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22/10/2018 às 07h47min - Atualizada em 22/10/2018 às 07h47min

São Tomé

WILLIAM H STUTZ
Depois do milagre da ressurreição da torta de camarão em certo hipermercado, resolvi ficar mais atento. Nada pelo visto é o que parece ser, pelo menos para os lados do consumidor. Guardo essa história para um novo contar.
 
Me veio então uma ideia no mínimo dantesca, que à primeira vista me pareceu inefável: resolvi medir rolo de papel higiênico. Será que aqueles alvos e macios rolos teriam mesmo os tantos metros indicados na embalagem? É que nós, simples mortais, dados à consumição, andamos tão enganados que fica difícil acreditar no "vale o que está escrito". Na zoo contravenção do barão de Drummond afirmam que sim, sei lá eu.
 
A ideia, a princípio maluca, carecia de bases científicas e testemunhais para ter valor real. Pensei em filmar o experimento e depois colocar no Youtube, junto com o gato comendo carne no açougue. Desisti. Como na internet quase tudo também não é o que é, assim como as pessoas não são o que ou quem dizem ser, logo alguém no meio da multidão virtual dará um grito: — Mais uma pulha! Um fake, farsa total!
 
Pensei então em criar uma comissão de alto nível (um perigo falar alto-nível ou notáveis hoje, generais podem não gostar). Uma banca especializada. Mas onde encontrar doutores, PhDs em medir ph? Como os experts, além de raros, são de difícil lida, fiquei imaginando o longo e inútil debate acadêmico que estaria fomentando. Questões do tipo se o picotado do papel deveria entrar na medição ou se deveria ser descontado paquimetricamente (de paquímetro e não paquiderme), do resultado final.
 
Como quase tudo no mundo dos muito especializados, da academia, exceções à parte é óbvio, a discussão duraria uma eternidade, demandaria pesquisa pura e altos financiamentos em projetos, bolsas e simpósios, e cá para nós, no fim, jamais se chegaria a uma conclusão e ainda ficariam criadas duas escolas, duas linhas de pensamento filosófico contemporâneo, em medir o quê? Papel higiênico. Achei melhor não envolver os "notáveis" em minhas pendências existenciais.
 
Então, em surto de lucidez, me dei conta de que já contamos com órgãos e instituições próprias para isso. Criadas para nos proteger, defender a população e seu bolso contra o descaso e desrespeito. Foquei na instituição maior, aquela federal.
 
Mas só de pensar na papelada que teria de preencher, nas justificativas que teria que apresentar, me deu tristeza, larguei para lá. Pensei no Procon. Mas também mudei de ideia. Pelo que acompanho, sei bem da competência daquele órgão. Sei que fazem das tripas coração com o pequeno número de agentes de seu quadro, portanto seria uma falta de consideração da minha parte solicitar ao respeitado e atuante órgão destacar um servidor para auditar medição de papel higiênico. Não seria justo nem de bom alvitre.
 
Me veio à baila história do moço cujo carro furou o pneu em estrada da roça e que estava sem macaco. Resolveu andar até fazenda próxima para pedir emprestado. Com pouco dinheiro no bolso, durante o percurso sofismava. Se pos a imaginar quanto o dono da fazenda iria lhe cobrar pelo uso do equipamento. À medida que se aproximava, a quantia imaginária subiu tanto, mas tanto que, depois de bater à porta, já descarregou sua raiva em atônico e sonolento senhor que mal havia destravado a tramela: - Sabe o que você faz com esse seu macaco!?
Andamos ficando com raiva antes da hora.
 
Querem saber, mudei de ideia, vou mesmo é contar palito de fósforos e de dentes. Quero ter absoluta certeza de que as caixinhas contém o que prometem. Pago para ver.
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