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31/10/2019 às 08h15min - Atualizada em 31/10/2019 às 08h15min

Uberlândia abandonou compromissos assumidos?

CLÁUDIO DI MAURO | GEÓGRAFO DOCENTE NO IG/UFU

Como desdobramento da Conferência Mundial Sobre Assentamentos Humanos - Habitat II (Istambul – Turquia, 1996), foi lançado o Plano de Ação Global, com diretrizes para a criação de assentamentos humanos abordando o meio ambiente, direitos humanos, desenvolvimento social, direitos das mulheres, questões étnicas e demográficas entre outras, surgindo a Rede de Cidades do Mercosul (Mercocidades).

Uberlândia participou através da Prefeitura Municipal buscando a integração com municípios como: Buenos Aires, Assunção, Montevideo, Brasília, Malvinas Argentinas, Rio Claro, Bahia Blanca, Belo Horizonte, Campinas, Caxias do Sul, Córdoba, Florianópolis, Goiânia, Guarulhos, Juiz de Fora, Mossoró, Ribeirão Preto, Rio de Janeiro, São Paulo, São Caetano do Sula, Vitória, entre outros.

As municipalidades assumiram compromissos de integração da América Latina sob as perspectivas social, cultural, econômica e ambiental, elaborando na Unidade Temática Desenvolvimento Urbano a Declaração aprovada pelo Plenário da Cúpula da Mercocidades. O então prefeito Zaire Rezende e eu estávamos presentes e aprovamos o documento.

A vida das cidades, especialmente na América do Sul, não se reduz à análise dos processos de mundialização e, em certos momentos, o discurso dominante assumido por boa parte dos intelectuais e técnicos dos aparelhos de estado assemelha-se ao “pensamento único, neoliberal” seguindo na contramão dos interesses sociais, até acolhendo as recomendações dos organismos financeiros internacionais.

Com base nessas reflexões, a Unidade Temática de Desenvolvimento Urbano com Uberlândia e Rio Claro se dirigira à sociedade, aos setores envolvidos nos processos de planejamento e gestão das cidades, às autoridades públicas e aos governos locais do Mercosul. Considerou-se o impacto da mundialização no planejamento e gestão mercadológica das cidades, visando um tipo de “desenvolvimento urbano” em desacordo com a função social da cidade e da propriedade. A urbanização em curso foi substituída, “atropelada” pelos processos da mundialização, que exibe outra velocidade e avança para se apropriar da cidade enquanto negócio. A “modernização econômica” que acompanha e promove essa situação imprime no território formas fragmentadas, desarranjando a articulação de pontos da cidade, penalizando seguimentos sociais mais vulneráveis.

Sob essas reflexões, os municípios integrantes da Rede Mercocidades se dirigiram aos setores envolvidos no planejamento e gestão das cidades, às autoridades públicas e aos governos do Mercosul recomendando:

  1. Identificar os temas essenciais e prioritários que caracterizam as problemáticas das nossas cidades, com a maior independência possível dos paradigmas dominantes no ocidente desenvolvido;

  2. Promover a reflexão comparativa e o intercâmbio de experiências referidas ao desenvolvimento urbano entre as cidades, com abordagem interdisciplinar e com a participação dos atores sociais para desenvolver respostas adequadas ao tempo e lugar antes que haja adoção irreflexiva de modelos que parecem exitosos;

  3. Fortalecer, no desenho das estratégias territoriais e urbanas, os valores identitários das culturas locais ao invés de incentivar “valores globais” com homogeneização das culturas;

  4. Promover a solidariedade e colaboração interurbana sem competitividade tanto do ponto de vista tributário-fiscal dentro de uma região do país, como também do ponto de vista marqueteiro;

  5. Promover políticas públicas para a inclusão social como um produto ou resultado direto ou indireto, descartando àquelas que induzam à fragmentação do território;

  6. Substituir modelos privatizadores aplicados aos serviços públicos e às infraestruturas urbanas pelos que fomentando a participação do capital privado, revitalizem o rol planejador, regulador e redistributivo do estado, em todos os seus níveis;

  7. Desenhar planos e projetos que procurem e encontrem equilíbrio e harmonia na geografia urbana, revalorizando periferias e novas centralidades sem descuidar do fortalecimento de centralidades históricas;

  8. Considerar no desenho das políticas, as mais valias geradas pelo processo de desenvolvimento urbano, verdadeira “fábrica”, a partir de sua captação mediante ferramentas adequadas com redistribuição através de políticas compensatórias do governo local;

  9. Promover a participação cidadã ampliando e melhorando o funcionamento do modelo democrático nascido faz mais de três séculos sob o lema “igualdade, fraternidade e liberdade” antes que vençam os modelos representativos tradicionais ou falsamente representativos. Cabe aos governos locais abrir os instrumentos de planejamento, de gestão e prestação de contas para que a sociedade recupere a autoestima, descarte modelos dependentes de tecnologias altamente consumidoras de recursos, promovendo o desenvolvimento com sustentabilidade, atendendo as necessidades humanas, sem comprometer os recursos das gerações futuras. Não têm lugar as políticas que estimulem o patrocínio e desperdício dos bens sociais, entre eles, os originados na natureza.

Uberlândia e Rio Claro pelos seus Prefeitos Municipais abandonaram as recomendações firmadas!  Ou a continuidade das boas causas de governos se constituiu em retórica que vai na contramão do interesse coletivo urbano?

Com a colaboração de Professor Luiz Gonzaga Falcão Vasconcellos, geógrafo do Instituto de Geografia da UFU, e discentes do Planejamento e Gestão Urbana do IG/UFU.


*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.





 

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