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01/10/2019 às 08h11min - Atualizada em 01/10/2019 às 08h11min

(In)Segurança hídrica

PROF. EDUARDO MACEDO DE OLIVEIRA | SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL

Outubro de 2014. Diante de ondas de calor, uma severa estiagem e um consumo de água excessivo e insano em Uberlândia, Minas Gerais, a vazão dos nossos mananciais, em especial, o Rio Uberabinha, reduziu-se a tal ponto, colocando em risco o abastecimento de água em razão de um possível colapso sem precedentes. Naquela oportunidade, e apesar da gravidade da situação, observei uma letargia das autoridades competentes. Sim, um colapso tinha se tornado uma possibilidade, e suas consequências inimagináveis. As condições climáticas, consequência do fenômeno “El Nino” daquele inverno - “ fenômeno atmosférico-oceânico caracterizado por um aquecimento anormal das águas superficiais no oceano Pacífico Tropical, e que pode afetar o clima regional e global, mudando os padrões de vento a nível mundial, e afetando assim, os regimes de chuva em regiões tropicais e de latitudes médias” (CPTEC/INPE). Mas o fenômeno não poderia ter sido o único motivo da queda significativa das vazões dos mananciais, mas também, e principalmente, consequência de vários fatores, como as ações humanas predatórias no bioma Cerrado, nascentes e matas ciliares e a captação crescente, substancial e inadequada do setor agrícola. Enfim, 2014 tornara-se um divisor de águas (irônico, não!) na questão da segurança hídrica em nossa cidade. Em outras palavras, um sinal contundente para acordarmos para uma questão essencial para a nossa existência.

Diante disso, resolvi entrar com uma representação junto ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPE), solicitando a decretação em caráter de urgência de “Estado de Emergência”, visando a adoção de medidas legais para o impedimento de ações, processos e atividades, que porventura caracterizassem alto consumo de água e gerassem desperdício, e não fossem prioritariamente e estritamente para o consumo humano. Na época, o promotor Breno Lintz acatou a representação e remeteu ao Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) as minhas arguições, questionamentos e as razões da necessidade de tal inciativa por parte do Executivo Municipal. Mesmo em regime de urgência, demoraram três semanas para o seu posicionamento, negando surpreendentemente as graves condições vigentes, inclusive da existência de desabastecimento em várias partes da cidade. Em síntese, o decreto não se concretizou, e Uberlândia foi salva por uma chuva de três dias no início de novembro daquele ano.

Setembro de 2019. Após cinco anos, com o mesmo cenário e roteiro (perda significativa da vazão dos mananciais), as condições climáticas similares de 2014, novamente estávamos numa situação extremamente crítica. 2014 não servira de lição, pelo contrário. Acompanhando de perto os informes da imprensa local e do próprio Dmae, desde o início do ano, e apesar da ação do El Nino ter sido anunciado ao final de 2018, do consumo crescente por parte dos setores residenciais e não residenciais, e mais uma vez diante de um “silêncio ensurdecedor” decidi novamente por mais uma representação junto ao MPE (três promotorias), com a mesma indicação de 2014, pela decretação de “Estado de Emergência”.

Mas uma iniciativa inédita, histórica e inadiável por parte do promotor Fernando Martins (3ª Promotoria) criou um movimento sem precedentes no município de Uberlândia, “A Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor instaurou um procedimento preliminar, nesta segunda-feira (16), para investigar a real situação hídrica de Uberlândia e criar um gabinete de crise para adoção de medidas de consumo responsável de água diante ao extenso período de estiagem.” (Diário de Uberlândia, em 16 set 19). Não somente isso, e primordialmente, o tema “Segurança Hídrica” (abordando em sua esfera temas como a oferta de água, escassez hídrica, contingência e emergência) tornou-se enfim um assunto público, e não teríamos melhor instituição, liderança e legitimidade do que o MPE para liderar tal iniciativa. A partir disso, junto aos promotores Breno Lintz e Carlos Alberto Varela, entre outros, iniciou-se um importante e imprescindível movimento visando o presente e futuro de Uberlândia, melhor, a garantia de sua existência. Temos um caminho pela frente, um dever, uma obrigação de agregar todos os atores possíveis, não somente autoridades, entidades e organizações afins, mas a população uberlandense, visando a adoção de políticas públicas, ações educacionais permanentes, marcos regulatórios, e acompanhamento definitivo e permanente relativo à segurança hídrica e mudanças climáticas.

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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