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08/08/2019 às 08h27min - Atualizada em 08/08/2019 às 08h27min

Toni Morrison

IVONE GOMES DE ASSIS

"Nós morremos. Esse pode ser o significado da vida. Mas nós fazemos linguagem. Essa pode ser a medida de nossas vidas", foi assim que Toni Morrison urdiu seu discurso por ocasião do Prêmio Nobel. E, nesta semana, dia 5, esta escritora americana, aos 88 anos, assinou sua última história, nesta vida. Morrison se destacou no mundo literário como sendo a primeira (e única) mulher negra a conquistar o prêmio máximo da literatura internacional, o Prêmio Nobel de Literatura de 1993. A filha de Lorain, em Ohio, tem uma vasta produção, que vai de romances, infantis até ensaios, mas a sua marca está em registrar o negro americano, sobretudo a mulher.

Abro uma observação para lembrar de que, embora o prêmio Nobel de Literatura exista desde 1901, é insano notar que até hoje somente dois negros tenham sido contemplados: o nigeriano Wole Soyinka (Prêmio 1986) e Morrison. Já na categoria Nobel da Paz este número passa a ser bem expressivo. O mundo precisa rever seus (pre)conceitos.

Como sabemos, o fato de se iniciar tardiamente (1970) na literatura, isso, a exemplo de Saramago, não impediu Morrison de chegar ao topo da categoria. De suas obras, destacam-se: “Sula" (1973), com indicação ao National Book Award, e "Amada" (1987), com o qual ganhou o Pulitzer de melhor ficção no ano de 1988, um dos principais prêmios literários dos Estados Unidos.

Vale observar que em 21 de maio de 2006 o Caderno “The New Times Journal” publicou “A melhor obra da ficção americana dos últimos 25 anos”, referindo-se ao “Beloved” (Amada) e isso, sem dúvida, gerou um burburinho. Em parte, eu até entendo, pois, não é porque a obra desmerecesse, mas porque é sempre bom lembrar de que “o melhor”, em qualquer categoria (cargo, obra, curso, música...), refere-se à pequena parcela em avaliação, e não à totalidade que compõem a categoria. Mas, dentre as obras avaliadas, o jornal entendeu que era a melhor, e foi merecido.

Morrison estrelou com “O olho mais azul” (1970), que mais tarde foi adaptado para filme. Nesta obra há uma frase, da personagem Pecola, uma garotinha de 11 anos, que diz: “Como é que a gente faz alguém amar a gente?” (MORRISON, 2003, p. 36). Esta frase da menina Pecola me remeteu à fala da menina Bitita, em “Diário de Bitita”, em que ela questiona: “Mamãe, eu sou gente ou bicho?” (JESUS, 1986, p. 10). Qual criança levantaria questionamentos assim, não fossem elas marcadas pela dor? Nos dois exemplos citados o traço comum às duas era escravismo/preconceito/cor. Mas, Pecola ainda arrasta em si a dor de ser violentada pelo pai. “Dizer-lhe o quê? O que um negro exaurido poderia dizer às costas arqueadas de sua filha de onze anos?” (MORRISON, 2003, p. 161-164).

A professora e editora Toni Morrison escreve sobre as mulheres negras americanas a partir do século XIX. Também escreveu “Canção de Salomão” (1977), obra que muito chamou a atenção da crítica internacional.

O romance “Amada” pauta-se na realidade das famílias negras da década de 1870. Período do despertar americano inicial para as feridas da escravidão. As obras de Morrison se destacam pela sua capacidade de dialogar com a história (passado e presente), na mais mutável e a abrangente metodologia e carga emocional.

E foi neste cenário literário, de denúncia e clamor, que Chloe Ardelia Wofford, a conhecida Toni Morrison, descreveu seu ponto de vista sobre beleza, raça, gênero, sociedade negra, preconceito e afins, para deixar seu legado à posteridade.

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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