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19/01/2018 às 18h42min - Atualizada em 19/01/2018 às 18h42min

É hora de rever a meta de inflação

BENITO SALOMÃO | COLUNISTA

Na última semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o IPCA, índice de inflação oficial do país, não houve nenhuma surpresa, a inflação ficou abaixo da meta e encerrou os 12 meses findados em dezembro, em 2,95%. Vale sempre ressaltar, que o número da inflação de 2017 é bom, porém não é baixo, como comumente se vê divulgado pela imprensa. Em grande parte do mundo desenvolvido, e na maioria dos países que adotam o regime de metas de inflação, as taxas de variações de preços são próximas a 2 ou 2,5%. No Brasil, devido ao nosso histórico hiperinflacionário, convencionou-se a aceitar uma meta de inflação de 4,5%, ou o dobro do que se verifica internacionalmente.

O curioso da inflação, no entanto, não é o número, mas sim as interpretações que se dão à sua trajetória, vale sempre lembrar que, em 2015 fechou em 10,67% caindo para 6,29% em 2016 e encerrando em 2,95% no ano passado. O curioso desta nítida trajetória de queda da inflação, é que ela se deu em meio ao maior corte da taxa de juros da história recente do Brasil, em outubro de 2016, a SELIC estava em 14,25%, em dezembro de 2017, após 11 quedas consecutivas se encontravam em 7,00%.

Esta queda aguda da inflação em simultâneo à queda na taxa de juros, e na presença de déficits fiscais elevados, tem levado alguns colegas economistas ao erro, uma vez que estão aproveitando os dados para desqualificar a tese de existência de Fiscal Dominance nos países em desenvolvimento, levantada internacionalmente por Oliver Blanchard nos anos 2000 e defendida recentemente por economistas nacionais como André Lara Resende e Monica de Bolle. Eu próprio em artigos anteriores, defendi esta polêmica tese. O argumento dos economistas que discordam encontra nos dados recentes sua matéria prima, afinal, se é verdade que existe dominância fiscal no país, como pode que a inflação e os juros caiam simultaneamente?

Esta resposta, no entanto, não pode ser dada com o olhar simplesmente nos dados. É preciso compreender as reais causas da inflação. Em seu livro publicado recentemente, André Lara Resende resgata uma discussão histórica acerca das causas das altas de preços, durante séculos, se acreditou que a inflação era uma função do aumento do volume de moeda (encaixes reais), ancoradas na devoção à Teoria Quantitativa da Moeda desde as suas versões mais primitivas, até suas versões mais recentes. A crença de que a emissão de moedas para pagar déficits públicos elevados predominou por dois séculos de debate acadêmico e político.

Desde o final dos anos 1980, sagrou-se uma nova versão no debate de fronteira do desenvolvimento científico sobre o que causa a inflação, que agora, não seria mais uma função dos encaixes reais, mas sim da taxa de juros a partir de uma função de resposta do Banco Central a choques de oferta e demanda, cristalizada na regra de Taylor, cuja influência é notória nas ações dos BCs modernos. A elevação de taxas de juros, no entanto, se mostrou ineficiente no controle da inflação em 2015, quando mesmo frente à alta da SELIC para 14,25%, a inflação esteve em 10,67% causando como efeito colateral enorme recessão.

A esta altura o leitor deve estar percebendo que a teoria macroeconômica convencional, pautada meramente nos movimentos da taxa de juros, não explica sozinha, o comportamento da inflação. O fenômeno recente de queda nos juros e na inflação simultâneos, não deve servir como matéria prima para desqualificação da tese da dominância fiscal, mas sim, uma consagração da hipótese das expectativas racionais. A inclusão da hipótese das expectativas racionais, prevê que os agentes fixadores de preços, olham para frente, ou seja, fixam seus preços hoje, acreditando no comportamento futuro esperado da inflação. Isto quer dizer que, se os fixadores de preços esperam inflação mais elevada, ela realmente será maior, o contrário também é verdadeiro.

Portanto, a grande causa da inflação elevada em 2015, mesmo diante das consecutivas altas da SELIC, estava pautada na descrença dos agentes quanto a capacidade do BC durante o governo Dilma, em guiar a inflação pra meta. Com o impeachment, e a natural percepção guinada da política econômica com a equipe de Temer, a ação do BC tornou-se crível diante dos agentes fixadores de preços, o que foi acentuado pela aprovação da PEC do Teto dos Gastos públicos, criando uma percepção de solvência de longo prazo do Estado brasileiro. Tudo isto, somado a brutal recessão colocou a inflação em 2,95%.

Se é verdade que a inflação presente depende da inflação futura esperada, e que recentemente ela caiu fruto das reformas econômicas vigentes e da credibilidade do BC sob comando de Ilan Goldfajn, é possível que as expectativas de inflação futura estejam ancoradas. Neste cenário o anúncio do BC de redução da meta dos 4,5% atuais para 3% em consonância com o que ocorre no mundo, em simultâneo a esforços para solução do problema fiscal, pode trazer ao Brasil um novo patamar para a taxa de inflação, muito mais civilizado.
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