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14/05/2019 às 08h56min - Atualizada em 14/05/2019 às 08h56min

Romance uberlandense quase vira filme

ANTÔNIO PEREIRA
Nos primeiros dias de dezembro de 1953, o  cineasta brasileiro, já falecido, Alex Viany veio a  Uberlândia para um contato com o professor Nelson Cupertino, autor do romance histórico “M’Boitatá”. Cupertino, de tradicional família uberlandense, de origem portuguesa, era professor de grande cultura que encaminhou várias gerações pelos rumos da educação. Seu romance conta a epopeia dos motoristas uberlandenses na conquista comercial do Centro Oeste para os grandes atacadistas locais. Faziam estradas nas rodas dos velhos caminhões sob a liderança intimorata de Nego Amâncio. Aborda também a construção da primeira estrada de automóveis da região pela empresa Companhia Mineira Autoviação Intermunicipal do Fernando Vilela., cujo diretor técnico era o engenheiro Ignácio Penha Paes Leme.

Alex Viany era um dos diretores da empresa “Maristella” e já tinha dirigido dois filmes de sucesso: “Agulha no Palheiro” e “Rua Sem Sol”. Quando professor de História do Cinema no Museu de Arte de São Paulo, veio-lhe a ideia de fazer um filme sobre caminhoneiros. A Maristella já concordara, mas não aparecia a história. Foi quando seu aluno, Miguel Juliano, lhe disse que em Uberlândia havia sido escrito um romance sobre o tema. Conseguiu o livro na Biblioteca Pública de São Paulo, leu, gostou e veio ver o professor.

Alex Viany expôs-lhe sua ideia que era a de aproveitar o romance em dois lances. No primeiro, contaria a história dos destemidos caminhoneiros nos primórdios da estrada do Fernando Vilela, no segundo, adaptaria o tema romanesco do livro para a época atual. Expôs, ainda, alguns pormenores interessantes: os artistas já estavam escolhidos. Eram Vanja Orico e Milton Ribeiro, que haviam sido protagonistas do maior sucesso nacional até então, “O cangaceiro”. Mais Dóris Monteiro, cantora, estrela de “Agulha no Palheiro”, premiada pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro como Artista Revelação de 1953. E ainda Jackson de Souza e os novatos Glauce Rocha (irmã de Glauber Rocha) e Pablo Montel. Secundários e extras seriam recrutados na região. O cenário seria Uberlândia, cidades regionais e interior goianos. A música seria composta pelo maestro Henrique Gandelman que viria conhecer a região e o romance para compor.

Em abril de 1954, Alex voltaria para organizar o roteiro com o professor. Viriam também o maestro Gandelman e a estrela Dóris Monteiro, que faria dois espetáculos na cidade. Abril passou e ninguém apareceu. A 29 de maio, chegou Dóris. Vinha participar de um baile do Colégio Brasil Central. Foi recebida no aeroporto pelo Prefeito Tubal Vilela, que lhe entregou uma placa de prata, sob aplausos do povo.  Deixou-se fotografar ao lado do professor Nelson e, à noite, foi entrevistada pela Rádio Educadora, onde falou de sua satisfação em participar do filme. E foi para o baile. Depois disso, os contatos foram esfriando, as notícias escasseando e, de repente, esqueceu-se de tudo. É de se acreditar que faltou capital para a produção.
Logo após a morte do professor, o ator Tarcísio Meira entrou em contato com a família, mostrou interesse em conhecer a obra reeditando a possibilidade de filmá-lo. Foi-lhe enviado um exemplar do “M’Boitatá”, mas não houve prosseguimento nas conversações. Há poucos anos, esteve por aqui uma equipe de TV dizendo-se produtora de uma série de filmes sob o título genérico “Táxi-Brasil”, um dos quais se passaria na região.

Procuraram-me atrás de argumento, por sugestão da ex-Secretária de Cultura, professora Creusa Rezende. Lembrei-me do “M’Boitatá” e mostrei-lhes. Gostaram, tiraram cópia, foram-se embora e nunca mais voltaram. O belo romance do professor Nelson Cupertino, história da maior epopeia da nossa cidade, continua esquecido num escaninho de biblioteca aguardando, pelo menos, uma reedição pelos Poderes Públicos. Merece. Vale.
Observação importante: Brevemente sairá meu livro “As estradas pioneiras do Brasil”, que conta a história dessa estrada do Fernando Vilela.    
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