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09/07/2019 às 08h10min - Atualizada em 09/07/2019 às 08h10min

Dona Mirtô cantava onde pedissem

ANTONIO PEREIRA

Dona Mirtô nasceu artista. Seu pai, Prudente Afonso Bernardes, tocava sanfona de oito baixos e ela logo se encantou com a música. Privilegiada pela natureza, tinha uma bela voz e gostava de usá-la. Aonde ia, cantava. O Rotary costumava pedir-lhe que cantasse em suas solenidades. Terra de muitas festas, a menina abria a voz onde pedissem. A Rádio Difusora tinha programas infantis em que ela se apresentava costumeiramente. Nos concursos de canto, ganhava sempre. Ganhou bonecas até cansar, ou melhor, até a direção da rádio decidir que não concorreria mais. Podia cantar, mas sem concorrer.

Um dia (já contei esta história), Mirtô foi convidada a se apresentar numa grande festa no Praia Clube. À beira do rio, com dona Cora acompanhando-a ao piano. Cantou o Danúbio Azul em alemão, sem saber alemão. Foi um alemão inventado na hora, o que assustou o velho professor Gunther. A plateia ficou encantada com a apresentação e o pai da mocinha lhe disse que lhe daria o presente que quisesse. Mirtô quis estudar canto e artes no Rio de Janeiro. Ganhou. Foi. Em menos de uma semana já estava matriculada numa Escola de Belas Artes que havia debaixo do Teatro Municipal e já tinha professores de canto e violino. Frequentou várias escolas de arte. Usava a voz para reforçar a mesada que vinha de Uberlândia. O primeiro lugar onde se apresentou cantando e concorrendo com calouros foi na Rádio Nacional, no programa do Renato Murce. Venceu. Com o dinheiro que ganhou, comprou um chapéu e foi com ele ao sweepstake (corrida de cavalos) acompanhando uma amiga. Depois foi ao programa do Ary Barroso, na Tupy. Cantou uma ária e o Ary, sempre irreverente, disse-lhe que ela cantara uma música fora do padrão do seu programa, mas que lhe daria assim mesmo o primeiro prêmio. Em seguida, foi ao Héber de Bôscoli, pai do compositor bossa nova Ronaldo Bôscoli, um dos maridos da Elis Regina. Ganhou também. Concorreu ainda num programa de música erudita conduzido pela pianista Magdalena Tragliaferro, voltando a ganhar. Por aqui termina sua vida de cantora caloura.

Numa exposição de desenhos realizada no Colégio Estadual, quando Mirtô fez um desenho para sua irmã apresentar como seu, ficou conhecendo um famoso artista plástico de Ribeirão Preto que reconhecendo o seu potencial vocálico convidou-a para um concerto em Ribeirão Preto. Mirtô ensaiou bastante seu recital com dona Cora e se foi. Depois de uns três dias de ensaio, apresentou-se no Teatro d. Pedro II, com a orquestra sinfônica de lá, sob a regência do maestro Ignacio Stabile. Foi sucesso. Stabile perguntou-lhe: você quer apresentar este recital em Uberlândia? Mirtô ponderou: como levar a orquestra até lá? Stabile insistiu e Mirtô, de volta a Uberlândia, conseguiu o apoio do Juquita e do Nicomedes Alves dos Santos que cedeu o Cine Theatro. Os Testa, os Crosara, os Garcia, os Carrijo e outros ajudaram.  Arrendaram dois vagões da Mogiana e a orquestra e seus instrumentos vieram. Os músicos ficaram no hotel Colombo. O recital foi deslumbrante. Mirtô cantou árias de La Bohème, Madamme Buterfly, Tosca e outras além de canções brasileiras como A Casinha Pequenina...
Sucesso.
 
Fonte: Mirtô Bernardes


*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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