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13/09/2019 às 08h08min - Atualizada em 13/09/2019 às 08h08min

Hoje é dia de Alan

MARIA DO P. SOCORRO CALIXTO MARQUES | PROFESSORA DE TEATRO DA UFU

“Hoje é dia de Alan” é um espetáculo que versa sobre relações entre alunos e professores em sala de aula. A forma do trabalho é construída por um viés didático extremamente explícito, característica que, para aqueles que navegam na interpretação, encontra-se diante de limites bem restringidos. Penso que a ele - leitor espectador- deve ser dada a chance de cooperação na construção de sentidos que se anunciam em uma peça.

Porém, levando em consideração que no atual contexto educacional, por que não dizer, sociocultural pelo qual passamos, todas as práticas artísticas que pautem o assunto da peça - o ensino de arte na escola e o bullying – são de extrema importância para espectadores, em especial o vislumbrado pela peça: alunos do ensino fundamental.

O bullying é um fato na escola e na vida. Embora as relações pessoais estejam cada vez mais violentas entre alunos e entre aqueles que convivem diariamente com seus pares e ímpares, há também uma gama de conquistas alcançadas pela humanidade. E parece-me que, a cada conquista, mais temos que nos precaver para preservá-la, pois estamos sempre na iminência de perdê-la. Daí, a escapada didática se sustenta.

A peça apresenta aulas, cujas regências alimentam tanto a sensibilidade – como a aula de arte - como também a disputa entre os pares, na aula de inglês. Vi nas cenas, falas e comportamentos observados em adolescentes em geral: descrição de professores que gritam em sala de aula e de percepções pejorativas em relação a colegas. É na escola que, também, crianças são martirizadas por demonstrarem suas carências e ensimesmamentos. Daí, retorno à emergência do trabalho cênico dos atores Isabela Abreu, José Venâncio, Roberta Liz, Thiago Fernandes, Wesley Nunes e Yuri Leite, todos licenciados ou em processo de formação pelo Curso de Teatro da UFU.

Dirigido pelo olhar criterioso de Lucas Lacher, percebemos sua condução no ritmo do texto, nas canções e paradas épicas dadas pelos atores a cada corte de cena que sugere o fim de uma aula. Para a efetivação desse processo, os atores ficaram passíveis da observação no que tange à atuação. Deles, esperava mais modulação vocal, mais maturidade na execução da proposta que se apresentava durante a encenação. Essa observação nasce não só porque eles têm formação em Teatro, mas também porque o personagem protagonista era o aluno mexido pelo ensino de artes: lugar em que a sensibilidade deve estar presente, aflorando ideais e inebriando ouvintes. E esse lugar seria construído com tons vocais. A voz nos tira do abismo que nos leva à morte. Vejam Sherazade.

Para se alcançar esse território sonoro, sugiro que as imitações sejam menos verossímeis, uma vez que o eixo da peça é colocar o ensino de arte como emancipação do espaço escolar. Para se atingir, de fato, uma imagem sensível do ensino de artes, o ambiente deveria ser mais suavizado, mesmo na algazarra das outras disciplinas. Para o teatro, cuja relação com o público se realiza através do corpo/voz, o exercício vocal, e para esse tema, especialmente, deveria revelar mais ternura e, paradoxalmente, mais tragédia, pois não foi isso que aconteceu? A morte do professor de artes ou a morte do ensino de arte?

Fica aqui a dica para os atores e o convite para espectadores de lugares diversos assistirem ao espetáculo que, apesar das considerações, é bom e emergencial.

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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