que vieram antes nem permaneceram no local, nem realizaram qualquer obra que fixasse o seu nome ou a sua passagem. Por fim, consta do documento que concede a sesmaria a João Pereira da Rocha limitações a Leste com terras de Bento José de Godói e Ana Francisca. Como se vê ele nunca esteve sozinho, nem foi o primeiro, mas foi o único que deixou marcas que ficaram até os nossos dias.
 
Fontes: Auguste de Saint’Hilaire, Hildebrando Pontes


*Esta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.






 
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